diff options
| author | Roger Frank <rfrank@pglaf.org> | 2025-10-14 19:58:14 -0700 |
|---|---|---|
| committer | Roger Frank <rfrank@pglaf.org> | 2025-10-14 19:58:14 -0700 |
| commit | 00b2dfcbe0e1eed14e3c3121e979675aee727e42 (patch) | |
| tree | b656d675ed0cebe635d1ff7c001a422010df9f44 | |
| -rw-r--r-- | .gitattributes | 3 | ||||
| -rw-r--r-- | 32789-8.txt | 947 | ||||
| -rw-r--r-- | 32789-8.zip | bin | 0 -> 17279 bytes | |||
| -rw-r--r-- | 32789-h.zip | bin | 0 -> 18592 bytes | |||
| -rw-r--r-- | 32789-h/32789-h.htm | 1035 | ||||
| -rw-r--r-- | LICENSE.txt | 11 | ||||
| -rw-r--r-- | README.md | 2 |
7 files changed, 1998 insertions, 0 deletions
diff --git a/.gitattributes b/.gitattributes new file mode 100644 index 0000000..6833f05 --- /dev/null +++ b/.gitattributes @@ -0,0 +1,3 @@ +* text=auto +*.txt text +*.md text diff --git a/32789-8.txt b/32789-8.txt new file mode 100644 index 0000000..2675192 --- /dev/null +++ b/32789-8.txt @@ -0,0 +1,947 @@ +The Project Gutenberg EBook of Camões e a Fisionomia Espiritual da Pátria, by +Leonardo Coimbra + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Camões e a Fisionomia Espiritual da Pátria + +Author: Leonardo Coimbra + +Release Date: June 13, 2010 [EBook #32789] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CAMÕES E A FISIONOMIA *** + + + + +Produced by Pedro Saborano + + + + + JUNTA PATRIOTICA DO NORTE + + LEONARDO COIMBRA + + CAMÕES + + E A + + fisionomia espiritual da Pátria + + SEPARATA DE CAMÕES + (DISCURSO PRONUNCIADO NO TEATRO + ÁGUIA DE OURO + NO DIA 10 DE JUNHO DE 1920) + + + + PORTO MCMXX + + POR BEM + + + + + MENINAS, MINHAS SENHORAS + E MEUS SENHORES: + + +Imaginai que, subterrâneo e distante, vos corre sob os pés um regato, e +donde em onde a terra se abre em bocas de verdura, falando o refrescante +murmurio das águas profundas. + +Assim são os Poetas. + +A nossa alma é como velho arco de ponte, sob o qual flui o rio do tempo, +levando no seu curso as verduras da terra e as luzes do firmamento, +cabelos corredios de algas e filamentos luminosos de mundos, flôres das +margens e cometas do Infinito. + +De quando em quando, da nossa própria alma tombam flôres mortas que o +tempo leva e vai sumindo na imensidade da Distância. + +¿Voltarão a passar sob a mesma ponte os brancos corpos de Ofélias, que +se afastaram, fluindo na algidez do luar? + +¿Qual o rio que, atravessando os mundos, os traga cinturados e +reflectidos a repassarem as mesmas viagens, a repetirem o milagre do +encontro? + +A Memória. + +Êsse o grande rio do tempo regressando à origem, como peregrino que +fôsse a ver o mundo e ao lar doméstico voltasse, cabelos e alma empoados +das flôres dos caminhos, rebrilhantes das pedrarias da terra e das +cósmicas poeiras das alturas. + +Mas a Memória é onda dum mar transcendente, que só conhecemos pelo seu +aromático desenho na praia que nós somos e onde ela vêm a morrer em +corpo de misterioso e estonteante perfume. + +Longe de nós, fora do nosso Espaço, nas dimensões que nos são vedadas, +nasce êsse Mar; o fluxo e refluxo das suas águas desenha em nossos +cérebros linhas de memória, que se apagam e destroiem, mal seguras do +instante em que fulguram. + +A vaga brilhou instantânea e logo outra vaga de memória fez o +_esquecimento_ da primeira. + +A consciência flui adormecida e às escuras, mal entrevendo os +esporádicos clarões dessa Memória, que à semelhança da fosforescência +dos nossos Oceanos só de longe a longe iluminam o negrume da vaga. + +E toda a Vida é uma luta, um drama, um combate, um permanente esforço +para segurar a instantânea luz da Memória, vaga dum mar de Outra-Vida, +aflorando subtil a praia que nós somos... + +A realidade é êsse combate, levado a planos diferentes, e sómente +vitorioso pela audácia dos Argonautas que se aventuram no grande Oceano +da Memória que, espontaneamente, em catadupas jorra do infinito coração +divino. + +Os Argonautas do Mistério são os sábios, os poetas e os santos. +Debrucemo-nos com êles no arco da velha ponte e vejamos o mundo que passa. + +O Universo passa, o tempo corre e nas suas águas precipitam-se as flôres +marginais, correm reflectidos os mundos e os sóis. + +O Poeta ouve o murmurio que transita, fixa o instante fugitivo, e como +em chapa de aço candente as águas que recebe no peito são asas de névoa, +ascenção e fulgor, caindo no Mar transcendente da Memória em perfeito e +luminoso corpo de eternidade. + +E assim o Poeta eterniza o instante... e assim o Poeta ergue à +Consciência os mais incoerciveis movimentos da alma, e assim o Poeta +filtra no episodio a sua parte de eternidade, eleva sôbre os individuos +transitórios a fisionomia espiritual das Pátrias, da Humanidade e Deus. + +O Poeta gera o Sábio e o Santo. + +O Santo é o homem do plano superior voluntariamente dado em sacrifício +para que a luz divina, que o consome, guie e exalte os homens à +transcendência de uma vida superior. + +O fogo purifica as podridões, a dor faz do sofrimento quotidiano uma +coluna de fogo apontando os novos destinos e rumos. + +_O Santo vive, na labareda do momento, o incendio da eternidade._ + +Dá o seu corpo ao sacrificio para que, no vazio que se fórma, as ondas +da Memória se insinuem e aumentem o seu contacto com a terra, para que +os abraços dessas ondas se alarguem e cinjam todas as almas suplices. + +O Santo é o Poeta praticante, as suas Canções penetram-lhe e modelam os +lábios, são seres vivos caminhando, humildes e amorosos, a cuidar as +chagas que, em nós, fizeram as mordeduras da Morte. + +O Sábio é o Poeta vagaroso: debruçado sobre a ponte, não vai em +companhia das vidas que fogem a cercá-las das águas da Memória para que +vivam e se não percam, espera que regressem e na repetição do que passou +vê a grande unidade convivente de tudo o que existe. Procura a +_identidade_ que une os seres, espera na _repetição_ o reaparecimento do +que transita. A sua luta pela Consciência é a mais humilde e serena. + +A consciência scientifica é cheia de abdicação do que é própriamente +humano, comovida de respeito pela Unidade social do Universo. + +O ascetismo do sábio, feito da possivel abdicação dos planos superiores, +leva-o à mais completa companhia com as realidades do seu plano. O +seu esforço para a consciência é o mais vigoroso esfôrço para fixar o +desenho das vagas da Memória, sem a aventura argonáutica de deixar a +praia em demanda do grande Oceano que a beija. + +Mas aquelas partes da sciência, que são as fontes que a alimentam, os +núcleos de invenção, são ainda o mergulho duma alma nas mais altas marés +do grande Oceano da Memória. + +O sábio criador é ainda e sempre o Poeta. + +Newton e Dante são igualmente infinitos. + +O seu pensamento tem sempre _oculto_, quere dizer que nenhuma leitura os +exgota, porque, pela parte em que mergulham no infinito Oceano da +Memória, são incomensuráveis com qualquer modo de contar, isto é, +inexgotáveis, eternos e infinitos. Há, com efeito, uma distinção, e a +unica que interessa, entre tôdas as obras. + +Aquelas cuja riqueza é exgotável por um numero finito de leituras (e +quantas nem uma só leitura compensam!) e aquelas cuja riqueza é +_criacionista_ e excedente, pois aumenta com as próprias tentativas de +exaustão. + +Imaginai um Arquimedes procurando exaurir um volume terminado por linhas +curvas e à medida que ia descontando paralelipípedos o fosse encontrando +novo e acrescido. Assim são os livros dos verdadeiros Poetas: sua +própria alma, infinita dádiva do seu perfeito Amor. + +Os outros... os outros podem ainda ser humildes soldados da Grande +Guerra contra a Morte, sustentando com firmeza os troféus das vitórias +já alcançadas. + +¡Mas ai do livro que depois de lido uma vez não foi mais desejado ainda +que antes da primeira leitura! Êle leva dentro de si mais esquecimento e +morte que vitória e consciência. + +Êsses livros que crescem, e sem fim, são os fios subtis que prendem o +homem aos planos espirituais superiores, são as flechas dardejantes +do mistério apontadas ao próprio coração humano. + +É neste sentido que há livros revelados e só legiveis na iluminação da +própria luz espiritual que os embebe. + +É, neste sentido, que existem bíblias: vivas línguas de fogo acrisolando +o pensamento humano. + +A Divina Comédia, D. Quixote, os Evangelhos: outras tantas línguas de +fogo ligando a terra com o firmamento. + +Êsses livros serão humanos, pagãos e divinos. + +Tudo transita, flui e morre. + +Ou nos salvamos todos, ou é impossivel a salvação. + +O mais insignificante atrito duma areia póde inutilizar a mais poderosa +e perfeita máquina. + +Um grão de esquecimento permitido no Universo introduzirá a desproporção +que inutiliza a memória, será uma perda singular que há de tornar +impossivel em qualquer outro ser a perfeita harmonia e conservação. + +Um general no momento critico duma batalha poderá acudir a um ponto +principal da sua linha, sofrendo em retorno pequenas derrotas parciais +em outros pontos. Essas derrotas parciais são o fumo de toda a labareda +que sóbe, os resíduos duma evolução que se fez e irá recomeçar, +aumentada da vitória alcançada, no coração da primeira derrota. + +O homem, que se eleva, só sustenta a sua fisionomia angélica ajudando a +evolução, porque as forças de Morte ainda o hão de perseguir e, se não +continua subindo, há de degradar-se em caricatura animal. + +No rio do tempo vão fugindo as cousas, os seres, os mundos e o homem. + +O Poeta é o seu redentor. + +A unica redenção é o grande baptismo no divino Oceano da Memória. + +O Poeta revelou a consciência aos homens, porque neles fixou e acendeu +aquela serena e firme estrela, que, no seu ponto de interferência, os +raios do Amor infinito geraram em Memória. + +Por essa Memória é o homem a praia onde marulham os oceanos de outras +vidas, o foco onde se reunem as vibrações etéreas de todos os sóis. + +A Tragédia grega, D. Quixote, os Evangelhos, a Divina Comédia, Camões... + +D. Quixote é a Bíblia do Ideal! + +O Ideal é a ausência duma percepção espiritual, é nessa ausência que se +insinua o Mistério... + +Eis porque o Ideal é presença invisível mas activa, fecunda presença de +realidades superiores que, como o longínquo polo para a agulha, +polarizam a vida do homem, embora este as não perceba, nem toque. + +D. Quixote é a própria fome do Ideal. Fome insatisfeita no plano de vida +terrestre, porque é nesse plano a presença de realidades espirituais +excedentes. + +Eis porque o D. Quixote é eterno; morto o planeta, êle será ainda em +qualquer vida a sua distância a um plano superior. + +D. Quixote vive em todos os homens, são as próprias asas do seu sonho, é +a ausência e o desejo de Deus. + +Sob êsse ponto de vista, todo o esforço para a consciência, que é a +própria linha de evolução dos mundos, da vida e do homem, a sciência, a +arte e a moral, é uma sedução quixotesca, é o influxo superior que uniu +a alma de Cervantes às realidades espirituais transcendentes. + +D. Quixote é o Ideal; o Evangelho é a própria visão espiritual exaltada +aos planos superiores da divindade. + +D. Quixote é o cego impelido para a Beleza por um pressentimento +interior; Cristo é a própria Luz abrindo olhos de percepção espiritual +na máscara pávida do homem. + +D. Quixote é a subida das águas no vazio que o turbilhão formara; Cristo +é a _ascenção_ das almas na estrada de luz que a sua passagem incendiou. + +A tragédia grega é a luta do homem com a Fatalidade, isto é, das forças +de vida contra todos os residuos da evolução amalgamados e condensados +num unico bloco de Fatalidade. + +Por baixo do mais fácil e gracioso politeísmo corre e flutua um +pandemonismo informe, recebendo todas as precipitações residuais do alto. + +Hesiodo e Eschylo passeiam entre as sombras; Sócrates e Platão entre as +frescas claridades duma manhã de Abril. + +Mas Platão sabe que essas claridades podem ser as sombras duma outra luz +e a alegoria da caverna _vive_ a chamar a atenção do homem... + +A Divina Comédia é o sonho de Jacob em plena vigilia, é a onda iniciada +num estremecimento da alma do Poeta e alargando e subindo, penetrando em +todos os planos da vida espiritual... + +Argonautas do Mistério que elevam a consciência a eternas visões da +realidade. + +Mas o mais insignificante Poeta é ainda capaz de fixar qualquer fugitivo +estremecimento e chamá-lo para a vida no próprio instante em que +silenciosamente se ia fenecendo. + + * * * * * + +A Arte é um formidável fenómeno de osmose: a alma do artista ressoa de +tôdos os estremecimentos da natureza e a natureza é pintada com as +tintas da sua alma. + +O Universo, é convívio, por isso o artista retribui, e em excesso, tôdas +as dádivas que recebeu. + +_O Mar, o mar dos portugueses, entrou pelas órbitas do Poeta e saiu +cantando as oitavas dos «Lusíadas»._ + +E tão íntimo foi o abraço, tão perfeita a transfusão que o marulho +longínquo do Oceano é esta própria fala: + + «Bramindo o negro mar de longe brada + Como se desse em vão nalgum rochedo» + +Portugal encapela-se em ondas, a sua vida comunica-se e de praia a praia +é um abraço cingindo o planeta. + +A vida do planeta é convivência no Infinito, a alma de Camões ligou, +pelos fios invisiveis da memória, o Mar e a Pátria à vida espiritual do +Universo. + +As oitavas dos _Lusíadas_, ondas do mar salgado, são eternos +estremecimentos de Memória esculpindo no Infinito a _fisionomia +espiritual da Pátria_. + +O homem pertence a vários planos de vida espiritual: é cidadão da sua +pátria, membro da sua religião, parcela consciente no Universo. + +E cada plano é atravessado pelo esfôrço do homem-consciência para a +conservação e para a Memória. + +É por isso que em cada plano há névoa e sonho e o homem estremece duma +nostalgia inquietante. + +O homem é o desterrado de Soares dos Reis... + +Se o Universo desde o sábio ao Poeta (e sem que prejulgue o problema +Mal) é convívio, a consciência do homem há de procurar as relações +cósmicas na companhia das consciências mais próximas. + +Eis porque o homem, consciência no Infinito, é cidadão na sua Pátria e +une a sua voz à voz de seus irmãos para erguer em côro a própria voz da +Pátria. E, como as almas só crescem pelo sacrificio dos desejos de +separatividade que as fôrças da Morte nelas insinuaram, o amor da Pátria +é a primeira e a mais concreta experiência religiosa das almas. + +Mal vai, no entanto, às Pátrias que, vítimas dum orgulhoso isolamento +demoniaco, não prolongam o sacrifício das almas não alargam os +seus estremecimentos de amor até à vida cósmica e infinita. + +Se Deus é a própria consciência social, para que esta não pese e +adormeça as almas necessario é que cresça e se ilimite em consciência +social do Universo. + +O amor da Pátria será o amor dos homens e das coisas, encerrando-se em +eterno e renovado amor de Deus. + +A voz dos portugueses, espessada, avolumando em ampliativos e excedentes +abraços, será a epopeia da Pátria levando no seu canto o mar e a +paisagem, os homens, a terra e o céu. + +As oitavas dos _Lusíadas_ são as ondas do mar levando em espuma as +bandeiras das batalhas, trapejando ao vendaval dos heroismos, os sonhos +da raça, o amor, Coimbra e o Mondego, os montes, campos e boninas... + +A crítica mais ou menos boticária entreviu nos _Lusíadas_ uma _mistura_ +do maravilhoso pagão e do maravilhoso cristão. + +É tempo de acabar com tanta incompreensão, de dizer bem alto que uma +obra de arte é um ser vivo, uma viva consciência salvando para a Memória +o fluxo que transita. Jamais será a mistura de mortes e quimeras. + +Há nos _Lusíadas_, como em toda a labareda, uma parte incombustivel que +a chama não incendeia e tomba em inerte poeira de cinzas. + +Incombustível, quando o coração do Poeta não arde em tão alto fogo +devorador que tudo queima. + +É a erudição do Poeta, que fornece o alimento à chama, e, se o fogo do +pensamento é génio, tudo arde em vivo lume de beleza e eternidade. + +Por vezes, sim, por vezes o calor do pensamento não basta a requeimar +essa erudição, e então na fluidez das oitavas boiam estátuas mutiladas +de deuses mortos e ausentes. + +Mas êsse é o fumo que faz toda a labareda humana é o sinal de +origem que, marcando a imperfeição do homem, sublinha a divindade do Poeta. + +O pensamento vulgar, não subindo acima das mais próximas realidades, +ignora a natureza e o valor do simbolismo, chegando a supor que os +símbolos poéticos são artifícios decorativos com que o Poeta procura +deleitar-nos a sensibilidade. + +Daí a ideia dum maravilhoso que, como as decorações dos arraiais +minhotos, passa de poeta em poeta. + +Se conhecer é relacionar, é sempre uma atenuada ou viva analogia a alma +do próprio conhecimento, que da sciência à arte é sempre, embora +diferentemente, um simbolismo. + +O simbolismo pagão é a grande concepção estética da Natureza e da Vida. +As contradições entre o homem e a natureza resumem-se ainda às relações +de silencio e convivio, que o homem encontra e harmoniza na quási +tangibilidade dos deuses mal escondidos ainda no seio duma natureza amiga. + +O murmúrio da floresta é quási o sôpro, repousado e possante, duma +respiração imensa; a tremulina de luz, que percorre o ribeiro quando um +ruído se ergue do estremecimento do canavial, é o próprio corpo da +Frescura a caminhar; o bulício das selvas multiplicando e fecundando a +vida é a própria Vida espalhada e vagabunda juntando-se para crescer; o +silêncio pontiluzente, meditativo e severo, da Noite estrelada é a +própria serenidade da distância a olhar: sátiros, ninfas, hamadríadas, +nereidas, faunos e deuses passeiam por entre os homens... + +O mundo é a convivência ingénua, mas já os dragões e as serpentes de +novo assustam e repelem a sensibilidade do homem. + +Êle terá de reencontrar a companhia a dentro de si mesmo... + +Se o corpo de Vénus é feito da espuma do Mar, a Virgem Maria é a mais +alta e translucida espuma da Alma. + +Um paganismo simples e gracioso apreendeu na vida universal as mesmas +fôrças, tendências e elementares vontades, que trabalham silenciosamente +nas profundezas do ser humano; mas já as lutas _titânicas_ revelam na +Natureza vontades inimigas, que nos assediam e oprimem. + +Um titanismo vitorioso, coberto de glória e feridas, pode voltar a +ressentir a beleza ingénua, a inocência e o bem, na fórma da aragem que +embala as florinhas, na frescura humilde do arroio, na sombra acolhedora +da árvore, no sonho que trespassa a grande voz dos elementos. + +Eis porque não há maravilhoso nem misturas de maravilhoso, há sim uma +voz humana que é contemporaneamente estremecimento da alma e do ar, que +fulgura, no éter interior e no éter envolvente, a mesma luminosa +geometria. Nos _Lusíadas_ há alegria campesina, boninas, prados e +jardins, uma natureza inocente e sem mácula; mas há tambêm águas que são +já lágrimas de amor saudoso, há montes e ervinhas que andam a aprender +no peito de Inês. + +E a paisagem de Coimbra ainda hoje vive a repetir essas lições; na +Quinta das Lágrimas ainda hoje, da fonte correm sem descanço, ressoando +em éco, os versos desta oitava: + + «As filhas do Mondêgo a morte escura + Longo tempo chorando memoraram; + E por memória eterna, em fonte pura + As lágrimas choradas transformaram: + O nome lhe puseram, que inda dura, + Dos amôres de Inês, que ali passaram + Vêde que fresca fonte rega as flôres, + Que lágrimas são a água e o nome amores». + +A Natureza não existe fora da convivência do homem. Ora simples, +silenciosa e profunda, duma inocente religiosidade elementar, ora +destroçada e perdida se a não socorre a memória. + +Fonte que é o simples murmúrio da gratidão das sêdes, leito de +frescura da ninfa adormecida, translucida neblina das rendas que a +vestem; fonte que discorre em lágrimas as saudades dum amor distante... + +_É esta Natureza que o Poeta tem de conquistar para a alma, é esta +natureza que a Pátria tem de desvendar para o mundo._ + +_Viajar é compreender_: por ignotos rumos procurar e levar companhia aos +seres e às cousas da distância, alargar, dilatar a alma para além dos +horizontes, ampliando o convívio, _contactando_ por maior superficie a +grande zona do Mistério. + +Ao partir para a viagem, acorrem tôdas as vozes da tranquilidade +doméstica, demovendo e comovendo, tentando prender o homem à firmeza das +ligações criadas, temendo a deslialdade e o esquecimento. + +Há vozes de egoísmo e de preguiça, mas há tambem vozes proféticas que +acusam a nossa vontade pecaminosa de não ir em busca de novas amizades, +mas de ambições e maiores egoísmos. + +Uma noite, era eu ainda colegial, senti, olhando da sala de estudo o +côncavo firmamento estrelado, a atracção dum astro distante, e a minha +alma infantil partiu súbitamente ao chamamento da distância; de repente +um frio de isolamento, de abandono, me fez regressar instantaneamente ao +calor e ao abrigo dos homens, que, embora pouco carinhoso, me falava, +era meu, era convívio, conhecimento, mútuo amparo. + +Jamais se apagou da minha memória essa _sensação_ única, que hoje +suponho o primeiro e mais perfeito contacto do meu ser com o Mistério. + +Tambem, ao partir, o Velho do Restelo virá... E à despedida, há de dizer +egoísmos, mas há de tambem prevenir os egoísmos, as ambições e as +cubiças para que não aumentem com o tamanho dos mundos que lhes vão ser +dados. + +E o Velho sabe que a Viagem, a Epopeia, é uma obra prometaica, de «fogo +de altos desejos que a movera». + +O homem Prometeu é o homem dando o infinito aos seus desejos, partindo +para alêm dos deuses familiares, correndo o risco de ficar só e às +escuras no Espaço sem fim, onde só um novo Deus de infinito amor poderá +ser companhia. + +Êsse homem Prometeu, perdido e vagabundo, encontrou a mão de Jesus +reconduzindo-o a Deus; ¿mas quantos ainda hoje passeiam num Infinito +mudo a desolada estátua de sua solidão e tristeza? + +A Epopeia vai fazer-se: os portugueses partem ligando os mundos, e, ao +dobrar da África, o velho do Restelo é o Prometeu português, o Adamastor +petrificado, prevenindo de novo as almas das duras consequências da +audácia, das dôres companheiras de toda a criação. + +O Velho desejara que o fogo dos altos desejos prometaicos não tivera +ardido, e profetizara com uma voz tão sábia e prevenida que bem parece +ser a própria voz dum doloroso saber de experiências. + +O Velho acompanha a frota e de novo. Maior, Imenso e Tormentoso, quere +vedar o Mistério, conter as forças de bem e de mal que os navegadores +estão prestes a libertar. + +Profetiza e ameaça, mas, quando interrogado em palavras lusíadas, conta +aos portugueses, ao mar e às nuvens, a tragédia esquiliana da sua aventura. + +O irmão Prometeu roubara o fogo aos deuses, êle quisera furtar-lhes o amor. + +A Luz prometaica iluminara os mundos, mas o Espaço regelado não fôra +comovido por essa fria luz da inteligência: a candeia cristã vai +purificar e aquecer essa luz e será o Amor a Grande Presença Universal, +dadivosa e inexgotável. + +Eis porque o Prometeu português tem um Cáucaso--é o términus do mundo +conhecido, aprisionado em contacto com as primeiras ondas do mundo +misterioso! + +Eis porque Adamastor tem um abutre--os próprios braços do amor, regaço +ondulado de Thetis, fazendo estremecer infinitamente a bruteza +penhascosa do seu corpo. + + «Converte-se-me a carne em terra dura, + Em penedos os ossos se fizeram; + Estes membros que vês, e esta figura + Por estas longas agoas se estenderam: + Emfim, minha grandissima estatura + Neste remoto cabo converteram + Os deoses; e por mais dobradas magoas, + Me anda Thetis cercando destas agoas». + +O seu corpo é beijado pelas mil bôcas do amor que o devora, e, abraçado +à névoa do corpo amado, sobe liberto o seu desejo, penetrando _em +lágrimas_ as funduras oceânicas em que se abisma. + +E _chora_, _chove_, desfaz-se a nuvem negra e de novo o Sol reaquece +mais desejos... + +¡Alma sedenta da Pátria, inextinguivel fome de imortalidade, com o amor +cravado no mais intimo do seu querer! + +¡A fisionomia espiritual da Pátria traçada a fogo no próprio coração do +Infinito! + +E lá vai Vasco da Gama num Mar, que não é do Planeta, levando a raça +numa Viagem sem termo a ouvir e libertar Adamastores, correndo num +pacifico Oceano de Memória a sua eterna aventura religiosa. + +E, cantando com o Poeta, tôdos nós somos já espectros duma outra vida, +formas duma luz transcendente penetrando o planeta dos estremecimentos +do Infinito. + +É a Grande Viagem: O Gama ao leme, o Poeta fazendo do seu canto o +próprio Oceano em que vogamos, e nós, reconciliados com Êle, em êxtase, +cantando a beleza profunda e eterna das almas... + +Faça cada português as suas pazes com Camões e, de novo, no Infinito, +radiosa e feliz, a Pátria há de sorrir... + + +(Disse). + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Camões e a Fisionomia Espiritual da +Pátria, by Leonardo Coimbra + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CAMÕES E A FISIONOMIA *** + +***** This file should be named 32789-8.txt or 32789-8.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + https://www.gutenberg.org/3/2/7/8/32789/ + +Produced by Pedro Saborano + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. They may be modified and printed and given away--you may do +practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is +subject to the trademark license, especially commercial +redistribution. + + + +*** START: FULL LICENSE *** + +THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE +PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK + +To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free +distribution of electronic works, by using or distributing this work +(or any other work associated in any way with the phrase "Project +Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project +Gutenberg-tm License (available with this file or online at +https://gutenberg.org/license). + + +Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm +electronic works + +1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm +electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to +and accept all the terms of this license and intellectual property +(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all +the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy +all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession. +If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project +Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the +terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or +entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. + +1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be +used on or associated in any way with an electronic work by people who +agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few +things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works +even without complying with the full terms of this agreement. See +paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project +Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement +and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic +works. See paragraph 1.E below. + +1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation" +or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project +Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the +collection are in the public domain in the United States. If an +individual work is in the public domain in the United States and you are +located in the United States, we do not claim a right to prevent you from +copying, distributing, performing, displaying or creating derivative +works based on the work as long as all references to Project Gutenberg +are removed. Of course, we hope that you will support the Project +Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by +freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of +this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with +the work. You can easily comply with the terms of this agreement by +keeping this work in the same format with its attached full Project +Gutenberg-tm License when you share it without charge with others. + +1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern +what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in +a constant state of change. If you are outside the United States, check +the laws of your country in addition to the terms of this agreement +before downloading, copying, displaying, performing, distributing or +creating derivative works based on this work or any other Project +Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning +the copyright status of any work in any country outside the United +States. + +1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg: + +1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate +access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently +whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the +phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project +Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, +copied or distributed: + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + +1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived +from the public domain (does not contain a notice indicating that it is +posted with permission of the copyright holder), the work can be copied +and distributed to anyone in the United States without paying any fees +or charges. If you are redistributing or providing access to a work +with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the +work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1 +through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the +Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or +1.E.9. + +1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted +with the permission of the copyright holder, your use and distribution +must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional +terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked +to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the +permission of the copyright holder found at the beginning of this work. + +1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm +License terms from this work, or any files containing a part of this +work or any other work associated with Project Gutenberg-tm. + +1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this +electronic work, or any part of this electronic work, without +prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with +active links or immediate access to the full terms of the Project +Gutenberg-tm License. + +1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary, +compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any +word processing or hypertext form. However, if you provide access to or +distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than +"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version +posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org), +you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a +copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon +request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other +form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm +License as specified in paragraph 1.E.1. + +1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying, +performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works +unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9. + +1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing +access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided +that + +- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from + the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method + you already use to calculate your applicable taxes. The fee is + owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he + has agreed to donate royalties under this paragraph to the + Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments + must be paid within 60 days following each date on which you + prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax + returns. Royalty payments should be clearly marked as such and + sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the + address specified in Section 4, "Information about donations to + the Project Gutenberg Literary Archive Foundation." + +- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies + you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he + does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm + License. You must require such a user to return or + destroy all copies of the works possessed in a physical medium + and discontinue all use of and all access to other copies of + Project Gutenberg-tm works. + +- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any + money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the + electronic work is discovered and reported to you within 90 days + of receipt of the work. + +- You comply with all other terms of this agreement for free + distribution of Project Gutenberg-tm works. + +1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm +electronic work or group of works on different terms than are set +forth in this agreement, you must obtain permission in writing from +both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael +Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the +Foundation as set forth in Section 3 below. + +1.F. + +1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable +effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread +public domain works in creating the Project Gutenberg-tm +collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic +works, and the medium on which they may be stored, may contain +"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or +corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual +property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a +computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by +your equipment. + +1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right +of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project +Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project +Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all +liability to you for damages, costs and expenses, including legal +fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT +LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE +PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE +TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE +LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR +INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH +DAMAGE. + +1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a +defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can +receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a +written explanation to the person you received the work from. If you +received the work on a physical medium, you must return the medium with +your written explanation. The person or entity that provided you with +the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a +refund. If you received the work electronically, the person or entity +providing it to you may choose to give you a second opportunity to +receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy +is also defective, you may demand a refund in writing without further +opportunities to fix the problem. + +1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth +in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER +WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO +WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE. + +1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied +warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages. +If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the +law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be +interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by +the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any +provision of this agreement shall not void the remaining provisions. + +1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the +trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone +providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance +with this agreement, and any volunteers associated with the production, +promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works, +harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees, +that arise directly or indirectly from any of the following which you do +or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm +work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any +Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause. + + +Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm + +Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of +electronic works in formats readable by the widest variety of computers +including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at https://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at https://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. Compliance requirements are not uniform and it takes a +considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up +with these requirements. We do not solicit donations in locations +where we have not received written confirmation of compliance. To +SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any +particular state visit https://pglaf.org + +While we cannot and do not solicit contributions from states where we +have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition +against accepting unsolicited donations from donors in such states who +approach us with offers to donate. + +International donations are gratefully accepted, but we cannot make +any statements concerning tax treatment of donations received from +outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. + +Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation +methods and addresses. Donations are accepted in a number of other +ways including including checks, online payments and credit card +donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate + + +Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic +works. + +Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm +concept of a library of electronic works that could be freely shared +with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project +Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. + + +Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed +editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. +unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + https://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. diff --git a/32789-8.zip b/32789-8.zip Binary files differnew file mode 100644 index 0000000..3ac4782 --- /dev/null +++ b/32789-8.zip diff --git a/32789-h.zip b/32789-h.zip Binary files differnew file mode 100644 index 0000000..32d06e2 --- /dev/null +++ b/32789-h.zip diff --git a/32789-h/32789-h.htm b/32789-h/32789-h.htm new file mode 100644 index 0000000..f86f943 --- /dev/null +++ b/32789-h/32789-h.htm @@ -0,0 +1,1035 @@ +<!DOCTYPE HTML PUBLIC "-//W3C//DTD HTML 4.01 Transitional//EN" "http://www.w3.org/TR/html4/loose.dtd"> +<html> +<head> + <title>Camões a fisionomia espiritual da Pátria</title> + <meta name="Author" content="Leonardo Coimbra"> + <meta name="Edition" content="Porto. Junta Patriotica do Norte, 1920."> + <meta http-equiv="content-type" content="text/html; charset=iso-8859-15"> + <style type="text/css"> + body{margin-left: 10%; + margin-right: 10%; + } + .pn { + text-indent: 0em; + text-decoration: none; + position: absolute; + left: 92%; + font-size: smaller; + text-align: right; + color: silver; + } + #corpo p{text-align: justify; text-indent: 1.5em;} + h1, h2, h3, h4 {text-align: center; margin-top: 2em;} + h2 {text-align: center; margin-bottom: 2em;} + #corpo p.sinopse {margin: 0; font-size: small; text-indent: 0;} + #corpo p.ni {text-indent: 0;} + hr.dotted {border: 0; border-bottom: dotted 2px #000;} + hr {border: 0; border-bottom: solid 2px #000;} + blockquote {margin-left: 10%; font-size: small;} + a {text-decoration: none;} + .rodape { + font-size: 0.7em; + margin-left: 2em; + margin-right: 2em; + } + .errata {border-bottom: dotted 2px #aaaaaa;} + .typo {border-bottom: dotted 2px #77dd77;} + .fbox {border: solid black 1px; background-color: #FFFFCC; font-size: 0.8em; + margin-left: 10%; margin-right: 10%;} + </style> +</head> + +<body> + + +<pre> + +The Project Gutenberg EBook of Camões e a Fisionomia Espiritual da Pátria, by +Leonardo Coimbra + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Camões e a Fisionomia Espiritual da Pátria + +Author: Leonardo Coimbra + +Release Date: June 13, 2010 [EBook #32789] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CAMÕES E A FISIONOMIA *** + + + + +Produced by Pedro Saborano + + + + + +</pre> + +<p> </p> + +<div style="text-align:center; border: double 10px red; padding: 1em;"> +<p style="border: solid 1px red; margin-left: 10%; margin-right: 10%; font-size: 1.2em; color: red;">JUNTA PATRIOTICA DO NORTE</p> + +<p style="font-size: 1.2em;">LEONARDO COIMBRA</p> + +<hr style="width: 20%"> + +<p> </p> + +<p style="font-size: 2em;">CAMÕES</p> + +<p>E A</p> + +<p style="font-size: 1.8em;">fisionomia espiritual da Pátria</p> + +<hr style="width: 20%"> + +<p style="font-size: 1.2em;">SEPARATA DE CAMÕES</p> + +<p style="font-size: 1.1em;">(DISCURSO PRONUNCIADO NO TEATRO<br> +ÁGUIA DE OURO<br> +NO DIA 10 DE JUNHO DE 1920)</p> + +<p> </p> +<p> </p> +<p> </p> +<p> </p> + +<p style="font-size: 1.2em;">PORTO MCMXX</p> + +<p style="border: solid 1px red; margin-left: 10%; margin-right: 10%; font-size: 1.2em; color: red;">POR BEM</p> +</div> + +<p><span class="pn">{3}</span></p> + +<div id="corpo"> +<p> </p> +<p> </p> +<p> </p> +<p> </p> + +<p style="text-align:right;margin-right:10%;">M<small>ENINAS, MINHAS</small> +S<small>ENHORAS</small><br> +<small>E MEUS</small> S<small>ENHORES:</small> </p> + +<p> </p> + +<p class="ni"><big><big>I</big></big><small>MAGINAI</small> que, subterrâneo e +distante, vos corre sob os pés um regato, e donde em onde a terra se abre em +bocas de verdura, falando o refrescante murmurio das águas profundas.</p> + +<p>Assim são os Poetas.</p> + +<p>A nossa alma é como velho arco de ponte, sob o qual flui o rio do tempo, +levando no seu curso as verduras da terra e as luzes do firmamento, cabelos +corredios de algas e filamentos luminosos de mundos, flôres das margens e +cometas do Infinito.</p> + +<p>De quando em quando, da nossa própria alma tombam flôres mortas que o tempo +leva e vai sumindo na imensidade da Distância.</p> + +<p>¿Voltarão a passar sob a mesma ponte os brancos corpos de Ofélias, que se +afastaram, fluindo na algidez do luar?</p> + +<p>¿Qual o rio que, atravessando os mundos, os traga cinturados e reflectidos a +repassarem as mesmas viagens, a repetirem o milagre do encontro?</p> + +<p>A Memória.</p> + +<p>Êsse o grande rio do tempo regressando à origem, como peregrino que fôsse a +ver o mundo e ao lar doméstico voltasse, cabelos e alma empoados das +flôres<span class="pn">{6}</span> dos caminhos, rebrilhantes das pedrarias da +terra e das cósmicas poeiras das alturas.</p> + +<p>Mas a Memória é onda dum mar transcendente, que só conhecemos pelo seu +aromático desenho na praia que nós somos e onde ela vêm a morrer em corpo de +misterioso e estonteante perfume.</p> + +<p>Longe de nós, fora do nosso Espaço, nas dimensões que nos são vedadas, nasce +êsse Mar; o fluxo e refluxo das suas águas desenha em nossos cérebros linhas de +memória, que se apagam e destroiem, mal seguras do instante em que fulguram. +</p> + +<p>A vaga brilhou instantânea e logo outra vaga de memória fez o +<i>esquecimento</i> da primeira.</p> + +<p>A consciência flui adormecida e às escuras, mal entrevendo os esporádicos +clarões dessa Memória, que à semelhança da fosforescência dos nossos Oceanos só +de longe a longe iluminam o negrume da vaga.</p> + +<p>E toda a Vida é uma luta, um drama, um combate, um permanente esforço para +segurar a instantânea luz da Memória, vaga dum mar de Outra-Vida, aflorando +subtil a praia que nós somos...</p> + +<p>A realidade é êsse combate, levado a planos diferentes, e sómente vitorioso +pela audácia dos Argonautas que se aventuram no grande Oceano da Memória que, +espontaneamente, em catadupas jorra do infinito coração divino.</p> + +<p>Os Argonautas do Mistério são os sábios, os poetas e os santos. +Debrucemo-nos com êles no arco da velha ponte e vejamos o mundo que passa.</p> + +<p>O Universo passa, o tempo corre e nas suas águas precipitam-se as flôres +marginais, correm reflectidos os mundos e os sóis.</p> + +<p>O Poeta ouve o murmurio que transita, fixa o instante fugitivo, e como em +chapa de aço candente as águas que recebe no peito são asas de névoa, ascenção +e fulgor, caindo no Mar transcendente da Memória em perfeito e luminoso corpo +de eternidade.</p> + +<p>E assim o Poeta eterniza o instante... e assim o<span class="pn">{7}</span> +Poeta ergue à Consciência os mais incoerciveis movimentos da alma, e assim o +Poeta filtra no episodio a sua parte de eternidade, eleva sôbre os individuos +transitórios a fisionomia espiritual das Pátrias, da Humanidade e Deus.</p> + +<p>O Poeta gera o Sábio e o Santo.</p> + +<p>O Santo é o homem do plano superior voluntariamente dado em sacrifício para +que a luz divina, que o consome, guie e exalte os homens à transcendência de +uma vida superior.</p> + +<p>O fogo purifica as podridões, a dor faz do sofrimento quotidiano uma coluna +de fogo apontando os novos destinos e rumos.</p> + +<p><i>O Santo vive, na labareda do momento, o incendio da eternidade.</i></p> + +<p>Dá o seu corpo ao sacrificio para que, no vazio que se fórma, as ondas da +Memória se insinuem e aumentem o seu contacto com a terra, para que os abraços +dessas ondas se alarguem e cinjam todas as almas suplices.</p> + +<p>O Santo é o Poeta praticante, as suas Canções penetram-lhe e modelam os +lábios, são seres vivos caminhando, humildes e amorosos, a cuidar as chagas +que, em nós, fizeram as mordeduras da Morte.</p> + +<p>O Sábio é o Poeta vagaroso: debruçado sobre a ponte, não vai em companhia +das vidas que fogem a cercá-las das águas da Memória para que vivam e se não +percam, espera que regressem e na repetição do que passou vê a grande unidade +convivente de tudo o que existe. Procura a <i>identidade</i> que une os seres, +espera na <i>repetição</i> o reaparecimento do que transita. A sua luta pela +Consciência é a mais humilde e serena.</p> + +<p>A consciência scientifica é cheia de abdicação do que é própriamente humano, +comovida de respeito pela Unidade social do Universo.</p> + +<p>O ascetismo do sábio, feito da possivel abdicação dos planos superiores, +leva-o à mais completa companhia<span class="pn">{8}</span> com as realidades +do seu plano. O seu esforço para a consciência é o mais vigoroso esfôrço para +fixar o desenho das vagas da Memória, sem a aventura argonáutica de deixar a +praia em demanda do grande Oceano que a beija.</p> + +<p>Mas aquelas partes da sciência, que são as fontes que a alimentam, os +núcleos de invenção, são ainda o mergulho duma alma nas mais altas marés do +grande Oceano da Memória.</p> + +<p>O sábio criador é ainda e sempre o Poeta.</p> + +<p>Newton e Dante são igualmente infinitos.</p> + +<p>O seu pensamento tem sempre <i>oculto</i>, quere dizer que nenhuma leitura +os exgota, porque, pela parte em que mergulham no infinito Oceano da Memória, +são incomensuráveis com qualquer modo de contar, isto é, inexgotáveis, eternos +e infinitos. Há, com efeito, uma distinção, e a unica que interessa, entre +tôdas as obras.</p> + +<p>Aquelas cuja riqueza é exgotável por um numero finito de leituras (e quantas +nem uma só leitura compensam!) e aquelas cuja riqueza é <i>criacionista</i> e +excedente, pois aumenta com as próprias tentativas de exaustão.</p> + +<p>Imaginai um Arquimedes procurando exaurir um volume terminado por linhas +curvas e à medida que ia descontando paralelipípedos o fosse encontrando novo e +acrescido. Assim são os livros dos verdadeiros Poetas: sua própria alma, +infinita dádiva do seu perfeito Amor.</p> + +<p>Os outros... os outros podem ainda ser humildes soldados da Grande Guerra +contra a Morte, sustentando com firmeza os troféus das vitórias já alcançadas. +</p> + +<p>¡Mas ai do livro que depois de lido uma vez não foi mais desejado ainda que +antes da primeira leitura! Êle leva dentro de si mais esquecimento e morte que +vitória e consciência.</p> + +<p>Êsses livros que crescem, e sem fim, são os fios subtis que prendem o homem +aos planos espirituais<span class="pn">{9}</span> superiores, são as flechas +dardejantes do mistério apontadas ao próprio coração humano.</p> + +<p>É neste sentido que há livros revelados e só legiveis na iluminação da +própria luz espiritual que os embebe.</p> + +<p>É, neste sentido, que existem bíblias: vivas línguas de fogo acrisolando o +pensamento humano.</p> + +<p>A Divina Comédia, D. Quixote, os Evangelhos: outras tantas línguas de fogo +ligando a terra com o firmamento.</p> + +<p>Êsses livros serão humanos, pagãos e divinos.</p> + +<p>Tudo transita, flui e morre.</p> + +<p>Ou nos salvamos todos, ou é impossivel a salvação.</p> + +<p>O mais insignificante atrito duma areia póde inutilizar a mais poderosa e +perfeita máquina.</p> + +<p>Um grão de esquecimento permitido no Universo introduzirá a desproporção que +inutiliza a memória, será uma perda singular que há de tornar impossivel em +qualquer outro ser a perfeita harmonia e conservação.</p> + +<p>Um general no momento critico duma batalha poderá acudir a um ponto +principal da sua linha, sofrendo em retorno pequenas derrotas parciais em +outros pontos. Essas derrotas parciais são o fumo de toda a labareda que sóbe, +os resíduos duma evolução que se fez e irá recomeçar, aumentada da vitória +alcançada, no coração da primeira derrota.</p> + +<p>O homem, que se eleva, só sustenta a sua fisionomia angélica ajudando a +evolução, porque as forças de Morte ainda o hão de perseguir e, se não continua +subindo, há de degradar-se em caricatura animal.</p> + +<p>No rio do tempo vão fugindo as cousas, os seres, os mundos e o homem.</p> + +<p>O Poeta é o seu redentor.</p> + +<p>A unica redenção é o grande baptismo no divino Oceano da Memória.<span +class="pn">{10}</span></p> + +<p>O Poeta revelou a consciência aos homens, porque neles fixou e acendeu +aquela serena e firme estrela, que, no seu ponto de interferência, os raios do +Amor infinito geraram em Memória.</p> + +<p>Por essa Memória é o homem a praia onde marulham os oceanos de outras vidas, +o foco onde se reunem as vibrações etéreas de todos os sóis.</p> + +<p>A Tragédia grega, D. Quixote, os Evangelhos, a Divina Comédia, Camões...</p> + +<p>D. Quixote é a Bíblia do Ideal!</p> + +<p>O Ideal é a ausência duma percepção espiritual, é nessa ausência que se +insinua o Mistério...</p> + +<p>Eis porque o Ideal é presença invisível mas activa, fecunda presença de +realidades superiores que, como o longínquo polo para a agulha, polarizam a +vida do homem, embora este as não perceba, nem toque.</p> + +<p>D. Quixote é a própria fome do Ideal. Fome insatisfeita no plano de vida +terrestre, porque é nesse plano a presença de realidades espirituais +excedentes.</p> + +<p>Eis porque o D. Quixote é eterno; morto o planeta, êle será ainda em +qualquer vida a sua distância a um plano superior.</p> + +<p>D. Quixote vive em todos os homens, são as próprias asas do seu sonho, é a +ausência e o desejo de Deus.</p> + +<p>Sob êsse ponto de vista, todo o esforço para a consciência, que é a própria +linha de evolução dos mundos, da vida e do homem, a sciência, a arte e a moral, +é uma sedução quixotesca, é o influxo superior que uniu a alma de Cervantes às +realidades espirituais transcendentes.</p> + +<p>D. Quixote é o Ideal; o Evangelho é a própria visão espiritual exaltada aos +planos superiores da divindade.</p> + +<p>D. Quixote é o cego impelido para a Beleza por um pressentimento interior; +Cristo é a própria Luz abrindo olhos de percepção espiritual na máscara pávida +do homem.<span class="pn">{11}</span></p> + +<p>D. Quixote é a subida das águas no vazio que o turbilhão formara; Cristo é a +<i>ascenção</i> das almas na estrada de luz que a sua passagem incendiou.</p> + +<p>A tragédia grega é a luta do homem com a Fatalidade, isto é, das forças de +vida contra todos os residuos da evolução amalgamados e condensados num unico +bloco de Fatalidade.</p> + +<p>Por baixo do mais fácil e gracioso politeísmo corre e flutua um pandemonismo +informe, recebendo todas as precipitações residuais do alto.</p> + +<p>Hesiodo e Eschylo passeiam entre as sombras; Sócrates e Platão entre as +frescas claridades duma manhã de Abril.</p> + +<p>Mas Platão sabe que essas claridades podem ser as sombras duma outra luz e a +alegoria da caverna <i>vive</i> a chamar a atenção do homem...</p> + +<p>A Divina Comédia é o sonho de Jacob em plena vigilia, é a onda iniciada num +estremecimento da alma do Poeta e alargando e subindo, penetrando em todos os +planos da vida espiritual...</p> + +<p>Argonautas do Mistério que elevam a consciência a eternas visões da +realidade.</p> + +<p>Mas o mais insignificante Poeta é ainda capaz de fixar qualquer fugitivo +estremecimento e chamá-lo para a vida no próprio instante em que +silenciosamente se ia fenecendo.</p> + +<p style="text-align:center;margin-left:auto;margin-right:auto;" +class="ni">*<br> +* *</p> + +<p>A Arte é um formidável fenómeno de osmose: a alma do artista ressoa de tôdos +os estremecimentos da natureza e a natureza é pintada com as tintas da sua +alma.</p> + +<p>O Universo, é convívio, por isso o artista retribui, e em excesso, tôdas as +dádivas que recebeu.</p> + +<p><i>O Mar, o mar dos portugueses, entrou pelas órbitas do Poeta e saiu +cantando as oitavas dos «Lusíadas».</i><span class="pn">{12}</span></p> + +<p>E tão íntimo foi o abraço, tão perfeita a transfusão que o marulho longínquo +do Oceano é esta própria fala:</p> + +<blockquote> + «Bramindo o negro mar de longe brada<br> + Como se desse em vão nalgum rochedo»</blockquote> + +<p>Portugal encapela-se em ondas, a sua vida comunica-se e de praia a praia é +um abraço cingindo o planeta.</p> + +<p>A vida do planeta é convivência no Infinito, a alma de Camões ligou, pelos +fios invisiveis da memória, o Mar e a Pátria à vida espiritual do Universo.</p> + +<p>As oitavas dos <i>Lusíadas</i>, ondas do mar salgado, são eternos +estremecimentos de Memória esculpindo no Infinito a <i>fisionomia espiritual da +Pátria</i>.</p> + +<p>O homem pertence a vários planos de vida espiritual: é cidadão da sua +pátria, membro da sua religião, parcela consciente no Universo.</p> + +<p>E cada plano é atravessado pelo esfôrço do homem-consciência para a +conservação e para a Memória.</p> + +<p>É por isso que em cada plano há névoa e sonho e o homem estremece duma +nostalgia inquietante.</p> + +<p>O homem é o desterrado de Soares dos Reis...</p> + +<p>Se o Universo desde o sábio ao Poeta (e sem que prejulgue o problema Mal) é +convívio, a consciência do homem há de procurar as relações cósmicas na +companhia das consciências mais próximas.</p> + +<p>Eis porque o homem, consciência no Infinito, é cidadão na sua Pátria e une a +sua voz à voz de seus irmãos para erguer em côro a própria voz da Pátria. E, +como as almas só crescem pelo sacrificio dos desejos de separatividade que as +fôrças da Morte nelas insinuaram, o amor da Pátria é a primeira e a mais +concreta experiência religiosa das almas.</p> + +<p>Mal vai, no entanto, às Pátrias que, vítimas dum orgulhoso isolamento +demoniaco, não prolongam o<span class="pn">{13}</span> sacrifício das almas não +alargam os seus estremecimentos de amor até à vida cósmica e infinita.</p> + +<p>Se Deus é a própria consciência social, para que esta não pese e adormeça as +almas necessario é que cresça e se ilimite em consciência social do Universo. +</p> + +<p>O amor da Pátria será o amor dos homens e das coisas, encerrando-se em +eterno e renovado amor de Deus.</p> + +<p>A voz dos portugueses, espessada, avolumando em ampliativos e excedentes +abraços, será a epopeia da Pátria levando no seu canto o mar e a paisagem, os +homens, a terra e o céu.</p> + +<p>As oitavas dos <i>Lusíadas</i> são as ondas do mar levando em espuma as +bandeiras das batalhas, trapejando ao vendaval dos heroismos, os sonhos da +raça, o amor, Coimbra e o Mondego, os montes, campos e boninas...</p> + +<p>A crítica mais ou menos boticária entreviu nos <i>Lusíadas</i> uma +<i>mistura</i> do maravilhoso pagão e do maravilhoso cristão.</p> + +<p>É tempo de acabar com tanta incompreensão, de dizer bem alto que uma obra de +arte é um ser vivo, uma viva consciência salvando para a Memória o fluxo que +transita. Jamais será a mistura de mortes e quimeras.</p> + +<p>Há nos <i>Lusíadas</i>, como em toda a labareda, uma parte incombustivel que +a chama não incendeia e tomba em inerte poeira de cinzas.</p> + +<p>Incombustível, quando o coração do Poeta não arde em tão alto fogo devorador +que tudo queima.</p> + +<p>É a erudição do Poeta, que fornece o alimento à chama, e, se o fogo do +pensamento é génio, tudo arde em vivo lume de beleza e eternidade.</p> + +<p>Por vezes, sim, por vezes o calor do pensamento não basta a requeimar essa +erudição, e então na fluidez das oitavas boiam estátuas mutiladas de deuses +mortos e ausentes.</p> + +<p>Mas êsse é o fumo que faz toda a labareda humana<span class="pn">{14}</span> +é o sinal de origem que, marcando a imperfeição do homem, sublinha a divindade +do Poeta.</p> + +<p>O pensamento vulgar, não subindo acima das mais próximas realidades, ignora +a natureza e o valor do simbolismo, chegando a supor que os símbolos poéticos +são artifícios decorativos com que o Poeta procura deleitar-nos a +sensibilidade.</p> + +<p>Daí a ideia dum maravilhoso que, como as decorações dos arraiais minhotos, +passa de poeta em poeta.</p> + +<p>Se conhecer é relacionar, é sempre uma atenuada ou viva analogia a alma do +próprio conhecimento, que da sciência à arte é sempre, embora diferentemente, +um simbolismo.</p> + +<p>O simbolismo pagão é a grande concepção estética da Natureza e da Vida. As +contradições entre o homem e a natureza resumem-se ainda às relações de +silencio e convivio, que o homem encontra e harmoniza na quási tangibilidade +dos deuses mal escondidos ainda no seio duma natureza amiga.</p> + +<p>O murmúrio da floresta é quási o sôpro, repousado e possante, duma +respiração imensa; a tremulina de luz, que percorre o ribeiro quando um ruído +se ergue do estremecimento do canavial, é o próprio corpo da Frescura a +caminhar; o bulício das selvas multiplicando e fecundando a vida é a própria +Vida espalhada e vagabunda juntando-se para crescer; o silêncio pontiluzente, +meditativo e severo, da Noite estrelada é a própria serenidade da distância a +olhar: sátiros, ninfas, hamadríadas, nereidas, faunos e deuses passeiam por +entre os homens...</p> + +<p>O mundo é a convivência ingénua, mas já os dragões e as serpentes de novo +assustam e repelem a sensibilidade do homem.</p> + +<p>Êle terá de reencontrar a companhia a dentro de si mesmo...</p> + +<p>Se o corpo de Vénus é feito da espuma do Mar, a Virgem Maria é a mais alta e +translucida espuma da Alma.<span class="pn">{15}</span></p> + +<p>Um paganismo simples e gracioso apreendeu na vida universal as mesmas +fôrças, tendências e elementares vontades, que trabalham silenciosamente nas +profundezas do ser humano; mas já as lutas <i>titânicas</i> revelam na Natureza +vontades inimigas, que nos assediam e oprimem.</p> + +<p>Um titanismo vitorioso, coberto de glória e feridas, pode voltar a ressentir +a beleza ingénua, a inocência e o bem, na fórma da aragem que embala as +florinhas, na frescura humilde do arroio, na sombra acolhedora da árvore, no +sonho que trespassa a grande voz dos elementos.</p> + +<p>Eis porque não há maravilhoso nem misturas de maravilhoso, há sim uma voz +humana que é contemporaneamente estremecimento da alma e do ar, que fulgura, no +éter interior e no éter envolvente, a mesma luminosa geometria. Nos +<i>Lusíadas</i> há alegria campesina, boninas, prados e jardins, uma natureza +inocente e sem mácula; mas há tambêm águas que são já lágrimas de amor saudoso, +há montes e ervinhas que andam a aprender no peito de Inês.</p> + +<p>E a paisagem de Coimbra ainda hoje vive a repetir essas lições; na Quinta +das Lágrimas ainda hoje, da fonte correm sem descanço, ressoando em éco, os +versos desta oitava:</p> + +<blockquote> + «As filhas do Mondêgo a morte escura<br> + Longo tempo chorando memoraram;<br> + E por memória eterna, em fonte pura<br> + As lágrimas choradas transformaram:<br> + O nome lhe puseram, que inda dura,<br> + Dos amôres de Inês, que ali passaram<br> + Vêde que fresca fonte rega as flôres,<br> + Que lágrimas são a água e o nome amores».</blockquote> + +<p>A Natureza não existe fora da convivência do homem. Ora simples, silenciosa +e profunda, duma inocente religiosidade elementar, ora destroçada e perdida se +a não socorre a memória.</p> + +<p>Fonte que é o simples murmúrio da gratidão das<span class="pn">{16}</span> +sêdes, leito de frescura da ninfa adormecida, translucida neblina das rendas +que a vestem; fonte que discorre em lágrimas as saudades dum amor +distante...</p> + +<p><i>É esta Natureza que o Poeta tem de conquistar para a alma, é esta +natureza que a Pátria tem de desvendar para o mundo.</i></p> + +<p><i>Viajar é compreender</i>: por ignotos rumos procurar e levar companhia +aos seres e às cousas da distância, alargar, dilatar a alma para além dos +horizontes, ampliando o convívio, <i>contactando</i> por maior superficie a +grande zona do Mistério.</p> + +<p>Ao partir para a viagem, acorrem tôdas as vozes da tranquilidade doméstica, +demovendo e comovendo, tentando prender o homem à firmeza das ligações criadas, +temendo a deslialdade e o esquecimento.</p> + +<p>Há vozes de egoísmo e de preguiça, mas há tambem vozes proféticas que acusam +a nossa vontade pecaminosa de não ir em busca de novas amizades, mas de +ambições e maiores egoísmos.</p> + +<p>Uma noite, era eu ainda colegial, senti, olhando da sala de estudo o côncavo +firmamento estrelado, a atracção dum astro distante, e a minha alma infantil +partiu súbitamente ao chamamento da distância; de repente um frio de +isolamento, de abandono, me fez regressar instantaneamente ao calor e ao abrigo +dos homens, que, embora pouco carinhoso, me falava, era meu, era convívio, +conhecimento, mútuo amparo.</p> + +<p>Jamais se apagou da minha memória essa <i>sensação</i> única, que hoje +suponho o primeiro e mais perfeito contacto do meu ser com o Mistério.</p> + +<p>Tambem, ao partir, o Velho do Restelo virá... E à despedida, há de dizer +egoísmos, mas há de tambem prevenir os egoísmos, as ambições e as cubiças para +que não aumentem com o tamanho dos mundos que lhes vão ser dados.</p> + +<p>E o Velho sabe que a Viagem, a Epopeia, é uma obra prometaica, de «fogo de +altos desejos que a movera».<span class="pn">{17}</span></p> + +<p>O homem Prometeu é o homem dando o infinito aos seus desejos, partindo para +alêm dos deuses familiares, correndo o risco de ficar só e às escuras no Espaço +sem fim, onde só um novo Deus de infinito amor poderá ser companhia.</p> + +<p>Êsse homem Prometeu, perdido e vagabundo, encontrou a mão de Jesus +reconduzindo-o a Deus; ¿mas quantos ainda hoje passeiam num Infinito mudo a +desolada estátua de sua solidão e tristeza?</p> + +<p>A Epopeia vai fazer-se: os portugueses partem ligando os mundos, e, ao +dobrar da África, o velho do Restelo é o Prometeu português, o Adamastor +petrificado, prevenindo de novo as almas das duras consequências da audácia, +das dôres companheiras de toda a criação.</p> + +<p>O Velho desejara que o fogo dos altos desejos prometaicos não tivera ardido, +e profetizara com uma voz tão sábia e prevenida que bem parece ser a própria +voz dum doloroso saber de experiências.</p> + +<p>O Velho acompanha a frota e de novo. Maior, Imenso e Tormentoso, quere vedar +o Mistério, conter as forças de bem e de mal que os navegadores estão prestes a +libertar.</p> + +<p>Profetiza e ameaça, mas, quando interrogado em palavras lusíadas, conta aos +portugueses, ao mar e às nuvens, a tragédia esquiliana da sua aventura.</p> + +<p>O irmão Prometeu roubara o fogo aos deuses, êle quisera furtar-lhes o amor. +</p> + +<p>A Luz prometaica iluminara os mundos, mas o Espaço regelado não fôra +comovido por essa fria luz da inteligência: a candeia cristã vai purificar e +aquecer essa luz e será o Amor a Grande Presença Universal, dadivosa e +inexgotável.</p> + +<p>Eis porque o Prometeu português tem um Cáucaso—é o términus do mundo +conhecido, aprisionado em contacto com as primeiras ondas do mundo misterioso! +</p> + +<p>Eis porque Adamastor tem um abutre—os próprios braços do amor, regaço +ondulado de Thetis, fazendo<span class="pn">{18}</span> estremecer +infinitamente a bruteza penhascosa do seu corpo.</p> + +<blockquote> + «Converte-se-me a carne em terra dura,<br> + Em penedos os ossos se fizeram;<br> + Estes membros que vês, e esta figura<br> + Por estas longas agoas se estenderam:<br> + Emfim, minha grandissima estatura<br> + Neste remoto cabo converteram<br> + Os deoses; e por mais dobradas magoas,<br> + Me anda Thetis cercando destas agoas». </blockquote> + +<p>O seu corpo é beijado pelas mil bôcas do amor que o devora, e, abraçado à +névoa do corpo amado, sobe liberto o seu desejo, penetrando <i>em lágrimas</i> +as funduras oceânicas em que se abisma.</p> + +<p>E <i>chora</i>, <i>chove</i>, desfaz-se a nuvem negra e de novo o Sol +reaquece mais desejos...</p> + +<p>¡Alma sedenta da Pátria, inextinguivel fome de imortalidade, com o amor +cravado no mais intimo do seu querer!</p> + +<p>¡A fisionomia espiritual da Pátria traçada a fogo no próprio coração do +Infinito!</p> + +<p>E lá vai Vasco da Gama num Mar, que não é do Planeta, levando a raça numa +Viagem sem termo a ouvir e libertar Adamastores, correndo num pacifico Oceano +de Memória a sua eterna aventura religiosa.</p> + +<p>E, cantando com o Poeta, tôdos nós somos já espectros duma outra vida, +formas duma luz transcendente penetrando o planeta dos estremecimentos do +Infinito.</p> + +<p>É a Grande Viagem: O Gama ao leme, o Poeta fazendo do seu canto o próprio +Oceano em que vogamos, e nós, reconciliados com Êle, em êxtase, cantando a +beleza profunda e eterna das almas...</p> + +<p>Faça cada português as suas pazes com Camões e, de novo, no Infinito, +radiosa e feliz, a Pátria há de sorrir...</p> + +<p> </p> + +<p>(Disse).</p> +</div> + + + + + + + +<pre> + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Camões e a Fisionomia Espiritual da +Pátria, by Leonardo Coimbra + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CAMÕES E A FISIONOMIA *** + +***** This file should be named 32789-h.htm or 32789-h.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + https://www.gutenberg.org/3/2/7/8/32789/ + +Produced by Pedro Saborano + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. They may be modified and printed and given away--you may do +practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is +subject to the trademark license, especially commercial +redistribution. + + + +*** START: FULL LICENSE *** + +THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE +PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK + +To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free +distribution of electronic works, by using or distributing this work +(or any other work associated in any way with the phrase "Project +Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project +Gutenberg-tm License (available with this file or online at +https://gutenberg.org/license). + + +Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm +electronic works + +1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm +electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to +and accept all the terms of this license and intellectual property +(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all +the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy +all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession. +If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project +Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the +terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or +entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. + +1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be +used on or associated in any way with an electronic work by people who +agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few +things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works +even without complying with the full terms of this agreement. See +paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project +Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement +and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic +works. See paragraph 1.E below. + +1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation" +or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project +Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the +collection are in the public domain in the United States. If an +individual work is in the public domain in the United States and you are +located in the United States, we do not claim a right to prevent you from +copying, distributing, performing, displaying or creating derivative +works based on the work as long as all references to Project Gutenberg +are removed. Of course, we hope that you will support the Project +Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by +freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of +this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with +the work. You can easily comply with the terms of this agreement by +keeping this work in the same format with its attached full Project +Gutenberg-tm License when you share it without charge with others. + +1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern +what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in +a constant state of change. If you are outside the United States, check +the laws of your country in addition to the terms of this agreement +before downloading, copying, displaying, performing, distributing or +creating derivative works based on this work or any other Project +Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning +the copyright status of any work in any country outside the United +States. + +1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg: + +1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate +access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently +whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the +phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project +Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, +copied or distributed: + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + +1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived +from the public domain (does not contain a notice indicating that it is +posted with permission of the copyright holder), the work can be copied +and distributed to anyone in the United States without paying any fees +or charges. If you are redistributing or providing access to a work +with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the +work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1 +through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the +Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or +1.E.9. + +1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted +with the permission of the copyright holder, your use and distribution +must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional +terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked +to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the +permission of the copyright holder found at the beginning of this work. + +1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm +License terms from this work, or any files containing a part of this +work or any other work associated with Project Gutenberg-tm. + +1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this +electronic work, or any part of this electronic work, without +prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with +active links or immediate access to the full terms of the Project +Gutenberg-tm License. + +1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary, +compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any +word processing or hypertext form. However, if you provide access to or +distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than +"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version +posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org), +you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a +copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon +request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other +form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm +License as specified in paragraph 1.E.1. + +1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying, +performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works +unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9. + +1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing +access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided +that + +- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from + the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method + you already use to calculate your applicable taxes. The fee is + owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he + has agreed to donate royalties under this paragraph to the + Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments + must be paid within 60 days following each date on which you + prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax + returns. Royalty payments should be clearly marked as such and + sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the + address specified in Section 4, "Information about donations to + the Project Gutenberg Literary Archive Foundation." + +- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies + you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he + does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm + License. You must require such a user to return or + destroy all copies of the works possessed in a physical medium + and discontinue all use of and all access to other copies of + Project Gutenberg-tm works. + +- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any + money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the + electronic work is discovered and reported to you within 90 days + of receipt of the work. + +- You comply with all other terms of this agreement for free + distribution of Project Gutenberg-tm works. + +1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm +electronic work or group of works on different terms than are set +forth in this agreement, you must obtain permission in writing from +both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael +Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the +Foundation as set forth in Section 3 below. + +1.F. + +1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable +effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread +public domain works in creating the Project Gutenberg-tm +collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic +works, and the medium on which they may be stored, may contain +"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or +corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual +property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a +computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by +your equipment. + +1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right +of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project +Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project +Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all +liability to you for damages, costs and expenses, including legal +fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT +LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE +PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE +TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE +LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR +INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH +DAMAGE. + +1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a +defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can +receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a +written explanation to the person you received the work from. If you +received the work on a physical medium, you must return the medium with +your written explanation. The person or entity that provided you with +the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a +refund. If you received the work electronically, the person or entity +providing it to you may choose to give you a second opportunity to +receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy +is also defective, you may demand a refund in writing without further +opportunities to fix the problem. + +1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth +in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER +WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO +WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE. + +1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied +warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages. +If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the +law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be +interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by +the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any +provision of this agreement shall not void the remaining provisions. + +1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the +trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone +providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance +with this agreement, and any volunteers associated with the production, +promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works, +harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees, +that arise directly or indirectly from any of the following which you do +or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm +work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any +Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause. + + +Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm + +Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of +electronic works in formats readable by the widest variety of computers +including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at https://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at https://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. Compliance requirements are not uniform and it takes a +considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up +with these requirements. We do not solicit donations in locations +where we have not received written confirmation of compliance. To +SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any +particular state visit https://pglaf.org + +While we cannot and do not solicit contributions from states where we +have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition +against accepting unsolicited donations from donors in such states who +approach us with offers to donate. + +International donations are gratefully accepted, but we cannot make +any statements concerning tax treatment of donations received from +outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. + +Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation +methods and addresses. Donations are accepted in a number of other +ways including including checks, online payments and credit card +donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate + + +Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic +works. + +Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm +concept of a library of electronic works that could be freely shared +with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project +Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. + + +Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed +editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. +unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + https://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. + + +</pre> + +</body> +</html> diff --git a/LICENSE.txt b/LICENSE.txt new file mode 100644 index 0000000..6312041 --- /dev/null +++ b/LICENSE.txt @@ -0,0 +1,11 @@ +This eBook, including all associated images, markup, improvements, +metadata, and any other content or labor, has been confirmed to be +in the PUBLIC DOMAIN IN THE UNITED STATES. + +Procedures for determining public domain status are described in +the "Copyright How-To" at https://www.gutenberg.org. + +No investigation has been made concerning possible copyrights in +jurisdictions other than the United States. Anyone seeking to utilize +this eBook outside of the United States should confirm copyright +status under the laws that apply to them. diff --git a/README.md b/README.md new file mode 100644 index 0000000..24c9daa --- /dev/null +++ b/README.md @@ -0,0 +1,2 @@ +Project Gutenberg (https://www.gutenberg.org) public repository for +eBook #32789 (https://www.gutenberg.org/ebooks/32789) |
