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diff --git a/.gitattributes b/.gitattributes new file mode 100644 index 0000000..6833f05 --- /dev/null +++ b/.gitattributes @@ -0,0 +1,3 @@ +* text=auto +*.txt text +*.md text diff --git a/29529-8.txt b/29529-8.txt new file mode 100644 index 0000000..14595fc --- /dev/null +++ b/29529-8.txt @@ -0,0 +1,3008 @@ +The Project Gutenberg EBook of Historia Antiga, by Unknown + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Historia Antiga + +Author: Unknown + +Release Date: July 28, 2009 [EBook #29529] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK HISTORIA ANTIGA *** + + + + +Produced by M. Silva + + + + + + PROPAGANDA DE INSTRUCÇÃO + + PARA + + Portuguezes e Brazileiros + + BIBLIOTHECA DO POVO + + E DAS ESCOLAS + + + + HISTORIA ANTIGA + + + + CADA VOLUME 50 REIS + + TERCEIRO ANNO--OITAVA SERIE + + Cada volume abrange 64 paginas, de composição cheia, edição + estereotypada,--e fórma um tratado elementar completo n'algum + ramo de sciencias, artes ou industrias, um florilegio litterario, + ou um aggregado de conhecimentos uteis e indispensaveis, + expostos por fórma succinta e concisa, mas clara, despretensiosa, + popular, ao alcance de todas as intelligencias. + + + + LISBOA + SECÇÃO EDITORIAL DA COMPANHIA NACIONAL EDITORA + Adm. Justino Guedes + Largo do Conde Barão, 50 + Agencias: PORTO--Largo dos Loyos, 47,1.º + RIO DE JANEIRO--R. da Quitanda, 38 + 1900 + + NUMERO 58 + + + + +INDICE + + INTRODUCÇÃO + CAPITULO I--OS HEBREUS + CAPITULO II--OS EGYPCIOS + CAPITULO III--OS ASSYRIOS E BABYLONIOS + CAPITULO IV--OS PHENICIOS + CAPITULO V--OS CARTHAGINEZES + CAPITULO VI--OS SYRIOS + CAPITULO VII--OS PERSAS + CAPITULO VIII--OS INDIOS + CAPITULO IX--OS CHINS + CAPITULO X--OS GREGOS + CAPITULO XI--OS ROMANOS + + + +ERRATAS IMPORTANTES + + Pag. Linha Onde se lê Leia-se + + 11 36 elementos alimentos + + 12 18 Amvrão Amrão + + » 27 Egypto Egypto, por meio + + 14 26 peccado, peccado,-- + + » 42 altar, um altar + + » 44 estão estavam + + 15 38 incluindo incluido + + 22 6 de que do que + + 33 19 moisaica moysayca + + 52 31 tomam tomaram + + 53 6 impervas impervias + + 57 33 notas novas + + 58 17 seis reis + + + + +HISTORIA ANTIGA + + + + +INTRODUCÇÃO + +LIMITES DA HISTORIA ANTIGA--SUA DIVISÃO--TEMPOS PRE-HISTORICOS--O HOMEM +PRE-HISTORICO--EDADE DE PEDRA--EDADE DE BRONZE--RAÇAS HISTORICAS OU +PRIMITIVAS--OS POVOS DA ANTIGUIDADE + + +Conforme ao que dissémos no tratadinho de _Historia Universal_ (vol. +XLVI da _Bibliotheca do Povo e das Escolas_), começa a _Historia Antiga_ +desde as mais remotas epochas de que possa haver-se conhecimento e +prolonga-se até ao seculo V da era christan. + +N'ella se comprehende a epocha da phase brilhante dos povos orientaes, a +qual mais tarde esmoreceu perante a supremacia que vieram a adquirir as +civilizações classicas--primeiro a grega e depois a romana--na Europa, +comparativamente com os poderosos e vastos imperios da Asia e do norte +da Africa. O longo periodo da Historia Antiga fecha com o desmoronamento +do imperio romano. + +A _Historia Antiga_ pode dividir-se em tres periodos, cada um dos quaes +se divide por sua vez em epochas principaes. + +Os tres periodos são;--o dos _tempos primitivos_;--o dos _tempos +mythologicos_;--e o dos _tempos historicos_. + +O primeiro periodo comprehende duas epochas principaes: a da _origem do +homem_, e a do _diluvio_ e da _dispersão dos homens_, segundo a tradição +biblica. + +No segundo periodo notam-se tres epochas principaes que são:--a dos +_tempos idolatras_, caracterizada pela fundação dos imperios da China, +da Asia, do Egypto, e da Grecia, e pela tendencia que os povos tinham +a elevar á categoria de deuses os seus primeiros soberanos;--a dos +_tempos heroicos_, em que appareceram grandes conquistadores, fundadores +de cidades, e outros homens notaveis, que os povos, então já mais +adeantados, se limitaram a considerar na categoria de heroes ou +semi-deuses;--a dos _tempos poeticos_, ou epocha em que os prophetas e +os poetas exerceram uma acção efficaz sobre o progresso da civilização, +e deram a fórma poetica ás tradições e á legislação. + +No periodo dos _tempos historicos_ (aquelle de que possuimos noções mais +seguras e mais positivas) são seis as epochas principaes, a saber:--a +_epocha legislativa_, em que sobresaem quatro personagens mais notaveis: +Lycurgo, Numa, Solon e Confucio;--a _epocha da grande gloria da Grecia_, +na qual esta nação teve a supremacia da civilização na Europa, então +começada a aproveitar pela expansão progressiva do Oriente;--a das +_conquistas dos Romanos_, que se substituiram aos Gregos na dominação e +na influencia, e alargaram consideravelmente a colonização até ao +occidente da Europa;--a das _dissenções intestinas da republica +romana_;--a do _grande explendor do imperio romano_;--a da _decadencia +do mesmo imperio_, cujo desmoronamento põe termo á Historia Antiga, e +abre com a invasão dos Barbaros do norte o periodo da Historia da +Edade-Média. + +Reina ainda bastante incerteza na sciencia da Historia ácêrca da +verdadeira epocha do apparecimento do homem sobre a superficie da Terra. +Por muito tempo foi geralmente acceito que, se tal epocha não era +exactamente contemporanea das mais antigas civilizações orientaes de que +temos noticia, pelo menos não era anterior ao actual periodo geologico, +e que o homem sómente havia apparecido pela primeira vez n'um periodo +relativamente recente e já contemporaneo da fauna e da flóra actuaes, +cêrca do logar em que as tradições de differentes povos fazem demorar o +berço da especie humana. + +Os descobrimentos da Geologia, sciencia moderna mas já abundante em +resultados definidos, têem, porêm, tirado o valor áquella noção e +demonstram ser mais antiga a existencia do homem na superficie da Terra. +Com os elementos que aquella sciencia lhe fornece, a Archeologia +Pre-historica, de creação muito recente mas de rapidos progressos, tem +chegado a adquirir o conhecimento de que o homem existia desde uma +epocha muitos milhares de annos anterior á actual, tendo até chegado a +ganhar n'essas remotissimas edades um certo gráu de cultura, +traduzido no exercicio de industria, de commercio, e ainda n'outras +manifestações de actividade. + +A existencia do homem primitivo, ou do _homem pre-historico_, ou de +raças humanas de que pela Historia propriamente dita não temos +conhecimento algum, é-nos revelada pelo descobrimento de instrumentos de +pedra (utensilios mais ou menos grosseiramente fabricados com aquelle +mineral, e affeiçoados a differentes usos) e pelo de fragmentos de peças +de loiça, de armas e de differentes outros utensilios de uso +domestico,--tudo em camadas de formação anterior ao actual periodo +geologico. + +Estes vestigios evidentes do homem pre-historico incontram-se nas +excavações feitas nas camadas de terreno correspondentes ao periodo que +a Geologia denomina _quaternario_, periodo que é o immediatamente +anterior ao actual. Mais recentes descobrimentos, porêm, parecem provar +que a existencia do homem é ainda anterior áquelle periodo. Excavações +feitas em terrenos do periodo _terciario_ tendem effectivamente a +revelar a existencia do homem durante a formação dos mesmos terrenos. É +no terreno denominado _mioceno_ que se incontram os vestigios que levam +a essa conclusão, e d'ahi provêm o nome de _homem mioceno_ ou _homem +terciario_ ao homem que se julga ter existido no referido periodo +geologico[1]. + + [1] Veja-se o livrinho de _Geologia_ (vol. XXXI da _Bibliotheca + do Povo e das Escolas_). + +Não acceitam ainda todos os archeologos a existencia do homem terciario; +mas a opinião que a defende vai cada dia ganhando mais terreno. O +congresso de Anthropologia e de Archeologia pre-historica, que em 1880 +se reuniu em Lisboa, tratou essa questão e contribuiu muito para a sua +resolução definitiva, sendo importantes os dados que para isso +forneceram as excavações feitas no nosso paiz e os achados n'ellas +realizados pelo eminente geologo portuguez Carlos Ribeiro, ha pouco +fallecido. + +A Archeologia Pre-historica divide o periodo _quaternario_, sob o +ponto-de-vista da existencia de vestigios da especie humana, em duas +epochas:--a _edade paleolithica_, ou da pedra lascada;--e a _edade +neolithica_, ou da pedra polida. A substancia de que são fabricados os +instrumentos achados, e a perfeição relativa do seu fabrico, são os +fundamentos que fornecem os caracteres distinctivos das duas edades. + +Á edade paleolithica pertencem armas e instrumentos de silex, +principalmente machados, talhados toscamente pela separação de lascas +tiradas pela percussão. Estes instrumentos tinham evidentemente por fim +o cortar, e alguns, de pontas mais aguçadas, o de furar. Alguns ha, com +fórma similhante á das raspadeiras, que deviam servir para preparar as +pelles de animaes, com que se vestiam os primeiros homens. Os vestigios +correspondentes a esta epocha pre-historica fazem crer que o modo de +viver da especie humana foi então de extrema simplicidade, que eram +desconhecidos os animaes domesticos e a agricultura, que os homens +vagueavam pelas florestas virgens, alimentando-se com os fructos +silvestres e com o producto da caça, e abrigando-se nas cavernas +naturaes, cuja posse ás vezes se viam obrigados a disputar aos animaes +ferozes. A alimentação dos que viviam á beira do mar ou dos lagos +consistia em peixe e marisco. O estado social devia ser o mais +rudimentar possivel; apenas se pode considerar n'aquella epocha esboçado +o viver da familia. Aquelle modo de viver era por certo ainda mais +simples e primitivo do que o dos actuaes selvagens da Nova Caledonia. + +Um pouco mais perfeito foi de certo o viver na edade neolithica. As +armas e os utensilios d'aquella epocha são distinctos dos da edade +paleolithica por certas particularidades de fórma e pela maior perfeição +do trabalho, a qual já denuncia um mais adeantado estado de educação, +havendo entre os fragmentos de loiça e entre os objectos de ornato +incontrados alguns que revelam uma certa industria, ainda rudimentar, +mas já com algum desinvolvimento. Julga-se que n'estas epochas se +practicou já o commercio, por se encontrarem n'algumas localidades +substancias que eram produzidas em sitios distantes, assim como +vestigios da existencia de officinas levam a crer que effectivamente a +industria se delineava já com feições pronunciadas. + +Aos ultimos tempos da edade neolithica pertencem os chamados +_kjoeckkenmoeddinger_ («restos de cozinha»), que são grandes +aglomerações de conchas de differentes mariscos, misturadas com carvão, +incontradas nas costas da Dinamarca, e tambem mais recentemente no valle +do Tejo, junto a Mugem, pelo já citado geologo Carlos Ribeiro. Pertencem +tambem á mesma epocha as _palafittas_, ou povoações lacustres, achadas +pela primeira vez no lago de Zurich em 1853, e que consistem em reuniões +de cabanas junto das margens dos lagos, construidas sobre base de +estacaria mergulhada na agua. Nas _palafittas_ incontram-se notaveis +vestigios, que provam o relativo adeantamento da especie humana +n'aquelles tempos. É assim que a existencia de cereaes demonstra que já +havia agricultura; a de tecidos, que a industria se tinha adeantado; +a de fragmentos de animaes domesticos, um viver social em via de progresso. + +A existencia de utensilios de metal nas _palafittas_ indica que a epocha +d'estas se prende chronologicamente ao começo dos tempos historicos, ou +pelo menos ao periodo que precedeu a aurora das mais antigas +civilizações do Oriente. Começa n'esse ponto a _edade de bronze_, ou +aquella em que as armas e os diversos utensilios, até então construidos +exclusivamente de pedra, começam a ser substituidos por outros +fabricados de bronze. + +A _edade de bronze_ variou muito em duração nos diversos paizes da +Europa, sendo n'alguns povos uma epocha inteiramente historica, e +pertencendo, pelo que respeita a outros, á Archeologia Pre-historica. No +seu todo deve considerar-se como um periodo de transição entre os tempos +pre-historicos e os tempos historicos. + +Os povos que figuram na Historia da Antiguidade provêm de uma das tres +raças _semitica_, _chamitica_ e _japhetida_ (mais geralmente denominada +_aryana_ ou _indo-européa_), as quaes por isso se dizem _raças +historicas_. A existencia d'estes tres troncos primitivos é revelada +pela tradição biblica e confirmada pelas modernas investigações +ethnographicas. Quando, decorrido longo periodo depois da creação do +homem, Deus, offendido pelos vicios que haviam lavrado em toda a especia +humana, resolveu castigál-a com o diluvio, apenas quiz que escapasse +Noé, que era justo, com sua familia. Terminado aquelle cataclismo, só os +tres filhos d'elle ficaram incumbidos de povoar o mundo, e cada um +d'elles--Sem, Cham e Japhet--indo estabelecer-se em pontos differentes +deu origem a uma raça. Sem ficou na Asia e foi o pai da raça semitica; +Cham passou á Africa e originou a raça chamitica; e finalmente Japhet, +estabelecendo-se no oriente da Europa, deu origem á raça japhetida, ou +aryana, ou indo-europêa, assim denominada, porque na sua expansão +ulterior se estendeu até ás Indias. + +A raça semitica--(ou os semitas)--apparece-nos, no decorrer da Historia +Antiga, povoando um vasto territorio cingido de um lado peia alta +Mesopotamia e pela parte meridional da Arabia, e do outro pelas costas +do Mediterraneo e pelo rio Tigre. Eram d'esta raça os habitantes do +imperio da Assyria e de parte da Babylonia, os Hebreus, os Lydios e +parte das populações da Syria. Presentemente esta raça está representada +pelos Judeus e pelos Arabes. A sua importancia historica deriva +principalmente das religiões que n'ella tiveram origem e do +desinvolvimento a que estas chegaram. N'ella nasceram a antiga religião +moysaica, o christianismo e o mahometanismo. Na Edade-Média um ramo +d'esta raça--os Arabes--, invadindo a Europa, trouxeram-lhe grande copia +da sciencia grega, contribuindo assim para a civilização d'esta parte do +mundo. + +A raça chamitica--(ou os chamitas)--povoou na Antiguidade a Ethiopia, o +Egypto e a Nubia, e incorporou-se tambem na população de Babylonia e da +Arabia meridional. Na actualidade está representada pelos _fellahs_ do +Egypto, pelos habitantes da Nubia, pelos _abexins_ e pelos _tuaregs_. + +A raça aryana--os aryas, os indo-europeus--foi representada na +Antiguidade pelos Indus, Persas, Romanos e Gregos; e actualmente está-o +sendo pelos descendentes d'estes povos e pelos Germanos e Slavos. Os +povos indo-europeus são os mais importantes sob o ponto-de-vista +historico; extendem hoje o seu _habitat_ desde o norte da Europa até ás +margens do Ganges; é no meio d'elles que se passa o grande movimento do +progresso social, e a sua expansão colonizadora extende-se até aos +confins do Novo Mundo, para onde têem transplantado as maravilhas do +progresso e os mais perfeitos methodos de cultura intellectual. + +Ha nas tres raças historicas de que temos falado um grande numero de +variedades, devidas, não só a cruzamentos, mas tambem a modificações +filhas da differente acção dos climas e da diversa influencia do meio. + +O estudo d'essas differentes variedades leva a uma classificação +differente da que sob o ponto-de-vista historico fizemos, e baseada em +caracteres anatomicos que são do dominio da Anthropologia. + +Os principaes povos que figuram na Historia da Antiguidade são: os +Hebreus, os Egypcios, os Assyrios e Babylonyos, os Phenicios, os +Carthaginezes, os Syrios, os Persas, os Indios, os Chins, os Gregos e os +Romanos. De cada um d'elles trataremos em capitulo especial. + + + + +CAPITULO I + +OS HEBREUS + + +A historia dos Hebreus confunde-se no seu principio com as mais antigas +tradições da primitiva edade historica do homem. A mais antiga fonte em +que ella se estuda é o _Genesis_, no qual se acham compendiadas as +tradições da creação do homem e da primitiva dispersão das raças +historicas, em que primeiro se dividiu a familia humana. + +Segundo o _Genesis_, Deus, depois de ter creado o mundo, separado a +terra dos mares, e povoado aquella de plantas e de animaes, creou o +primeiro homem, que teve o nome de Adão, e creou-lhe logo depois para +companheira a primeira mulher, que se chamou Eva. D'este primeiro par +nasceram tres filhos: Caim, Abel e Seth. O primeiro, que se deu á +cultura dos campos, matou por ciumes a seu irmão Abel, expatriando-se em +seguida e indo fundar a cidade de Henochia, que tomou tal nome do +primeiro filho (Henoch) do seu fundador. Abel exercêra o mister de +pastor. Seth, o terceiro filho de Adão, teve numerosa descendencia, na +qual se tornou notavel Noé, pelas circumstancias que vamos referir. + +Em tal devassidão haviam cahido os homens, que Deus, como que +arrependido de os haver creado, resolveu exterminál-os; mas, como Noé e +sua familia conservavam vida virtuosa, no meio do viver vicioso do resto +da humanidade, determinou tambem Deus fazer excepção a respeito d'elles. +Mandou por isso a Noé que construisse uma arca, na qual se mettesse com +a sua familia e com um certo numero de animaes de todas as especies; e, +feito isso, mandou á terra o diluvio, que tudo alagou e em que pereceram +todos os homens e animaes, excepto os que se continham na arca, a qual +fluctuava na superficie da agua. + +Terminado o diluvio, que durou quarenta dias, e tendo baixado as aguas e +descoberto de novo a superficie da terra, poisou por fim a arca sobre o +monte Ararat, na Armenia. Sahiu d'ella Noé, com sua familia e com os +differentes animaes, e começou a cultivar a terra. Foi elle o primeiro +que cultivou a vinha, fabricou vinho e com este se embriagou. + +Falavam a principio todos os homens a mesma linguagem; mas o seguinte +acontecimento deu origem a que entre elles se multiplicassem as +linguas. Tendo-se estabelecido e havendo alargado a sua occupação nas +planicies de Sennaar, entre o Tigre e o Euphrates, tornaram-se +orgulhosos do seu valor e poder, e conceberam o plano de construir uma +torre, que chegasse ao céu. Começaram a pôr em practica o seu temerario +intento; mas Deus, para castigar tamanha ousadia, confundiu-lhes as +linguagens, por fórma que elles, deixando de comprehender-se uns aos +outros, tiveram que abandonar a obra e que dispersar-se. A torre ficou, +pois, por construir-se e denominou-se _Babel_, vocabulo que quer dizer: +_confusão_. Foi aquella dispersão que deu origem á separação das tres +raças, _semitica_, _chamitica_ o _japhetida_, dos nomes dos tres filhos +de Noé--Sem, Cham e Japhet. + +Pouco a pouco se extinguíra na memoria dos homens a sua historia +primitiva e as licções e preceitos que n'essa historia se continham. +Resolveu por isso o Senhor escolher entre os descendentes de Sem uma +familia, que houvesse de ser a guarda e a depositaria das antigas +crenças e tradições. Essa familia foi a de Tharé, originaria de Ur (na +Chaldéa), e que, por causa da falta de pastagens para os gados, havia +ido estabelecer-se na cidade de Haran (na Mesopotamia). Foi alli que +Deus revelou a Abrahão, filho do dito Tharé, a missão divina que lhe +destinára e como resolvêra constituil-o chefe da raça predestinada ou do +_povo escolhido_. Por mandado do Senhor fez Abrahão varias +peregrinações. O Senhor abençoou-o, prometteu-lhe grande descendencia e +disse-lhe que teria de sua mulher Sára, até então esteril, um filho,--o +que se realizou com o nascimento de Isaac. + +Deus, para experimentar a fé e a obediencia de Abrahão, ordenou-lhe que +lhe sacrificasse seu filho Isaac, ao que elle sem repugnancia se +promptificou, afastando-se para consummar tal sacrificio. Quando ía a +descarregar o golpe, Deus lh'o impediu, detendo-lhe o braço e dando-se +por satisfeito com aquella prova de obediencia. + +Isaac teve dois filhos, que foram Esaú e Jacob. Este ultimo, comquanto +mais novo, foi o que recebeu a benção do pae, que estava cego, e que foi +inganado, julgando que abençoava Esaú. Áquella benção, obtida +subrepticiamente, por conselhos e industria de sua mãe, Rebecca, e á +qual estava annexo o cumprimento das promessas que Deus fizera a +Abrahão, deveu Jacob o herdar o patriarchado do povo hebreu. Temendo, +porêm, a vingança de Esaú, ausentou-se para a Mesopotamia, onde, depois +de servir por muitos annos a seu tio Labão, casou com as duas filhas +d'este, Lia e Rachel. + +Teve Jacob doze filhos, que são os doze patiarchas, cabeças e origens +das doze tribus do povo de Israel, nome que tambem teve o mesmo Jacob. +Esses patriarchas foram:--o 1.º, Ruben; o 2.º, Simeão; o 3.º, Levi +(cujos descendentes foram destinados ao sacerdocio e a serem ministros +do templo de Deus); o 4.º, Judá; o 5.º, Dan; o 6.º, Nephtali; o 7.º Gad; +o 8.º, Azer; o 9.º, Isachar; o 10.º, Zabulon; o 11.º José; o 12.º, +Benjamin. + +Os mais velhos de entre elles começaram a ter inveja a José, por verem +que era o mais estimado de Jacob, e porfim intentaram matál-o, +lançando-o n'uma cisterna; mas, mudando de resolução, venderam-n'o como +escravo a uns madianitas, que o levaram para o Egypto, onde foi comprado +por Putiphar, creado de Pharaó, rei d'aquella nação. Serviu José a +Putiphar com tanta fidelidade, que não se prestou a um crime para que o +provocava a esposa do mesmo Putiphar. Esta, para d'elle se vingar, +accusou-o aleivosamente de falso crime e por esse motivo foi elle +mettido n'um carcere. Alli Deus revelou-lhe a significação mysteriosa de +uns sonhos que haviam tido dois dos seus companheiros de captiveiro. Um +d'estes, como Pharaó tivesse um sonho em que viu septe vaccas magras e +septe espigas delgadas, que devoravam septe vaccas gordas e septe +espigas fartas, indicou-o ao rei, como capaz de lhe interpretar o sonho. +José explicou com effeito ao rei o sentido d'aquella visão. +Surprehendido e maravilhado Pharaó com a sabedoria d'elle, elegeu-o para +seu ministro, e deu-lhe grandes honras e distinções. José casou com a +filha de um sacerdote de Heliopolis, da qual lhe nasceram seus dois +filhos Manassés e Ephraim. Como ministro, e gozando toda a confiança do +rei, organizou a arrecadação dos cereaes, de modo que, quando chegaram +os septe annos de fome, symbolizados nas septe vaccas magras e nas septe +espigas delgadas do sonho, o Egypto estava provido contra a escassez e +ainda poude efficazmente soccorrer as povoações proximas, nas quaes se +não tinham adoptado eguaes providencias. + +A escassez de alimentos, que tambem se sentiu em Chanaan, terra onde com +sua familia habitava Jacob, obrigou este a mandar ao Egypto seus filhos, +a comprar trigo. Soube da chegada d'elles José e, sem se lhes revelar +como seu irmão, obrigou-os a declarar quem eram e a deixarem em poder +d'elle, em refem, a Simeão, emquanto iam a Chanaan a buscar-lhe +Benjamin, o irmão mais novo. + +Obrigados a voltarem ao Egypto, por causa da fome que continuava, +conseguiram que Jacob, apesar da sua repugnancia, deixasse ir +Benjamin; e então José, dando-se a conhecer aos irmãos, entre lagrimas +de alegria, mandou-lhes que voltassem a Chanaan, a buscar Jacob e toda a +familia. Assim aconteceu, indo toda a familia de Jacob estabelecer-se no +Egypto. Alli viveu ainda Jacob 17 annos, vindo a finar-se na edade de +147, depois de abençoar seus filhos, com bençãos mysteriosas e +propheticas, vaticinando que na descendencia de seu filho Judá estaria o +imperio e o governo do povo, até vir ao mundo o Messias, que havia de +remir o peccado de Adão. Fallecido Jacob, ficaram residindo no Egypto +seus filhos, nas terras que, em attenção a José, lhes havia dado o +Pharaó, e nas quaes tiveram numerosa descendencia. + +Permaneceram os Israelitas ou Hebreus no Egypto por espaço de 217 annos. +No decurso d'estes, os Egypcios, desconfiando d'elles, opprimiam-n'os +cruelmente, obrigando-os a trabalhos duros, e o rei mandava matar-lhes +todos os filhos recem-nascidos do sexo masculino, os quaes eram lançados +ao Nilo. Nascendo Moysés, filho de Amrão e de Jocabed, esta conseguiu +occultál-o por espaço de tres mezes; mas, não o podendo conservar +escondido por mais tempo, lançou-o áquelle rio, dentro de um cesto. +Estando a filha do rei a banhar-se no rio, viu a creança, salvou-a e +deu-lhe o nome de Moysés, que quer dizer: «salvo das aguas». Depois +levou-o para a côrte, onde foi creado e passou a mocidade. + +Deus, condoido de quanto os Hebreus soffriam entre os Egypcios, resolveu +livrál-os da oppressão, fazendo-os sahir do Egypto, por meio de +assombrosos milagres. Foram esses prodigios obrados por intermedio de +Moysés e de seu irmão Arão, apparecendo primeiro Deus a Moysés no monte +Horeb, e mandando-lhe que fosse á presença de Pharaó, a pedir-lhe que +deixasse sahir do Egypto o povo de Israel. O rei, bem longe de acceder +ao pedido, antes redobrou a perseguição. + +Então começaram os milagres. Indo Moysés e Arão á presença de Pharaó, +para lhe mostrarem como era vontade de Deus o que lhe pediam, lançou +Arão na terra uma vara que levava na mão, e a vara logo se converteu em +serpente. Quiseram os magos imitar a transformação, convertendo tambem +outras varas em serpentes; mas a serpente em que se tornára a vara de +Arão devorou todas as outras. Continuou, apezar de tudo, a obstinação de +Pharaó; e Deus, para mais claro aviso e para castigo, mandou ao Egypto +as dez pragas, que assolaram todo o paiz. + +Essas pragas foram as seguintes: a primeira consistiu em se converter em +sangue a agua dos rios e das fontes do Egypto, morrendo todos os +peixes; a segunda, n'uma innumeravel multidão de rans que intravam por +todas as casas; a terceira, n'uma quantidade enormissima de mosquitos e +de outros insectos, que tornavam a vida insupportavel; a quarta, n'uma +abundancia de moscas, que perseguiam atrozmente homens e animaes; a +quinta foi uma peste que matou um numero enorme de pessoas e fez tambem +grande devastação nos animaes; a sexta foi uma epidemia de chagas +hediondas e repugnantes, que appareciam nos corpos dos Egypcios e dos +animaes; a septima, uma grande chuva de pedra, acompanhada de terrivel +trovoada, ficando destruidas por ellas as arvores, plantações, +sementeiras e pastos; a oitava foi o apparecimento de uma nuvem de +gafanhotos, que tambem produziram incalculavel estrago nos campos; a +nona manifestou-se por umas trevas muito espessas, que por tres dias +escureceram o Egypto, excepto a terra de Gessen (logar em que habitavam +os Hebreus, aos quaes não chegou nenhuma das pragas); a decima consistiu +na morte de todos os primogenitos egypcios, desde o filho de Pharaó até +ao do escravo mais humilde, e tambem na de todos os primogenitos dos +animaes. + +Movido finalmente Pharaó pela decima praga, consentiu que os Hebreus +sahissem do Egypto. Na noite do dia 14 do mez de Nisan, que corresponde +ao de março, sahiram, pois, os descendentes de Jacob da terra dos +Pharaós, em tão grande numero, que só homens armados e capazes de +pelejar eram mais de 600:000. Guiava-os um anjo por meio de uma columna, +que de dia era formada como que de uma nuvem, e de noite era de fogo. +Esta columna precedia os Hebreus e indicava-lhes o caminho atravez do +deserto. Caminhavam por este, quando Pharaó, de novo indurecido, se +arrependeu da concessão que fizera, mandou armar todos os seus carros +bellicos e sahiu com um numeroso exercito, a perseguir e captivar outra +vez o povo de Israel, que ia já perto do Mar Vermelho. Vendo-se de novo +perseguidos pelos Egypcios, os Israelitas começaram a murmurar contra +Moysés, por havel-os mettido n'aquelle perigo; mas este exhortou-os a +que tivessem Esperança em Deus e, extendendo uma vara, que levava na +mão, sobre o Mar Vermelho, as aguas dividiram-se para um e outro lado, +deixando no meio um caminho enxuto, pelo qual passaram a salvo os +Israelitas. Chegando os Egypcios e vendo as aguas divididas, intraram no +mesmo caminho para os perseguirem; mas, estando já todos n'elle, Moysés +levantou outra vez a vara sobre o mar e as aguas voltaram á sua posição +natural, ficando submerso todo o exercito de Pharaó. + +Em memoria da sahida do Egypto, mandou Deus aos Hebreus que celebrassem +perpetuamente a Paschoa, matando todos os annos e comendo com certas +ceremonias um cordeiro. + +Passado o Mar Vermelho, fôram elles caminhando por diversos logares até +ao deserto,--onde começou o Milagre do maná. Era este um manjar +delicioso que cahiu do céu durante quarenta annos, emquanto os +Israelitas peregrinaram no deserto até intrarem na terra da promissão. +Com elle se alimentavam, colhendo cada um diariamente uma certa medida, +por fórma que, se queria guardar alguma porção para o dia seguinte, logo +o manjar se corrompia. A peregrinação pelo deserto durou tanto tempo, +porque assim o determinou Deus, em castigo das murmurações e falta de fé +dos Israelitas á sahida do Egypto, fazendo-os retrogradar para o +deserto, quando estavam já perto da terra da promissão. + +Appareceu Deus a Moysés sobre o monte Sinai, e entre raios lhe deu as +taboas da lei, em que estavam escriptos os dez preceitos do decalogo, e +dictou-lhe as outras leis e ceremonias que queria que fossem usadas pelo +seu povo. Emquanto Moysés estava sobre o Sinai--que foi por quarenta +dias e quarenta noites--pediram os Israelitas a Arão que lhes fizesse um +deus que adorassem e que os governasse. Annuiu elle ao pedido e fabricou +um bezerro de oiro, que puzeram n'um altar e adoraram, e ao qual +offereceram sacrificios. Quando Moysés desceu do monte e teve noticia +d'este acto de idolatria, depois de orar ao Senhor--em desaggravo de tão +grande peccado,--em signal de indignação, quebrou as taboas da lei, +mandou aos levitas que matassem os Israelitas que incontrassem no +caminho, calcou aos pés e reduziu a pó o bezerro de oiro, e supplicou a +Deus que perdoasse ao seu povo, o que elle fez a final. + +Perdoado o peccado do povo, mandou Deus a Moysés que voltasse ao cume do +Sinai, com duas taboas de pedra, nas quaes foram de novo gravados os dez +preceitos. Mandou depois se construisse um templo cuja guarda e governo +foram confiados a Arão, irmão de Moysés, sendo os mais descendentes de +Levi feitos ministros do mesmo templo, com o nome de levitas. Este +templo, que era portatil, e se chamava tambem _tabernaculo_, acompanhava +o exercito e era dividido em duas partes: na interior, que se chamava +_sancta sanctorum_, estava a arca do testamento, e só intrava o summo +sacerdote; na exterior havia um altar, em que se queimavam essencias e +um candelabro com septe lumes. + +Passados quarenta annos de peregrinação estavam os Israelitas na +terra da promissão, a cuja vista havia morrido Moysés, na edade de 120 +annos e depois de ter abençoado o povo. + +A terra da promissão era uma provincia da Asia, chamada hoje Palestina +ou Terra Santa, que comprehendia varios reinos pequenos, conhecidos pela +denominação de _reinos dos Cananeus_. Morto Moysés, ficou com o governo +do povo Josué filho de Num, ao qual o Senhor appareceu dizendo-lhe que +metesse os Hebreus na posse da terra da promissão, dividindo as terras +pellas differentes tribus e familias. Josué teve que combater e vencer +varios povos e reis, e que conquistar varias cidades da Palestina. +Dividida esta pelos povos de Israel, obrigaram-se estes a dar a decima +parte dos fructos da terra aos levitas. + +Morrendo Josué na edade de 110 annos, seguiu-se-lhe o governo dos +juizes, dos quaes os mais celebres foram Debora, Gedeão, Jephte e +Sansão. D'este ultimo contam os livros santos que, sendo ainda muito +moço e sahindo-lhe ao incontro um leão, o despedaçou logo; depois matou +de uma vez trinta Philisteus; e de outra, depois de haver quebrado umas +cordas muito fortes com que o tinham amarrado, matou mil Philisteus com +a queixada de um jumento. N'outra occasião, incerrado pelos Philisteus +na cidade de Gaza, sahindo de noite, arrancou as portas da cidade e +levou-as a um alto monte. Depois d'aquellas façanhas e de outras, +deixou-se inlear no amor de Dalila, á qual declarou que a verdadeira +causa da sua força consistia em ser dedicado a Deus e em não lhe terem +jámais cortado os cabellos; Dalila, senhora de tal segredo, fez com que +Sansão adormecesse nos seus braços e, vindo os Philisteus, cortaram +áquelle os cabellos, pelo que perdeu a força e foi aprizionado. + +Os Philisteus, vencido assim Sansão, tiraram-lhe os olhos e trataram-n'o +indignamente até que, passado algum tempo, tendo-lhe novamente crescido +os cabellos, recuperou a força; e, sendo então levado pelos Philisteus +ao templo de seu falso deus Dagão, para zombarem d'elle, abraçou Sansão +duas columnas do mesmo templo e moveu-as com tal impeto, que o edificio +abateu, morrendo esmagados quantos n'elle estavam, incluido o proprio +Sansão. + +O ultimo juiz que governou o povo hebreu foi o propheta Samuel, durante +o governo do qual os Israelitas pediram a Deus que lhes désse um rei, o +que Deus concedeu, mandando a Samuel que ungisse a Saul, como rei, e +esse foi o primeiro dos reis de Israel. A principio regeu Saul, conforme +ás leis e ao temor de Deus, mas depois faltou a uma e outra coisa, +pelo que mandou o Senhor a Samuel que ungisse como rei a David, mancebo +muito valoroso, da tribu de Judá, e que havia morto o gigante Golias, +que desafiava o exercito de Israel. Saul, sabendo da eleição de David, +perseguiu-o e não quiz depor o poder; mas afinal, vencido na guerra +contra os Philisteus, suicidou-se. Introu então David na posse pacifica +do governo, comquanto tivesse que sustentar guerras contra os +Philisteus, os Ammonitas, os Syrios, os Idumeus e os habitantes de +Damasco, vencendo a todos estes inimigos. Preparou os materiaes +necessarios para edificar um magnifico templo, que não chegou a +construir por Deus lh'o haver prohibido; trasladou a arca do testamento +para o seu palacio de Jerusalem, fez rigorosa penitencia por graves +peccados que tinha commetido; compoz muitos psalmos em louvor de Deus; e +practicou muitos outros actos de soberano justo e sabio. + +A David succedeu no reinado seu filho Salomão, que foi muito sabio e +sagaz, e cujo governo foi assignalado por grandes riquezas e +prosperidades. Durante todo o tempo que governou, conservou em paz o +reino de Israel; foi temido e respeitado pelos principes vizinhos, +muitos dos quaes eram seus tributarios; as suas frotas levavam-lhe +grande quantidade de oiro e de materias preciosas; floresceu o commercio +em todo o paiz; e a sabedoria do rei era admirada nos reinos estranhos. +Empregou Salomão grandes riquezas em edificar um templo grandioso, para +a adoração de Deus, onde havia preciosissimos vasos e um grande numero +de ministros do Senhor. Esse templo excedeu tudo quanto se pode imaginar +de magnificente. Edificou tambem um sumptuoso palacio, para sua morada. + +Antes de ter revelado a sua sabedoria em muitos livros que escreveu, +mostrou-a tambem na sabia sentença que pronunciou, conhecida pelo nome +de «juizo de Salomão». Teve ella a seguinte origem. Duas mulheres viviam +juntas e tinham cada uma seu filho. Aconteceu morrer uma das creanças, e +cada uma das mães dizia ser seu o que ficára vivo. Foram ambas ter com +Salomão, para que decidisse a contenda. Decidiu o rei que se cortasse ao +meio o menino disputado e que se désse metade d'elle a cada contendora. +Uma das mães acceitou a sentença; mas a outra clamou que antes se désse +o menino inteiro e vivo á sua rival. Assim concluiu Salomão que a +verdadeira mãe era aquella que não consentia na morte da creança. Mandou +por isso que esta lhe fôsse intregue. + +Por espaço de muitos annos observou Salomão a lei de Deus, governando o +seu povo com grande sabedoria e justiça; mas nos ultimos annos da vida +prevaricou, edificando templos aos falsos deuses, adorados por +mulheres estrangeiras que tomou contra os preceitos de Deus. Não se sabe +com certeza se chegou a arrepender-se d'este peccado, de que foi +reprehendido pelo Senhor; mas julga-se que se arrependeu, compondo então +o livro sagrado chamado _Ecclesiastes_, que figura no Novo Testamento e +em que mostrou a vaidade das grandezas humanas. + +A Salomão succedeu Roboão, seu filho, principe imprudente e tyrannico, +que, pedindo-lhe o povo que o alliviasse dos tributos, respondeu que não +só o não faria, antes os havia de augmentar e tratar os Israelitas como +escravos. Vendo e ouvindo isto, dez tribus rebellaram-se contra Roboão, +acclamando por seu rei a Jeroboão, homem sedicioso e impio; e só as +tribus de Judá e de Benjamin ficaram na obediencia de Roboão, que se viu +obrigado a fugir precipitadamente para Jerusalem. + +Dividiu-se assim o reino em dois: a parte que permaneceu sujeita a +Roboão chamou-se Reino de Judá, ou Judéa; a outra, que seguiu a +Jeroboão, denominou-se Reino de Israel. + +Jeroboão esqueceu a lei de Deus, mandou fabricar bezerros de oiro, que +fez adorar como divindades, sendo assim causa da maior parte dos +Israelitas cahirem em idolatria. Na mesma impiedade viveram os seus +successores, os 21 reis que governaram Israel por espaço de 254 annos, +findos os quaes foi o reino destruido pelos Assyrios e seu rei +Salmanazar, que tomou Samaria e levou captivas as dez tribus de Israel. + +No reino de Judá continuou-se a adorar o verdadeiro Deus, ainda que +Roboão e muitos dos seus successores por varias vezes permittiram a +idolatria; por isso foi o reino castigado pelo Senhor, que o intregou +aos seus inimigos. O reino de Judá durou por 468 annos, contados do +principio do reinado de David. Os peccados dos Judeus foram causa de +Deus os intregar aos Chaldeus que, governados por seu rei Nabucodonosor, +tomaram a cidade de Jerusalem, queimaram o templo do Senhor, e levaram +os Judeus para o seu paiz. Este captiveiro chamou-se o «captiveiro de +Babylonia» que durou por mais de 70 annos. + +Foi dada a liberdade aos Judeus por Cyro, rei dos Médos, Persas e +Chaldeus, o qual subjugou estes dois ultimos povos, ganhou varias +batalhas e tomou Babylonia. Tomada esta cidade permittiu Cyro aos Judeus +que regressassem á sua patria, o que se effectuou sob o mando do summo +pontifice Josué e de Zobadel. Mal chegaram a Jerusalem, o seu primeiro +cuidado foi a re-edificação do templo, a qual não poderam logo levar +a effeito por lh'o impedirem os Samaritanos, conseguindo por fim +concluil-a Zorobabel, mediante o auxilio de Dario I. por pouco durou a +independencia dos Hebreus. As reformas de Esdras, nas quaes se +comprehendia a prohibição de casamentos com mulheres de outras nações, e +a dissolução das familias até então constituidas contra esse preceito, +originaram um scisma, em que parte do povo se reuniu aos Samaritanos, +ficando a nação muitissimo infraquecida. Aproveitando este estado, +subjugaram os Persas a Judéa, cuja historia desde então até á conquista +de Alexandre se confunde com a das outras provincias humildes, sujeitas +ao dominio d'aquelle imperador. Continuou a rivalidade entre os Judeus e +os Samaritanos, aos quaes os primeiros não permittiam a intrada no +templo de Jerusalem. Os Judeus não constituiam assim já um povo, mas uma +simples communidade religiosa ou uma casta sacerdotal, isolada no meio +das outras populações do grande imperio persa. + +Realizada a conquista d'este imperio em tempo de Dario Codomanno, +submetteu-se a Judéa ao conquistador, sem resistencia; por morte de +Alexandre foi governada successivamente por Laomedonte e pelos reis do +Egypto e da Syria. Com os Machabeus chegou a recobrar a sua +independencia, sendo Aristobulo proclamado rei; mas repetidas guerras +civis deram logar á intervenção dos Romanos na Palestina, chegando +Pompeu a intrar em Jerusalem, que ficou desde essa epocha em estado de +incompleta servidão. + +Por fim realizou-se a annexação da Judéa aos dominios de Roma, sendo +Herodes incarregado do governo d'ella pelo imperador Augusto; mais tarde +augmentaram as dissensões e rixas, que desde o principio houvera entre +Judeus e Romanos, o que levou Nero a mandar Vespasiano, seu general, +para reduzir completamente á obediencia a Judéa. A conquista d'esta foi +interrompida pelo regresso de Vespasiano a Roma, para assumir o governo +imperial, e só veio a ser ultimada pelo imperador Tito, que foi em +pessoa á Palestina com um exercito de 60:000 homens. Á vista do exercito +romano, applacaram-se as contendas civis que havia em Jerusalem, e esta +cidade defendeu-se durante muito tempo, com um denodo verdadeiramente +heroico, contra o inimigo que a cercava. Por fim cahiu a ultima obra de +defesa, a cidade foi invadida, e o templo incendiado. Os Judeus, perdida +toda a esperança, mataram suas mulheres e filhas e suicidaram-se em +seguida, preferindo isso a intregarem-se com vida aos Romanos. A tomada +de Jerusalem deu-se no anno 70 da era christan. O povo Hebreu +perdeu, desde então e para sempre, a sua unidade politica, apezar de +continuar até hoje a existir disperso pelo mundo, com os caracteres +particulares da sua raça e da sua religião. + +Já depois de submettida a Judéa aos Romanos, mas antes da tomada de +Jerusalem, nasceu perto d'esta cidade, em Bethlem, Jesus Christo, quatro +annos antes da era actual (ou era christan). + + + + +CAPITULO II + +OS EGYPCIOS + + +As populações que primitivamente habitaram o valle do Nilo foram +subjugadas, ou compellidas para o sul, por um povo vindo da Asia pelo +isthmo de Suez. Passou-se isto em tempo anterior aos mais antigos +monumentos historicos. Aquelle povo conquistador, que alli se +estabeleceu, veio a constituir o que na Historia Antiga é conhecido pela +denominação de _povo egypcio_. + +Nada ao certo é conhecido quanto ao governo primitivo dos Egypcios, que +se presume ter sido nos primordios _theocratico_ ou _sacerdotal_. Parece +provavel que aquelle paiz tinha chegado já a um certo estado de +civilização e estava bastante povoado pela epocha de 2000 annos antes da +era de Christo. Segundo Herodoto, foi Menés o fundador da monarchia +egypcia, a qual durou 1663 annos, desde a sua origem até á conquista do +Egypto por Cambyses. O dominio d'aquella monarchia limitou-se primeiro a +Thebas, cidade fundada pelo mesmo Menés, e aos seus arredores; mas este +monarcha accrescentou consideravelmente o seu territorio, construindo +diques para impedir que o Nilo continuasse a alagar os seus campos +marginaes. Nos terrenos assim conquistados ao rio, e na extremidade do +_delta_ d'este, edificou uma cidade grande e importante, que teve o nome +de Memphis. + +Dos seculos que se seguiram ao reinado de Menés apenas ha vestigios +muito obscuros na Historia. Reinaram durante elles differentes +dynastias, a mais notavel das quaes foi a quarta, de que foi fundador +Snervu, e que se denominou «a dynastia dos Pharaós». Os tres Pharaós +immediatos successores de Snervu foram Cheops, Khavrá e Mycerino, que se +tornaram celebres por haverem mandado construir as tres grandes +pyramides, que foram destinadas a servir-lhes de tumulos. Situadas na +planicie de Gyzeh, na margem esquerda do Nilo, a breve distancia de +Memphis, são aquellas pyramides os mais notaveis monumentos da +civilização egypcia. A de Cheops tem 147 metros de altura, a de Khavrá +138, e a de Mycerino 66. A mais alta foi construida em 30 annos, por +100:000 homens, que eram substituidos de seis em seis mezes. + +Os reis de outra dynastia, a duodecima, tornaram-se notaveis pelas +grandes obras hydraulicas que imprehenderam no Nilo, construindo um +grande numero de canaes, para distribuirem as aguas pelas differentes +regiões do sólo, afim de lhes augmentar a fertilidade e de prevenir as +inundações. + +Mais tarde, reinando Timaos, um povo originario da Asia (os Hyksos ou +_Pastores_) invadiu o Egypto, cuja antiga civilização destruiu. A +invasão, comtudo, não se extendeu além do _delta_ do Nilo e do baixo +Egypto. A parte, de que Thebas era capital, escapou á dominação dos +Hyksos que porfim foram expulsos do paiz por Amenophis Thetmosis, +descendente dos antigos reis do Egypto. + +Entre os reis que succederam a este, houve notavel (alêm de outros) +Moeris que executou differentes obras muito importantes, no numero das +quaes figura o famoso lago que tomou o nome d'elle, e que foi destinado +a receber as aguas do Nilo, quando a sua grande abundancia ameaçasse o +Egypto de ser totalmente inundado. Este lago fornecia agua, por um +grande numero de canaes, a differentes zonas que fertilizava. + +Tornou-se tambem muito notavel o rei Sesostris (Ramsés-Meiamun), que foi +o primeiro que armou uma esquadrilha; bateu-se com os Arabes, que +subjugou, e outrotanto fez aos Lydios e Ethiopicos. Imprehendeu a +conquista da Asia; e, tendo deixado seu irmão Danao no governo do reino, +bateu e derrotou os Assyrios, os Medos, os Scythas e os Phenicios; +submetteu a Thracia, a Colchida, e chegou até ás margens do Ganges. +Deixou por toda a parte inscripções, commemorando as suas victorias. +Regressando aos seus estados, dedicou-se a promover o progresso das +artes, felicitou o povo com uma paz duradoura, e accrescentou ás suas +glorias militares a de ter fundado instituições politicas e promulgado +leis de geral utilidade. Tendo cegado na velhice, não poude resistir a +essa infelicidade e suicidou-se. Os Egypcios, gratos á sua memoria, +ergueram-lhe templos, nos quaes lhe prestavam as mesmas honras que aos +seus deuses. Por esse tempo tinha chegado o Egypto á phase do seu +maior esplendor. Tempos depois começou a pronunciar-se a sua decadencia, +que as perturbações intestinas contribuiram bastante para precipitar. A +Ethiopia proclamou a sua independencia; e os povos da Syria, sempre +insubordinados e irrequietos, negaram-se a pagar os tributos. A unidade +nacional veio a quebrar-se, e o paiz dividiu-se em vinte pequenos +estados independentes. As rivalidades entre estes differentes estados +levou-os a admittirem no seu seio os estrangeiros, cuja intrada até alli +fôra sempre vedada no Egypto. Foi então que os Ethiopes e os Assyrios +disputaram o paiz e fizeram conquistas que, comquanto não fossem +duradouras, comtudo apressaram bastante a ruina da nação. Depois de +expulsos aquelles dois povos, o Egypto ficou sendo governado outra vez +por principes independentes. No delta do Nilo havia doze d'estes +principes, os quaes constituiram uma confederação, formada dos seus +estados, a que se chamou _dodecarchia_. Um d'aquelles principes, porêm, +chamado Psammeticho I, derrubou á mão armada os outros principes e +restabeleceu a unidade nacional. Durante o reinado d'este monarcha, +ainda o Egypto se ergueu um pouco da sua decadencia e pareceu querer +voltar ao seu antigo esplendor e grandeza; floresceram de novo as +lettras, as bellas-artes e a industria; e continuaram outra vez um pouco +as grandes obras de irrigação que estavam--havia muito--suspensas. +Sustentou-se no throno durante 47 annos a dynastia de Psammeticho; no +reinado de um dos seus descendentes, Amasis, teve o Egypto uns annos de +certa prosperidade, a que logo poz termo a conquista persa, realizada +por Cambyses. Desde esta até á conquista por Alexandre Magno medeiam +dois seculos, durante os quaes os Egypcios tiveram politicamente uma +existencia miseravel. Com a conquista pelos Romanos, depois da morte de +Cleopatra, incerra-se a Historia Antiga do Egypto, que durou uns +cincoenta seculos, e na qual se contam 34 dynastias. + +Gosou sempre de grande fama a civilização dos Egypcios durante o periodo +da Historia Antiga. Os proprios Gregos chegaram a gabar-se de que muitos +dos seus philosophos e legisladores tinham ido á terra do Nilo +instruir-se nas sciencias ou na arte de governar. Comtudo, fez-se em +tempo uma idéa muito exaggerada do estado a que a sciencia havia chegado +no Egypto. Attribuem-se a este povo conhecimentos mathematicos, e +especialmente astronomicos, muito adeantados; mas não é averiguado que +os possuisse em tal desinvolmento,--e bem poucos vestigios existiam +d'elles, quando alli foram da Grecia, Eudoxio e Platão. A religião, +as artes e a philosophia, é que floresceram muito notavelmente n'aquelle +paiz. As ruinas innumeraveis de que todo o seu sólo está coberto, +bastariam para attestar o grande estado de esplendor a que elle chegou. +A historia das artes apresenta alli muito mais caracteres de certeza do +que a das sciencias. Os monumentos, as ruinas, os templos, os palacios, +os colossos, que nem a acção do tempo nem a do homem puderam ainda +destruir, dão conhecimento do elevado grau de perfeição até onde os +Egypcios levaram a cultura das artes; mas, de todos os monumentos do +Egypto, os mais assombrosos são sem duvida as pyramides (construcções +colossaes que se vêem ainda em differentes pontos, e das quaes as tres +mais notaveis são as de que atraz falámos). + +O antigo governo do Egypto era theocratico; reinavam alli os sacerdotes +em nome dos deuses. Os proprios reis estiveram quasi sempre sujeitos ao +poder sacerdotal, que se mantinha principalmente por effeito da severa +distincção das castas. Os sacerdotes constituiam a primeira d'estas, á +qual se seguia a dos guerreiros, depois a dos interpretes, e a dos +trabalhadores (divididos ainda estes em diversas classes, que nunca se +confundiam). A todo o egypcio era prohibido sahir da condição em que +nascêra e abraçar profissão que não fosse a de seu pae. + + + + +CAPITULO III + +OS ASSYRIOS E BABYLONIOS + + +O imperio assyrio no principio apenas comprehendeu o territorio situado +a leste do rio Tigre; mais tarde veio a ser formado por todo o +territorio que ficava entre aquelle e o Euphrates, e comprehendeu, +juntamente com a Assyria propriamente dita, a Chaldéa, a Mesopotamia, a +Babylonia e differentes paizes tributarios. A Chaldéa foi, como o +Egypto, um dos primeiros paizes em que começou a desinvolver-se com +certo grau a civilização; os Chaldeus e os Babylonios passam por ser os +primeiros povos que fizeram descobrimentos astronomicos; deve-se-lhes a +divisão do anno em 365 dias, 6 horas e alguns minutos. É muito incerta a +chronologia da historia dos Assyrios: segundo os livros santos, a +fundação de Babylonia e de Ninive realisou-se pelo seculo XXII antes +de Jesus Christo, Nemrod foi fundador da primeira e Assur da segunda. +Nada certo se sabe sobre a historia dos povos que habitaram aquellas +cidades e ainda outras, anteriormente ao tempo de Belo que, por 1780 +antes de Jesus Christo, creou o imperio da Assyria, reunindo o reino de +Babylonia com o de Ninive. + +Nino, successor de Belo, alliou-se com os Arabes, derrotou os Armenios e +os Medos, estendeu o seu dominio por grande parte da Asia, e levou as +suas conquistas desde o Egypto até ás Indias. Augmentou +consideravelmente a cidade de Ninive, que dotou com palacios e outros +edificios sumptuosos. Depois de tomar a cidade de Bactres (capital da +Bactriana), casou com Semiramis, viuva do governador da mesma cidade e +uma das mulheres mais bellas d'aquelle tempo, da qual teve um filho +chamado Ninias. Pela morte de Nino, ficou Semiramis herdeira do imperio, +que augmentou com conquistas novas; subjugou a Arabia, o Egypto e a +Lybia; illustrou o seu reinado não sómente por grandes acções militares, +mas tambem pela administração do paiz e pelas assombrosas construcções, +das quaes ainda hoje existem ruinas muito notaveis. Tornou Babylonia uma +cidade magnifica e grandiosa, cingiu-a com uma muralha de 15 leguas de +circumferencia, de altura consideravel, e com cem portas de bronze em +toda a sua extensão. Era tão larga essa muralha que sobre ella podiam +passar quatro carroças a par. Construiu tambem Semiramis uma ponte +magnifica sobre o Euphrates (rio que atravessava a cidade) e em cada uma +das extremidades d'ella dois palacios. Um d'estes era a habitação +ordinaria da rainha e deposito das consideraveis riquezas que esta +recebia de todas as provincias do imperio; o outro, incimado por oito +torres de consideravel altura, era um templo consagrado a Belo, e em +cujo interior Semiramis tinha mandado collocar estatuas de oiro, de +quarenta pés de altura, representando varias divindades. Todo o interior +do templo era cheio de baixos-relevos com grande valor artistico, de +magnificas estatuas e de vasos de oiro e de prata primorosamente +trabalhados. A cidade era muito bella e cortada de lindas ruas e praças, +ornadas de opulentos palacios; mas o que sobretudo maravilhava eram os +jardins estabelecidos em terraços elevados sobre o Euphrates e +sustentados por abobadas de altura prodigiosa. Ornados das mais bellas +arvores, inriquecidos com abundancia das mais vistosas flores, eram +cortados de limpidos arroios, alimentados por agua levada áquella altura +por meio de aqueductos e de apparelhos ingenhosissimos. Davam ingresso +no jardim suberbas escadarias, ornadas de estatuas e de vasos +preciosos, em que vegetavam as mais raras flores e arbustos de todos os +paizes então conhecidos. + +Na construcção d'aquellas muralhas e de outras com que opulentou +Babylonia, empregou Semiramis 2.000:000 homens durante muitos annos. +Immortalizou-se aquella rainha, não só n'isso, mas tambem na sabia +administração que exerceu nos seus estados e na organização dos seus +exercitos, em que reinou sempre a disciplina mais rigorosa e mais severa +e que ella em pessoa commandou muitas vezes. + +Tendo-se ausentado no commando de uma expedição destinada a alargar os +limites dos seus estados, soube que na capital se estava urdindo uma +conspiração para a depôr e substituil-a no governo por seu filho Ninias. +Não quiz ella conservar pela força o throno, que ninguem lhe poderia +disputar; e, intregando voluntariamente o governo ao filho, absteve-se +de punir os conspiradores, e retirou-se do mundo. A população +surprehendida e maravilhada pelo seu subito desapparecimento--que +considerou sobrenatural--erigiu-lhe templos e prestou-lhe honras divinas. + +Ninias foi apenas um simulacro de rei. Passou a vida na ociosidade e na +indolencia, e foi o primeiro que estabeleceu o governo do serralho. +Seguiram-se-lhe trinta e tres reis que nada fizeram pelo bem do paiz e +de que a Historia apenas faz menção. O ultimo foi Sardanapalo, cujo nome +ficou lendario e serve para caracterizar os soberanos que põem de lado +os cuidados da governação, para se darem tão sómente á ociosidade e aos +prazeres physicos. Sardanapalo, indolente e crapuloso, estabeleceu a sua +residencia em Ninive, onde passava a vida mettido n'um palacio, cercado +de mulheres, cujos habitos e adornos imitava, deixando em Babylonia o +governo intregue a valídos que de tudo dispunham. Nunca visto de seus +subditos, sempre incerrado no palacio, onde passava as noites em +libações e folgares, não lhe importavam nada os negocios publicos, e só +tratava de esconder aos olhos dos subditos os seus ignominiosos habitos. +Um dia Arbaces, governador da Média, surprehendeu-o no meio de um grupo +de mulheres impudicas, trajando como ellas. Indignado por ver que tantos +valorosos Assyrios estavam sujeitos a um monarcha desprezivel, revelou +aos seus amigos os vergonhosos habitos de Sardanapalo, ligou-se com +Belesis (governador da Babylonia), e ambos foram pôr cerco ao rei no +proprio palacio em que habitava. Depois de tenue resistencia, +Sardanapalo reduzido a circumstancias extremas, quiz apagar com um +esforço supremo de coragem a memoria da sua vergonhosa vida. Mandou +accender n'um dos pateos interiores do palacio uma grande fogueira, na +qual se queimou com suas mulheres, seus escravos e seus thesouros. + +Dos restos do imperio assyrio assim desfeito, formaram-se tres grandes +reinos: o de Babylonia, o da Média, e o de Ninive ou da Assyria +propriamente dita. De Babylonia tornou-se rei Belesis, que transmitiu o +poder á sua dynastia, na qual só houve notavel o rei Nabonassar, que deu +o seu nome a uma era especial começada no anno 747, e sob cujo governo a +astronomia fez grandes progressos. Mais tarde cahiu Babylonia em poder +dos reis de Ninive. + +Na quéda de Sardanapalo, o principal promotor d'ella, Arbaces, ficou +senhor do reino da Média, e tentou concentrar alli a supremacia assyria +sobre o resto da Asia. Deu certas franquias liberaes aos Medos, os quaes +por si mesmos trataram de fazer leis, dividiram-se em seis tribus, e +crearam juizes para lhes dirimirem os pleitos. Depois da morte de +Arbaces, elegeram elles para rei a Dejoces, um dos seus juizes, que +fundou a cidade de Ecbatane, onde se estabeleceu com sua familia e seu +erario, e concentrou a parte mais importante da população, constituindo +alli a capital da Média. Aquella cidade, pela sua opulencia e pelos seus +monumentos, tornou-se em breve tão celebre como Babylonia e como Ninive. + +Dejoces teve por successor a Phraorto, ao qual succedeu seu filho +Cyaxaro I, que conquistou a Persia. Desde então a historia da Média +confunde-se com a do segundo imperio assyrio. Sobre a parte do antigo +imperio assyrio, de que Ninive era capital, ficou reinando, por morte de +Sardanapalo, Nino o _Moço_. Os seus successores tentaram reunir aos seus +dominios Babylonia, o que chegaram a conseguir em tempo de Assar-Haddon. +Entre os reis de Ninive, houve notaveis: Phul; Teglath-Phalasar, que +conquistou Damasco; Salmanazar, que subjugou os Israelitas (como atraz +vimos); e o terrivel Sennacherib. Reinando Sarac, Nabopolassar +(governador da Babylonia) ligou-se com Cyaxaro I, rei dos Medos, e ambos +foram pôr cerco a Ninive. Esta cidade foi tomada depois de uma sangrenta +batalha, e completamente destruida. Assim acabou, depois de 1:800 annos +de existencia, esta celebre e opulenta cidade. Nabopolassar tomou o +titulo de rei da Babylonia, que se appropriou de toda a importancia e +vantagens que desfructava Ninive e se tornou a capital do segundo +imperio assyrio. + +Nabuchodonosor succedeu a seu pae Nabopolassar, tonando-se celebre +pela conquista do reino da Judéa e pela tomada de Jerusalem (cujos +habitantes levou captivos para Babylonia) e por se haver apoderado da +Phenicia e destruido a cidade de Tyro. Balthazar foi o ultimo rei do +segundo imperio assyrio que, subjugado por Cyro, cahiu no dominio dos +Persas. + +A civilização dos Assyrios e Babylonios foi uma das mais notaveis, não +só da Antiguidade Oriental, mas tambem de toda a Historia Antiga. Ao +passo que vão progredindo os estudos historicos e que se vão descobrindo +novos monumentos, vai-se pondo cada vez mais em relevo a influencia que +aquelles povos exerceram no Oriente e na cultura intellectual das +populações da Grecia. A civilização dos Assyrios e a dos Babylonios +apresentam-se-nos como uma só, quer isso fosse devido á commum origem +dos dois povos, quer á mutua transmissão de conhecimentos e de usos nos +tempos historicos, podendo dizer-se que havia então homogeneidade de +meio. Apenas differem em pontos, a que os differentes caracteres dos +dois povos imprimiam feições especiaes. Os Assyrios, por exemplo, eram +sobretudo guerreiros, corajosos e intrepidos, incançaveis nos exercicios +mais violentos e conquistadores insaciaveis; os Babylonios, comquanto +tambem fossem bons soldados, tinham menos tendencia para a guerra de +conquista, o que em parte dá a razão de ter sido tão pouco duradoiro o +seu dominio. Os Babylonios representaram um papel muito importante no +commercio da Asia. Na industria, elles e os Assyrios adeantaram-se +consideravelmente, chegando a notavel perfeição, sobretudo no que tocava +a tecidos preciosos, a ourivesaria, a loiça, a esmaltes, etc. De +esculptura deixaram os Assyrios obras de alto valor e merecimento +artistico, sempre admiradas e tidas como objectos de grande estimação. + + + + +CAPITULO IV + +OS PHENICIOS + + +Os Phenicios foram um dos povos mais notaveis da Antiguidade Oriental; +mas, apezar d'isso, escasseiam bastante os documentos historicos +directos da sua civilização. A Phenica comprehendia apenas uma estreita +faixa de terreno, entre as faldas do monte Libano e o mar Mediterraneo. +N'aquella apertada zona teve a sua evolução um dos movimentos +civilizadores da Antiguidade, cuja influencia se sente de modo +consideravel na Historia Antiga e chega ainda até nós, por meio do +alphabeto, pelos Phenicios inventado e propagado. + +Os Phenicios são geralmente considerados como um povo pertencente á raça +chamitica, tendo grandes affinidades com as tribus cananéas que, uns +vinte e quatro seculos antes de Christo, se estabeleceram, +disseminando-se, nos valles do Jordão e do Oronte, e nas margens do +Mediterraneo. Comtudo elles falavam uma lingua da familia dos semitas, +muito similhante á dos Hebreus,--e as suas relações com os povos +semiticos da Palestina foram sempre muito estreitas. + +Em nenhuma epocha da sua historia apparecem os Phenicios com uma unidade +nacional caracterizada, como os povos de que anteriormente tratámos. +Viveram sempre em cidades separadas, com chefes independentes, de +jurisdicção limitada a certa porção de territorio. Era o ultimo limite +da descentralização governativa. Comtudo sempre uma cidade exerceu +hegemonia entre todas as outras povoações phenicias. As duas cidades +que, como grandes centros politicos e commerciaes, exerceram +successivamente essa hegemonia foram Sidon e Tyro. D'ahi provêm a +divisão da historia da Phenicia em dois periodos: o _sidonio_ e o _tyrio_. + +No primeiro periodo, Sidon (que foi a mais antiga das cidades phenicias +de que ha memoria nos livros dos historiadores) exerceu a supremacia da +influencia sobre as demais populações, organizou grandes expedições +maritimas e teve um grande movimento de expansão colonizadora. Thutmés +I, rei do Egypto, fez acceitar pelos Phenicios a sua suzerania; mas esse +facto foi-lhes antes util do que prejudicial, porque lhes proporcionou a +faculdade de commerciarem no Egypto, passando a estabelecer feitorias +nas cidades do _delta_, e chegando até a terem uma colonia sua +estabelecida n'um bairro especial de Memphis, por elles exclusivamente +habitado. N'essa epocha navegaram por todo o oriente do Mediterraneo, e +chegaram até Chypre, sendo com o auxilio d'elles que esta ilha ficou +submettida ao dominio dos Egypcios. As suas tendencias e habitos +commerciaes levaram-n'os á ilha de Creta, á Cilicia e até ao Mar-Negro, +estabelecendo por toda a parte colonias e feitorias. No Occidente +alargaram-se pelo littoral do norte da Africa e estabeleceram colonias +nos territorios em que hoje existem as regencias de Tripoli e de Tunis. +Cruzando-se alli com a população indigena, deram origem ao povo dos +liby-phenicos, que chegaram a adquirir importancia na Antiguidade. +Pelo interior da Asia extenderam as suas relações commerciaes até ao rio +Tigre e á Arabia. + +Pelo seculo XIII antes da era christan os Phenicios de Sidon tinham +chegado ao maximo estado de adeantamento e de influencia. Foram então +victimas dos Philisteus, que se haviam estabelecido entre a Phenicia e o +Egypto. Sidon foi tomada e destruida por estes; e a hegemonia phenicia +passou depois para Tyro, começando então o segundo periodo da historia +d'este povo. + +N'esse novo periodo, Tyro, succedendo a Sidon como centro do dominio +colonial dos Phenicios, elevou-o bem depressa ao auge da prosperidade. A +direcção, porêm, que imprimiu ao movimento de expansão colonizadora teve +que ser diversa. As populações gregas tinham-se ido desinvolvendo pelas +duas margens do mar Egeu, e não só obstaram a que os Phenicios fossem +por alli estabelecendo novas colonias, mas chegaram a desalojál-os de +algumas posições adquiridas. Por isso os Tyrios tiveram que abandonar +aquelle caminho e trataram de espalhar-se para os lados do occidente do +Mediterraneo, que ainda estava desimbaraçado. Foi assim que se occuparam +em estabelecer colonias e feitorias na Sicilia, na Sardenha, na Corsega, +em Malta, nas ilhas Baleares, nas costas da Gallia, e nas da peninsula +iberica, ao mesmo tempo que na margem meridional do mesmo mar alargaram +tambem os seus dominios, fundando as cidades de Utica e de Hippona. Por +fim, transpuseram o estreito hoje chamado de Gibraltar, indo fundar +estabelecimentos pela costa occidental da Europa, onde se suppõe que +chegaram ás costas da Gran-Bretanha, e indo tambem para o sul, onde +talvez chegassem a aportar ás ilhas Canarias e ás de Cabo-Verde. + +Então o poderio phenicio chegou ao maximo esplendor e teve a sua edade +de oiro. Reinava Hirão I, que foi contemporaneo dos reinados de David e +de Salomão nos Hebreus. Com estes reis teve elle alliança e por tal modo +promoveu a grandeza phenicia, que a influencia d'esta chegou a sentir-se +consideravelmente em Jerusalem, onde Astarte (uma divindade dos +Phenicios) teve culto, sendo esse um dos actos de idolatria, com que por +vezes os Israelitas offenderam a Deus. + +Logo depois se começou, porêm, a manifestar a decadencia da Phenicia. +Duas causas poderosas concorreram para ella: as luctas civis dentro de +Tyro, com successivas revoluções, e os progressos das navegações e da +colonização dos Gregos que vieram a deslocar as dos Phenicios. N'uma +d'aquellas resoluções, que occorreu durante a menoridade do rei +Pygmalião, foi assassinado o regente do estado e teve que +expatriar-se sua viuva Elisa, que com os seus partidarios foi para a +Africa, onde fundou a cidade de Carthago. Esta Elisa é a rainha que +figura com o nome de Dido na _Eneida_ de Virgilio. + +A diminuição do dominio no exterior e a fraqueza do poder no interior, +fizeram que a Phenicia fosse successivamente invadida pelos Assyrios, +pelos Babylonios e pelos Egypcios. Do dominio d'estes tres povos passou +depois ao dos Persas, a que se submetteu voluntariamente, e porfim veio +a ser conquistada por Antigono, um dos generaes de Alexandre Magno, que +a assediou com uma numerosa frota e a venceu, passando ella ao dominio +d'aquelle imperador, que substituiu na Asia a dominação dos Persas. + + + + +CAPITULO V + +OS CARTHAGINEZES + + +Crê-se geralmente que a cidade de Carthago foi fundada, (como acima +dissémos) por Dido, pelos annos 888 antes da era christan; comtudo ha +quem affirme que ella havia sido edificada antes, pelos annos 1059, por +uma colonia phenicia de Tyro. + +Seja como fôr, o que é certo é que os Carthaginezes apparecem-nos, pelos +annos de 540 antes de Christo, constituindo já uma republica de certa +importancia. N'essa epocha alliaram-se com os Etruscos e forneceram-lhes +trinta navios para o ataque da Corsega. + +A republica de Carthago tinha um senado e duas assembléas populares, que +elegiam os magistrados incarregados da administração civil e os generaes +incumbidos do commando dos exercitos. O senado era formado por todos os +cidadãos notaveis por sua edade, nascimento, riqueza ou merito pessoal. + +Carthago, nas suas guerras, empregava unicamente soldados extrangeiros +assalariados, para não despovoar a republica que occupava apenas uma +limitada área de 75 leguas quadradas, e para que os seus cidadãos não +abandonassem o commercio, que era a fonte da riqueza e do poderio do +estado. A Numidia e a Hespanha forneciam-lhe a sua cavallaria; a +Gallia, a Liguria e a Grecia, a sua infanteria; e as ilhas Baleares, os +seus fundibularios, tão notaveis pela destreza. + +Os Carthaginezes foram senhores da Sardenha; tiveram estabelecimentos +seus na Hespanha e na costa da Sicilia. Eram habeis e ousados +navegadores,--o que, junto á vantajosa posição geographica de Carthago, +foi causa do seu ingrandecimento e riqueza. + +Durante dois seculos viveram em paz com os Romanos, com os quaes +celebraram tratados, que estabeleciam os limites reciprocos da navegação +e regulavam o commercio entre aa duas republicas. Mas a crescente +prosperidade de Carthago começou a inspirar inveja aos Romanos, e esse +sentimento mais tarde ou mais cedo devia accender a guerra entre as duas +nações. Foi o que succedeu. + +Tendo-se originado guerra na Sicilia entre os Mammertinos e Hierão (rei +de Syracusa), pediram os primeiros soccorro aos Romanos, emquanto Hierão +recorreu ao auxilio dos Carthaginezes. Tal foi a causa das guerras entre +Carthaginezes e Romanos, conhecidas pelo nome de _guerras punicas_ (do +latim _Poeeni_, que a principio queria dizer «_Phenicios_», mas que +mais tarde se ampliou em significação, comprehendendo os Carthaginezes). +Houve tres _guerras punicas_ designadas por sua ordem chronologica: +primeira, segunda e terceira. + +A primeira guerra punica durou do anno 264 a 241 antes de Christo. +N'ella os Romanos, comquanto muito menos prácticos do que os +Carthaginezes na arte de navegar, começaram por uma brilhante victoria +naval. Perto das ilhas de Lipari, batteram a frota de Carthago e +metteram-n'a a pique. A frota romana era commandada por Duilio Nepote, a +quem por isso Roma ergueu uma estatua. Cornelio Scipião, general romano, +expulsou os Carthaginezes da Corsega e da Sardenha. E Regulo, depois de +tomar Chypre, chegou triumphante deante de Carthago; mas, vencido por +sua vez por Xantippo (general lacedemonio que fôra em soccorro dos +Carthaginezes), foi aprisionado. Inviado, sob palavra, a Roma para que +negociasse a troca dos prisioneiros, Regulo aconselhou, pelo contrario, +o senado a que não intrasse em taes negociações,--pelo que, voltando a +Carthago, soffreu morte cruel. + +Metello, outro general romano, expulsou os Carthaginezes da Sicilia; +mas, emquanto isto se passava, a frota romana, commandada por Claudio +Pulcher, era completamente destruida junto de Lilybea. Por fim, depois +de uma grande victoria dos Romanos, commandados pelo consul Luctacio, +sobre os Carthaginezes sob o mando de Amilcar, celebrou-se a paz com +a condição dos segundos cederem aos primeiros todas as ilhas situadas +entre a Italia e a Africa e pagarem-lhes durante dez annos um tributo +annual de 2:200 talentos. + +A segunda guerra punica teve a seguinte origem. Os Carthaginezes, para +compensação das perdas soffridas em resultado da primeira guerra, +trataram de alargar os seus dominios na peninsula hispanica. Amilcar +Barcas subjugou uma grande parte d'ella e Asdrubal edificou Carthagena. +Os Romanos, que não podiam ver com bons olhos o novo ingrandecimento dos +seus rivaes, começaram a inquietar-se com aquellas conquistas e exigiram +dos Carthaginezes que firmassem tratados, pelos quaes se obrigassem a +não extender as suas conquistas alêm do Ebro e a respeitarem Sagunto, +que era alliada de Roma. Mas Annibal, filho de Amilcar, depois de se +haver apoderado de varias outras povoações, poz cêrco a Sagunto e +deatruiu-a. Isso foi motivo para a segunda guerra punica. + +Annibal, tomando a offensiva, invade a Italia e ganha differentes +victorias, chegando Roma (não obstante o talento do pro-dictador Fabio) +a estar seriamente ameaçada. Mas o senado de Carthago hesitou em mandar +a Annibal os soccorros pedidos; este teve que procurál-os na Sardenha, +na Sicilia e na Macedonia, e mandou ir da Hespanha seu irmão Asdrubal +com um novo exercito de Hespanhoes e de Gaulezes. A desorganização, a +heterogeniedade d'estes elementos, e a sua indisciplina, valeram aos +Romanos nas apertadas circumstancias a que haviam chegado. Alêm d'isso o +soccorro levado por Asdrubal não poude chegar ao seu destino, porque +aquelle general, detido no caminho por um exercito romano sob o mando +dos dois consules, teve que dar-lhe batalha em que morreu, sendo +desbaratada toda a sua gente. + +Entretanto Publio Scipião com um exercito romano passou a Africa e foi +cercar a propria cidade de Carthago. Annibal teve que deixar a Italia +para acudir em soccorro da capital da sua patria, e alli foi derrotado +nas planicies de Zama. Passou-se isto no anno 202 antes da era christan. +Esta victoria de Scipião poz termo á segunda guerra punica. + +No seu regresso a Roma, Scipião foi alvo das mais esplendidas ovações, e +deram-lhe o cognome de _Africano_. + +Depois da paz de Zama, pode dizer-se que a existencia de Carthago foi +uma lenta agonia. Massinissa, rei da Numidia, expoliou-a de muitas +povoações e de grande extensão de territorio; os Carthaginezes +appellaram para Roma, porque Massinissa era alliado dos Romanos; mas o +senado de Roma, promettendo-lhes justiça, deixou que aquelle rei +permanecesse na posse dos territorios de que se tinha apoderado. Para +apparentar uma arbitragem, inviou Catão a Carthago; mas este, vendo a +cidade rica e prospera, sentiu reviver o odio contra a rival de Roma. E +voltando, sempre terminava os seus discursos no senado pela phrase, que +ficou celebre: _delenda Carthago_ («deve ser destruida Carthago»). Tendo +os Carthaginezes repellido um novo ataque de Massinissa, Roma pretextou +que houvera violação do tratado de paz de Zama e declarou a terceira +guerra punica, que, depois de varia sorte, terminou por um cêrco a +Carthago, no qual os Carthaginezes foram reduzidos pela fome. Scipião +Emilio, o segundo _Africano_, general romano, tomou a cidade e +arrazou-a. Commissarios do senado de Roma tomaram posse do territorio +carthaginez e fizeram d'elle uma provincia romana, com o nome de +_Africa_. Foi isto no anno 146 antes de Christo. + + + + +CAPITULO VI + +OS SYRIOS + + +Nada se conhece ao certo dos tempos primitivos da historia da Syria. A +historia dos seus reis confunde-se inteiramente n'aquella epocha com a +dos monarchas assyrios. Até ao desmembramento dos estados de Alexandre, +a Syria foi successivamente invadida pelos reis de Ninive, pelos de +Babylonia, pelos Persas em tempo de Cyro, e finalmente pelo dito +Alexandre. Depois da morte d'este, Nicator Seleuco (um dos seus +generaes) começou a fundação do grande reino da Syria, appellidado +tambem «reino dos Seleucidas» do nome do seu fundador. A Nicator Seleuco +succedeu no throno Antiocho Soter, que bateu os Bithyneos, os Macedonios +e os Galates. + +O rei mais celebre da Syria foi Antiocho, cognominado o _Grande_. Depois +de ter conquistado a Judéa, a Phenicia e diversos outros paizes, +concebeu o plano de submetter ao seu dominio as cidades livres da Grecia +asiatica, Lampsaco, Smyrna e outras. Pediram estas cidades soccorro aos +Romanos, e estes inviaram embaixadores a Antiocho, convidando-o a que +deixasse aquellas cidades em paz e a que restituisse a Ptolomeu +Philadelpho o territorio que por conquista lhe tinha tirado. Antiocho +respondeu, declarando guerra aos Romanos. Seguiu-se uma lucta em que +aquelle rei foi vencido por Scipião o _Asiatico_, que só lhe +concedeu a paz depois d'elle haver dado satisfacção aos Romanos. Mais +tarde Antiocho Epiphanes usurpou a Demetrio o throno da Syria; teve +varias guerras com os extrangeiros e tomou Jerusalem. N'aquella cidade +mandou matar grande numero de habitantes, roubou os vasos sagrados do +templo; e, voltando á Syria, deixou a Judéa governada, em seu nome, por +seus generaes, que exerceram muitas perseguições contra os Judeus. +Ordenou por uma lei que todos os povos sujeitos ao seu imperio usassem +as mesmas superstições gentilicas seguidas n'este; e, depois de ter +profanado o templo de Jerusalem, mandou n'elle collocar uma estatua de +Jupiter Olympico. Por medo das perseguições, muitos Judeus abandonaram o +culto do verdadeiro Deus e lançaram-se no seio da idolatria; outros, +fieis ás suas crenças e ás suas leis, soffreram por isso tormentos +crueis. Alguns d'estes tornaram-se muito notaveis, pela sua corajosa +resistencia ás ordens do conquistador, e pelo valor com que soffreram o +martyrio. O velho Eleazar, varão de mais de 90 annos, foi apresentado em +Antiochia ao rei Antiocho, como réu de observar a lei moysayca e de não +querer sacrificar aos falsos deuses. Não sendo possivel obrigál-o a +comer das carnes prohibidas nem a fingir que o fazia, foi cruelmente +martyrizado. Septe irmãos, conhecidos pelo nome de «Irmãos Machabeus», +juntamente com sua mãe, que os exhortava á perseverança na lei e na fé, +soffreram os mais atrozes supplicios até expirarem, desprezando as +promessas e as ameaças com que o rei os queria vencer. + +Mathatias (sacerdote da tribu de Levi), sendo já de edade muito +avançada, matou a um israelita que na sua presença, obedecendo ás ordens +de um soldado de Antiocho, ia para Sacrificar aos falsos deuses, e em +seguida matou tambem o mesmo soldado. Feito isto, retirou-se com seus +cinco filhos Judas Machabeu, João, Simão, Eleazar e Jonathas; e, +juntando os Judeus que ainda seguiam o verdadeiro Deus, foi +restabelecendo por toda a parte o verdadeiro culto e derrubando os +altares e estatuas dos falsos deuses. Cahindo doente, recommendou á hora +da morte aos filhos que com as armas defendessem a patria e a religião +contra os tyrannos. Judas Machabeu tomou logo o commando das tropas; e, +com grande valor, foi lançando fóra da Judéa os Syrios. Venceu varios +generaes de Antiocho em differentes batalhas, e reparou e purificou o +templo de Jerusalem. Morreu entretanto Antiocho; e, ainda depois d'isso, +Judas Machabeu proseguiu na guerra contra os Syrios, dos quaes libertou +completamente a Judéa. + +O ultimo rei da Syria foi Antiocho II. No seu tempo, o reino da +Syria, que tinha durado por 238 annos, cahiu em poder de Roma, da qual +ficou sendo uma provincia. + + + + +CAPITULO VII + +OS PERSAS + + +É extremamente obscura e confusa a historia dos Persas anterior a Cyro, +que viveu no seculo VI antes da era christan. Está intimamente ligada á +dos Médos. + +Cyro era filho de Cambyses, rei da Persia, tributario dos Médos, de cujo +rei Cyaxaro II era sobrinho. + +Pela morte de Cambyses e Cyaxaro, Cyro succedeu-lhes nos governos e +reuniu o obscuro reino da Persia ao da Média. Sob o seu governo, foi a +Persia um grande imperio, ao qual estiveram sujeitos a Grande Asia, a +Asia Menor, a Syria e a Arabia. + +A Cyro succedeu seu filho, tambem chamado Cambyses. Sob o mando d'este +soberano ainda mais cresceu o poderio da Persia, que se accrescentou com +a conquista do Egypto. A causa da guerra entre as duas nações foi +Cambyses ter pedido a Amasis (rei do Egypto) sua filha em casamento, e +este, inganando-o, ter-lhe inviado, em vez d'ella, a filha de Apriés. +Para tirar vingança de tal affronta, Cambyses introu no Egypto, +incontrou-se perto de Pelma com o exercito egypcio, commandado por +Psammenito (filho e successor de Amasis), batteu-o e desbaratou-o. +Depois apoderou-se de Memphis e de Sais; e em seguida imprehendeu a +conquista da Ethiopia. Para isso seguiu o curso do Nilo até Thebas, e +d'alli destacou 50:000 homens do seu exercito para irem combater os +Ammonitas e queimar o templo de Jupiter; mas aquella gente, tres dias +depois da sahida de Thebas, ficou toda sepultada nas areias do deserto, +levantadas e revoltas por um tremendo furacão. Tambem Cambyses se viu +impedido de continuar a sua marcha sobre a Ethiopia, por haver perdido, +em resultado do calor e de privações de todo o genero, as tres quartas +partes do seu exercito e por ter depois soffrido uma horrivel fome, +durante a qual os soldados se devoravam uns aos outros. + +Cambyses no principio mostrára-se no Egypto com disposições para usar de +uma politica de conciliação para com os vencidos, chegando a adoptar +os titulos e os trajos dos antigos Pharaós, e fazendo-se iniciar nos +mysterios de Osiris. Porém, depois do mallogro das suas tentativas +contra a Ethiopia e contra os Ammonitas, mudou completamente de systema +e mostrou-se animado de grande intolerancia e ferocidade. Saqueou e +incendiou as cidades e os templos; mandou assassinar os sacerdotes do +boi Apis, o qual por sua propria mão apunhalou; destruiu por toda a +parte as imagens dos deuses; e por fim sahiu do Egypto para se recolher +á Persia. Quando chegou á Syria, rebentou a revolta do falso Smerdis, um +impostor que se inculcava como o irmão de Cambyses (que este assassinára +logo nos primeiros tempos do seu reinado). Apressou-se em ir desmascarar +o rebelde que usurpava o nome de seu irmão, que elle sabia estar morto; +mas, ferindo-se n'uma perna ao montar a cavallo, d'esse ferimento lhe +resultou a morte, succedida logo depois da intrada na Persia. + +Herodoto e outros historiadores pintam este Cambyses como um monstro de +ferocidade, e contam d'elle varios feitos atrozes, como o de ter +assassinado com um ponta-pé dado no ventre a sua irman Meroé (com quem +tinha casado, conforme ao uso da Persia, e que d'elle estava gravida). + +Morto Cambyses, succedeu-lhe no throno o falso Smerdis, que continuou a +fazer-se passar por seu irmão, e que era simplesmente o irmão de um +mago, a quem estava incumbida a administração do palacio real. Conseguiu +reinar oito mezes; mas, passados elles, septe dos mais poderosos chefes +persas urdiram uma conspiração, desmascararam-n'o, deram-lhe a morte, e +acclamaram rei o mais illustre entre elles (Dario, filho de Hystapes). + +No reinado de Dario os Babylonios revoltaram-se, e foram reduzidos á +obediencia pelo estratagema de um official persa chamado Zopiro que, +havendo mutilado voluntariamente o rosto, foi persuadir os Babylonios de +que tinha sido victima da crueldade de Dario. Admittido na cidade, abriu +as portas ao exercito persa. Dario intentou depois subjugar os Gregos; +inviando contra elles um numeroso exercito, commandado por seu genro +Mardonio, exercito que foi desbaratado por Milciades na planicie de +Marathona. Quando Dario tinha apparelhado novo exercito e se dispunha +para segunda expedição, foi surprehendido pela morte. + +Seu filho Xerxes, que lhe succedeu, poz-se á frente d'aquelle numeroso +exercito, cuja força alguns historiadores elevam a 1.700:000 homens, e +de uma esquadra de 1:200 navios, dirigiu-se a atacar a Grecia para +vingar a derrota de seu pae em Marathona; mas foi completamente +derrotado na batalha de Salamina, e teve que tornar a passar o +Hellesponto. No anno seguinte, novo exercito, commandado por Mardonio e +inviado com egual intento contra a Grecia, foi desfeito junto de Platéa +por Pausanias (general da Lacedemonia), e por Aristides. Xerxes veio a +morrer assassinado, no vigessimo anno de governo, por Artabano (capitão +da sua guarda). Succedeu-lhe seu filho Artaxerxes que, constrangido por +Cimon (filho de Milciades), que o venceu perto de Chypre, teve que dar a +liberdade aos Gregos da Asia. + +Depois d'elle reinou Dario II, que se alliou com Sparta contra Athenas; +e a este succedeu Artaxerxes Mnemon, cujo irmão, Cyro o _Moço_, se +revoltou contra elle, com o concurso de tropas gregas, terminando a +revolta pela batalha de Cunaxa, em que aquelle principe foi morto, facto +a que se seguiu a celebre «retirada dos dez mil» picturescamente +descripta pelo historiador Xenophonte. + +Pela paz de Antalcidas os Gregos da Asia tornaram a cahir sob o jugo dos +Persas--cujo imperio se ia, comtudo, progressivamente infraquecendo. O +ultimo rei foi Dario Codomano, no principio de cujo governo foi a Persia +invadida pelas tropas de Alexandre Magno, o qual, nas tres batalhas de +Granico, do Isso, e de Arbella, destruiu todo o poder d'aquella nação, +que na ultima d'ellas se rendeu á discreção do vencedor. + +Durante seis seculos permaneceu a Persia confundida no immenso imperio +dos Parthos; mas, no anno 228 da era actual, Artaxerxes, filho de um +simples soldado, tendo-se elevado pelos seus meritos ás mais altas +dignidades, levantou os Persas contra Artabano, ganhou diversas +victorias e, sendo acclamado rei, fundou o segundo imperio persa. Depois +de haver reinado treze annos, com muito discernimento e prestigio, +morreu, legando a corôa a seu filho Sapor. Este devastou a Mesopotamia, +a Syria e a Cilicia; e ter-se-ia tornado senhor de toda a Asia, se +Odenato, rei de Palmyra e alliado dos Romanos, não tivesse obstado á +continuação das suas victorias e conquistas. Aprisionou o imperador +romano Valeriano ao qual, depois de o conservar por algum tempo captivo, +mandou esfollar em vida. Sapor foi, por sua vez, vencido por Odenato; e, +tendo regressado aos seus estados, foi pouco depois assassinado. Depois +d'estes acontecimentos foi successivamente infraquecendo o segundo +imperio persa. No seculo IV da era christan Sapor II tornou a +fortalecêl-o com suas conquistas, mas por pouco durou essa epocha de +renascimento. O imperio recahiu bem depressa, e a decadencia foi +progredindo até ao momento em que no seculo VII a Persia foi subjugada +pelos Arabes. + +Os Persas foram celebres no tempo de Cyro pela sua austeridade e pela +sua coragem. As creanças (segundo conta Platão) recebiam uma educação +propria para d'ellas formar bons cidadãos, uteis á patria. Até á edade +de dezesete annos permaneciam fóra da casa paterna, intregues a +educadores, especialmente incumbidos de lhes inocularem no espirito os +dictames da coragem e da virtude. + +O imperio era dividido em provincias, governada cada uma por um +_satrapa_, que recebia directamente ordens do rei. Era tida em especial +consideração a agricultura, e muito honrados os que a exerciam; os +cultivadores mais activos e laboriosos eram recompensados e admittidos +uma vez em cada anno á mesa do soberano. A administração da justiça +estava confiada a varões sabios e prudentes, e os juizes que +prevaricavam eram punidos com a pena de morte. A legislação não se +limitava a comminar penas contra os crimes e delictos; tratava tambem de +os evitar, inspirando o horror ao vicio e o amor á virtude. + +Os Persas eram monotheistas; adoravam uma só divindade, que era Mithra +(o Sol); os emblemas da omnipotencia do Creador eram entre elles os +fogos sagrados, mantidos com o maior respeito e solicitude. Os _magos_, +ou sacerdotes, eram homens notaveis pelo seu saber, pela sua gravidade e +pela austeridade da sua vida; eram os sabios e os jurisconsultos da nação. + +Depois da epocha de Cyro, intregaram-se os Persas a todos os excessos de +devassidão; dissolveu-se a disciplina do exercito; os grandes da nação +abandonaram a existencia viril, que os distinguia, e cahiram na inacção +e na ociosidade, o que foi uma das principaes causas da decadencia e da +quéda, do imperio. + + + + +CAPITULO VIII + +OS INDIOS + + +Dá a Geographia a denominação de India a uma extensa peninsula, situada +ao sul da cordilheira do Himaiaya, que é uma das de maior altitude no +mundo. Divide-se a peninsula em tres regiões differentes:--1.ª, o +_Hindustão_ propriamente dito, constituido pelo territorio das duas +bacias do Indo e do Ganges;--2.ª, o _Deccan_, peninsula situada ao sul +d'aquella região e que termina no cabo Comorim;--3.ª, a _India central_, +constituida pela zona de planaltos, que se extende, do occidente para o +oriente, desde o mar de Oman até ao golpho de Bengala. + +As populações que habitam a vasta peninsula indiana podem classificar-se +do seguinte modo:--a raça aryana, ou hindú (Gujarati, Bengali, etc.), +que é a que predomina no Hindustão; a raça dravidica (Tamul, Telinga, +Karnataka, etc.), predominante no Deccan; os restos das raças primitivas +(Ghond, Bhilla, Kolaria, etc.), estabelecidos nas diversas regiões da +India central. + +A historia da raça aryana divide-se em quatro periodos, que podem +chamar-se: _vedico_, _epico_, _brahmanico_ e _buddhico_. + +No _periodo vedico_, e em epocha que não pode determinar-se com +precisão, uma parte do grupo dos Aryas orientaes destacou-se, constituiu +uma nação á parte (os _Hindus_), que se dirigiu para o valle de Cabul +(antigamente, Kubha), atravessou o rio Indo e extendeu-se pelas campinas +de Pendjab (antigamente, Panchanada). + +Grande numero dos hymnos que figuram no celebre _Rig-Veda_ referem-se a +factos, que se passaram n'este primeiro periodo historico, caracterizado +pela immigração e pelo primitivo estabelecimento da raça aryana em +terras da India. Quando esta raça alli chegou, incontrou o territorio +occupado por differentes populações que, ou eram aborigenes, ou pelo +menos tinham longo tempo de habitação n'aquellas paragens. Parte d'estas +populações foi absorvida e assimilada pela raça invasora; outra parte +foi pouco a pouco destruida em luctas porfiadas de seculos. A principio +os Aryas não formavam uma nação unica, mas conservaram-se por muito +tempo divididos n'um certo numero de tribus, as mais notaveis das +quaes foram a dos _Bharatas_, a dos _Iksuakus_ e a dos _Pauravas_, que +chegaram ainda independentes até ao periodo historico seguinte, e vieram +a ser troncos das poderosas dynastias que então se estabeleceram em +terras do Hindustão. + +Durante todo o periodo vedico o viver dos Hindus teve a natureza +pastoril, e a sua organização sociologica distinguiu-se pelo caracter +patriarchal. Ainda entre elles não havia o regimen das castas, que só +mais tarde veio a apparecer. + +O periodo _epico_ ou _heroico_ decorreu desde que os primeiros hindus +intrados na India passaram o rio Sarasuati até que, deslocando-se +progressivamente, chegaram á foz do Ganges. Este periodo foi +caracterizado pela immigração continuada e pelas luctas entre os que +primeiro tinham occupado uma localidade e os que, vindo mais tarde, os +obrigavam a abandonal-a e a progredir na immigração. + +Deu-se durante este periodo um curioso phenomeno historico. Chegando os +primeiros hindus á peninsula indiana, por muito tempo limitaram a sua +occupação a uma zona de territorio que tinha por limite oriental o rio +Sarasuati. Novas tribus, descendo tambem o valle de Cabul, obrigaram as +primeiras, que tinham começado a estabelecer-se nas planicies de +Pendjab, a abandonar as posições primitivas e a ir successivamente +immigrando de localidade em localidade. Isto deu como resultado o +phenomeno de uma enorme massa de população a deslocar-se, com movimento +lento e secular ao longo de uma vasta região, até que esse progredir +parou na imboccadura do Ganges. + +Estas deslocações successivas originaram grandes guerras entre as +differentes tribus; e não só essas luctas, mas tambem as que houve entre +os Hindus e os povos que primitivamente occuparam aquelles territorios, +assignalaram todo o periodo epico. A mais antiga das luctas conhecidas +entre as tribus aryanas é designada na Historia por «guerra dos dez +reis», e deu-se entre a tribu dos Bharatas (cabeça de uma confederação +de dez nações, que tinha por chefe o celebre Vishuamitra) e a tribu dos +Tritsus (a que presidia o egualmente celebre Vasista). Esta ultima tribu +havia passado o Sarasuati antes da das dez nações; e depois, tendo +occupado territorio, oppunha-se á passagem d'ella, que ia invadir-lh'o. +Por occasião d'aquella guerra, conseguiu deter o movimento dos rivaes; +mas mais tarde viu-se obrigada a ceder o logar perante o impeto, cada +vez mais irresistivel, de novas ondas de população que invadiam a India. + +Ao passo que as tribus invasoras iam occupando definitivamente +territorios e iam assentando posições, iam-se formando dynastias. As +duas mais importantes d'este periodo foram: a chamada _Solar_, que +reinou sobre os Tritsus ou Kosalas e teve a sua capital em Ayodhia; e a +_Lunar_, que reinou sobre os Bharatas e teve a sua capital em +Hastinapura. Entre dois ramos da dynastia _Lunar_ houve uma tremenda +guerra; foi entre os Kurus e os Pandus. Depois de varias phases que a +grande lucta apresentou, os Kurus foram por fim inteiramente +desbaratados pelos Pandus, que ficaram reinando em Hastinapura. Com esta +guerra terminou o periodo epico ou heroico. + +No _periodo brahmanico_ os Pandus, vencidos os Kurus, ficaram +constituindo uma poderosa dynastia, á qual foi facil, com o andar dos +tempos, subjugar as diversas populações aryanas que occupavam aquella +região. Formada assim uma grande e opulenta nacionalidade, em breve esta +se sentiu naturalmente animada de tendencia expansiva, mandando +successivas expedições a colonizar o Deccan, o qual tentou conquistar +arrancando-o ás nações dravidicas, que até então o haviam occupado. A +historia d'estas guerras deu assumpto ao grande poema indio o _Ramayana_ +que tem por thema fundamental a conquista do sul da India e da ilha de +Lanká (hoje Ceylão) pelos Aryas. Nada, porêm, positivo se apura +n'aquelle poema com respeito aos factos intimos da referida +guerra,--porque o caracter do _Ramayana_ é inteiramente mythico; e só um +grande esforço de interpretação chega a explicar os seus episodios e a +significação dos seus personagens. + +Alêm d'aquellas expedições, o interesse historico d'este periodo da +historia antiga da India concentrou-se todo na nova constituição social +que n'esta despontou e se veio a firmar e radicar com o tempo. A classe +dos guerreiros, que até então fôra a primeira em categoria e +consideração, cedeu o logar á dos sacerdotes, que ficou sendo a +aristocratica e preponderante. O regimen que desde aquella epocha +dominou na India, e que ainda hoje alli tem profundas raizes, é o +chamado _regimen das castas_. Por esse regimen a sociedade é dividida na +India em quatro classes, religiosa e intransigentemente fechada cada uma +d'ellas a elementos extranhos, e dispostas hierarchicamente na fórma +seguinte:--1.ª a dos _brahmanes_ ou sacerdotes;--2.ª a dos _kshatrias_ +ou guerreiros;--3.ª a dos _vaishias_ ou commerciantes;--4.ª a dos +_sudràs_ (a infima) ou dos servidores. Esta ultima julga-se que provêm +dos restos da população aborigene, que os Aryas não poderam anniquilar +nem assimilar, e que so admittiram no seu corpo social com aquella +fórma e aquelle mister degradantes. No chamado «Código de Manu» está +expressa e formulada esta fórma do regimen estabelecido na sociedade +indiana. + +Ao _periodo brahmanico_ succedeu o _periodo buddhico_, que fecha a +historia antiga da India. N'este periodo a theocracia brahmanica soffreu +um grande abalo e teve que defender-se em lucta porfiada. No seculo VI +antes da era de Christo appareceu na India um homem de talento +extraordinario, que era ao mesmo tempo um propagandista audacioso e +infatigavel. Chamava-se Çakya-muni, era filho de um rajah de um paiz +vizinho do Nepaul, e teve o cognome (pelo qual ficou eternizado na +Historia) de Buddha (ou _sabio_). Philosopho de temperamento, aos vinte +e nove annos de edade abandonou o palacio paterno, as riquezas e o +direito á realeza para viver no deserto, investigando a verdade. Nove +annos depois, fortalecido o espirito com as meditações da solidão, +voltou ao povoado; e começou a pregar nova doutrina ás multidões, +reunidas ao acaso. Por toda a parte orava,--expondo os seus principios, +(quer nas povoações, quer nos campos) á gente de todas as condições +sociaes. Servia-se na sua predica, de parabolas (o mesmo systema que +depois foi seguido por Christo). Apresentava a principio a sua doutrina +como uma simples reforma; mas ella tendia á ruina completa do +brahmanismo, substituindo ao regimen das castas o principio da egualdade +de todos os homens perante a lei moral, e ás falsas virtudes prégadas +pelos brahmanes a práctica do bem. Ás promessas de salvação (isto é, da +união com a essencia divina) só concedida pela religião antiga aos +brahmanes, substituia a capacidade, para todos os homens, de gozarem da +bemaventurança, ganha por seus meritos e virtudes. Rompia com o +privilegio da casta dos brahmanes, para chamar ao sacerdocio os pobres e +os mendigos que quizessem dedicar-se á vida religiosa. A sua doutrina +admittia seis elementos de perfeição, que eram: a sciencia, que devia +ter por objecto distinguir os verdadeiros dos falsos bens; a energia, +que devia consistir na resistencia contra os nossos maiores inimigos, os +prazeres dos sentidos; a pureza, que era a victoria adquirida por +aquella resistencia; a paciencia, que consistia em soffrer os males +imaginarios e os transitorios; a caridade, laço de união entre os +homens; a esmola, como consequencia necessaria da caridade. + +Tão sympathica e tão santa doutrina, que tantos pontos de similhança tem +com a de Christo, não podia deixar de fazer, como fez, um proselytismo +enorme. + +Assim prégou até aos oitenta annos, respeitando sempre a ordem +estabelecida, e proclamando (como o fez mais tarde Christo) que aos +principes se devia dar o que lhes era devido. Por sua morte, os +discipulos reuniram os principaes discursos d'elle e convocaram o +primeiro concilio buddhico, em que tomaram parte 500 religiosos. Depois +de septe mezes de discussão, esse concilio assentou na fórma do culto e +no corpo das doutrinas, o que tudo ficou mais precisado em segundo e +terceiro concilio, que se reuniram, um no seculo V e o outro 150 annos +antes de Christo. + +Por fim os brahmanes, conhecendo o perigo eminente que já corria a +religião antiga e o edificio social, que elles haviam construido, e á +sombra dos quaes viviam e desfructavam commodidades, honras e +distincções, começaram uma lucta feroz contra o buddhismo, chegando a +desincadear contra os seus proselytos uma atroz perseguição. Entre +outros anathemas, prégavam os brahmanes: «Que desde Ceylão até ao +Himalaya, coberto de neve, os buddhistas sejam exterminados. Quem poupar +a creança ou o velho, soffra a pena de morte». Esta perseguição deu +resultado na India, que voltou toda ao brahmanismo; mas o buddhismo +espalhou-se no Thibet (que é hoje o seu centro), na Mongolia, na China, +na Indo-China e em Ceylão. N'estes paizes conta ainda muitos milhões de +seguidores, sendo comtudo poucos os que practicam as doutrinas e os +preceitos de Buddha na sua pureza. + +A civilização indiana, toda com caracter religioso, não primou nem pelo +progresso das sciencias nem pelo das artes. Em sciencia, só a da +grammatica e da linguagem se desinvolveu consideravelmente; da arte só +ficaram monumentos grandiosos nas proporções, mas de pouca belleza +artistica. Prosperaram, porêm, algumas industrias entre os Indios. + + + + +CAPITULO IX + +OS CHINS + + +Não se conhece a duração da sociedade chineza, á qual as suas tradições +maravilhosas attribuem 80:000 a 100:000 annos de existencia. O que é +certo é que o povo chinez é muitissimo antigo, havendo nas suas +tradições mais ou menos certas conhecimento de factos anteriores 3:500 +annos a Christo,--e, desde o seculo XXVI da mesma era, historia +positiva que apresenta seguidos annaes. + +Ignora-se completamente quaes foram a origem e o modo de formação dos +Chins, habitantes do _Celeste Imperio_ ou _Imperio do Meio_. Até ao +seculo XXII antes de Christo os imperadores eram electivos; d'aquella +epocha em deante estabeleceu-se o principio heriditario na successão, +modificado n'um ponto (e era que os grandes do imperio podiam escolher +entre os filhos do soberano defuncto o que julgassem digno de +succeder-lhe). + +O imperador Yu foi fundador da dynastia dos _Hia_, que durou quatro +seculos e que acabou no meio de grandes desordens e de uma atroz +tyrannia. A segunda dynastia, a dos _Chang_, foi fundada por um principe +de merecimento superior cujas virtudes foram celebradas por Confucio, e +veio a acabar como a anterior, sendo o seu ultimo representante um +tyranno abominavel, desthronado por Wu-Wang, principe de _Tehéu_, que +contra elle se revoltou. Este, tomando o governo, reorganizou o antigo +«tribunal da historia», cujos membros gozavam de inamobilidade, que lhes +assegurava a independencia. Durante esta dynastia os reinos feudatarios +da China, que já desde antiga data existiam, augmentaram até ao numero +de 125, e na China constituiu-se um verdadeiro feudalismo. Este, porêm, +acabou em perfeita anarchia; o imperador chegou a absoluta impotencia, e +um dos seus feudatarios offereceu sacrificio ao céu (prerogativa +exclusiva do soberano), e prendeu no palacio o ultimo imperador +d'aquella dynastia. Começou nova dynastia, a dos _Thsin_ que, destruindo +todos os pequenos principados, reconstruiu com sua unidade e poderio o +grande imperio. Um imperador d'ella, Chi-Hoang-Ti, concluiu aquella +transformação, abriu grande numero de estradas, perfurou montanhas e, +para impedir as correrias dos Tartaros nomadas, mandou construir a +_grande muralha_, que mede 2:500 kilometros de comprimento. Tornou-se +porêm, tristemente celebre pela perseguição dos lettrados e pelo +incendio dos livros. Na sua enorme vaidade, queria que tudo datasse do +seu reinado e pretendeu assim apagar os vestigios do passado. Não poude, +felizmente, matar todos os sabios, nem destruir todos os livros. A +monarchia chineza, que n'aquella data foi perturbada por tão violento e +insensato reformador, voltou depois á sua tradicional quietação; os +sabios recuperaram a sua influencia; e o paiz augmentou +consideravelmente em prosperidade. Mas depois, minada por vicios de +dissolução interior, não teve força para resistir ás invasões dos +Mongoes que, transpondo a grande muralha, foram causa da divisão da +China em dois reinos, separados pelo rio Azul, e nos quaes houve +differentes dynastias, que todas tiveram uma existencia obscura. Li-Ang +tornou a reunil-os no anno 618 da era actual; mas não conseguiu +robustecer o imperio restaurado, de modo que pudesse resistir ás +repetidas Invasões mongolicas. Estas invasões continuaram durante a +Edade-Média, e são já estranhas ao assumpto do presente livrinho. + +É a civilização da China uma das mais antigas que se conhecem; mas, +apezar d'isso, é a que menos tem progredido ou, melhor diremos, a que +por maior decurso de tempo tem permanecido estacionaria. Tem sido causas +d'esse estacionamento o temperamento proprio da raça chineza, a sua +fórma de governo, a sua religião e o isolamento em que a nação se tem +conservado a respeito do resto do mundo. + +A fórma de governo tem sido sempre como que patriarchal. O imperador é +simultaneamente soberano e pae de todos os seus subditos, que de um +extremo a outro do imperio formam uma unica familia, sem distincção de +castas ou hierarchias. As doutrinas de Confucio têem contribuido +principalmente para conservar ás instituições chinezas a sua estabilidade. + +Confucio viveu no seculo VI antes de Christo. Os seus livros, sendo como +que o evangelho do Imperio Celeste, são estudados por todos os que têem +que sujeitar-se aos exames que habilitam para os titulos litterarios e +para o exercicio dos cargos publicos. Confucio não foi legislador, nem +teve auctoriade para promulgar leis; mas ensinou a «sabedoria». E na +práctica das doutrinas por elle professadas assenta todo o edificio +politico e religioso na China. + +Segundo elle, a moral dos antigos sabios, que é a da verdadeira e eterna +sabedoria, consiste na observancia das tres leis fundamentaes das +relações entre o soberano e os subditos, entre o pae e os filhos, e +entre o marido e a mulher; e tambem em practicar as cinco virtudes +capitaes (que são: a humanidade, isto é, uma caridade universal para com +todos os individuos da nossa especie sem distincção; a justiça, que dá a +cada um o que lhe é devido, sem favorecer um em prejuizo de outro; a +conformidade aos ritos prescriptos e aos usos estabelecidos, a fim de +que os que formam a sociedade tenham uma maneira commum de viver, e +participem todos de eguaes vantagens e de eguaes incommodos; a rectidão, +ou a inteireza de espirito e de coração, que faz que cada um busque a +verdade, sem se deixar offuscar pelo interesse, proprio ou alheio; a +sinceridade e boa fé, ou a lisura e confiança, que exclue toda a +dissimulação e toda a falsidade, quer nos actos quer nas palavras). + +Os seus principios religiosos fundamentaes são os seguintes. O céu é o +principio universal, a origem fecunda de que todas as coisas procederam. +Os nossos antepassados, d'elle oriundos, foram a origem das gerações +seguintes. Dar ao céu testemunhos de agradecimento é o primeiro dever do +homem; mostrar gratidão aos antepassados é o segundo. É por isso que +Fou-Hi estabeleceu ceremonias em honra do céu e dos antepassados. + + + + +CAPITULO X + +OS GREGOS + + +Na Antiguidade, a Grecia propriamente dita era apenas uma região +constituida por uma pequena porção de territorio do continente europeu, +e pela peninsula que na bacia Oriental do Mediterraneo termina o mesmo +continente, entre o mar Jonio ao occidente e o mar Egeu (hoje denominado +Archipelago) ao oriente. Tambem pertenciam á Grecia as numerosas ilhas +que ha nas proximidades d'aquella região. As diversas populações que na +Grecia vieram a ter importancia historica derivaram-se todas da raça +aryana, da qual constituiam um grupo especial (o hellenico). Este grupo, +pela brilhante civilização que no seu seio se elaborou, constitue um dos +mais nobres da historia, e formou uma individualidade distinctissima +atravez dos seculos. + +Na obscuridade dos primitivos tempos, parece que os primeiros +habitadores da Grecia foram os Pelasgos e os Jonios. Os primeiros +povoaram com suas tribus a Asia Menor, a Grecia e a Italia, lançaram +n'estes paizes os primeiros fundamentos da civilização, e por toda a +parte deixaram nos seus monumentos provas eternas da sua actividade e +das suas poderosas aptidões. Desappareceram, porêm, sem que sobre o seu +destino ulterior haja tradição segura. + +Quando a Grecia apenas sahia do estado selvagem, vieram (segundo antigas +tradições) colonias dos paizes mais civilizados da Asia e da Africa +trazer-lhe os conhecimentos das artes uteis e uma religião mais pura. +Foi assim que Cecrops, oriundo do Egypto, desimbarcou na Attica, +reunindo os habitantes d'ella em diversas povoações, das quaes Athenas +veio a ser a capital; ensinou-lhes algumas culturas, promulgou as leis +do casamento e instituiu o tribunal do Areopago, destinado a julgar os +pleitos. Do mesmo modo na Beocia, Cadmo introduziu o alphabeto phenicio +e edificou Cadméa, emtorno da qual se elevou mais tarde a cidade de +Thebas. Dano introduziu em Argos algumas das artes do Egypto; e Pelops, +phrygio, estabeleceu-se na Elida, d'onde a sua raça se espalhou por toda +a peninsula que d'elle tirou o nome. O acontecimento dominante d'aquella +epocha foi a invasão dos Hellenos que do norte da Grecia, sua primeira +habitação, se derramaram por todas as outras partes da peninsula, á +custa dos Pelasgos que foram absorvidos pela população invasora. + +Apoz esta epocha primitiva seguiram-se os tempos heroicos, em que homens +de grande valor physico percorriam a Grecia, para a libertar dos +salteadores, dos oppressores e dos animaes selvagens. Passando a sua +vida a combater todos os flagellos, aquelles heroes recebiam dos povos +agradecidos as honras de semi-deuses; mas muitas vezes abusavam da sua +força e das suas vantagens pessoaes. Entre outros foram notaveis +Hercules e Theseu. Tambem ficaram nas tradições poeticas: os Argonautas +e a sua viagem aventurosa até á Colchida, em busca do _vellocino de +oiro_; os septe chefes que foram cercar Thebas, infamada pelos crimes de +Oedipo e pelas dissenções entre seus filhos; o sabio Minos; etc. + +Foi n'este periodo que se deu a guerra de Troya. Esta cidade era a +capital de um poderoso reino estabelecido no noroeste da Asia Menor e o +ultimo resto do dominio dos Pelasgos. O celebre Páris, filho de Priamo +(rei de Troya), fez uma viagem ao Peloponeso e d'alli furtou e levou +para a sua patria Helena, mulher de Meneláu (rei de Esparta ou +Lacedemonia). Pedindo-a depois o marido e os mais Gregos aos Troyanos, +estes negaram-se a intregál-a, pelo que lhes foi por aquelles declarada +a guerra. Quasi toda a Grecia com seus principes foi a esta expedição, +levando por general supremo o rei Agamemnon. Ás ordens d'este principe +iam Achilles (capitão de grande valor), Ajax Tellamonio, Ajax Oileu, +Diomedes, Menesteu, Ulysses (rei de Itaca), e Nestor (varão de edade já +muito avançada). Foi posto cêrco a Troya; mas durante quasi dez annos +não houve batalha decisiva. Troya, defendia-se e parecia disposta e +habilitada a continuar a defender-se com vantagem, não obstante a falta +de Heitor, que a commandava e que morreu ás mãos de Achilles. Os +Gregos usaram por fim de um estratagema; fingiram retirar-se, deixando +no campo, como presente, um gigantesco cavallo de madeira, que os +Troyanos recolheram dentro de suas muralhas. Mas no corpo do animal +occultavam-se os mais bravos d'entre os Gregos, que assim se +introduziram na cidade, cujas portas abriram ao resto do exercito. Desse +modo cahiu Troya, sendo Priamo assassinado ao pé dos altares. Os +principes gregos que não haviam morrido na lucta, voltaram a caminho da +sua patria; mas grandes infelicidades os esperavam. Uns morreram na +viagem; outros, como Ulysses, andaram muito tempo desviados do caminho +por ventos adversos; outros (como Agamemnon) ao chegarem aos seus +paizes, incontraram os thronos occupados por usurpadores, de que foram +victimas; outros, emfim, viram-se obrigados a ir estabelecer habitação +em regiões longiquas, como Diomedes e Idomeneu. + +Toda a historia d'esta epocha está tão eivada de fabula, que é quasi +impossivel apurar-se a verdade. + +Os oitenta annos que se seguiram á guerra de Troya foram todos occupados +por dissenções intestinas, que derrubaram as antigas dynastias, e +transferiram a preponderancia para as mãos de novos povos. Estas +revoluções, e outras que mais tarde houve, deram logar a varias +correntes de emigração; e ao longo das costas da Asia Menor, da Africa, +da Sicilia, e da Italia, formou-se uma nova Grecia, que cresceu e +prosperou, e por muito tempo foi mais rica do que a metropole. Foi assim +que os Gregos se estabeleceram em Smyrna, Phocéa, Epheso e Mileto (na +Asia Menor); em Cyrena (na Africa); em Messina e Syracusa (na Sicilia); +e em Taranto, Napoles e Sybaris (na Italia). Nas colonias da Asia, em +contacto com as velhas sociedades do Oriente, começou a evolução +civilizadora, de que Athenas veio a ser mais tarde o brilhantissimo fóco. + +Mas, apezar de tão grande dispersão da população grega, apezar da +divisão da Grecia em tantos estados, a grande familia hellenica +conservou a sua unidade nacional, pela communidade da lingua e da +religião, pela celebridade de alguns oraculos (o de Delphos +principalmente, ao qual concorria gente de todos os pontos do mundo +grego), e por algumas instituições geraes que conservavam estreitos os +laços moraes das populações entre si. + +Entre 800 e 700 annos antes de Christo, houve de notavel na Grecia o +apparecimento das leis de Lycurgo. Este personagem nasceu em Esparta. A +viuva do rei Polydecto, seu irmão, offereceu-lhe com a sua mão de +esposa o throno de Esparta, com a condição d'elle matar seu sobrinho +Charilaus. Recusou-se a isso Lycurgo; e, como os grandes do reino se +mostrassem contra elle irritados pela sabia administração que usára como +regente, durante a menoridade do sobrinho, resolveu exilar-se e viajou +por muito tempo, estudando a legislação dos outros povos e voltando a +Lacedemonia, depois de uma ausencia de dezoito annos, com o intento de +fazer adoptar reformas importantes nas leis do reino. A pythonisa de +Delphos apoiou com a sua auctoridade religiosa as reformas propostas; e +os Espartanos, fatigados das suas dissenções intestinas, que laceravam o +estado, acolheram-n'as favoravelmente. + +As leis politicas de Lycurgo mantiveram as relações estabelecidas entre +os Espartanos, como povo dominador, e os Laconianos, como povo +subjugado. Regularam os direitos da realeza distribuidos por duas casas +soberanas; os do senado, composto de varões de edade superior a sessenta +annos; os da assembléa geral, que podia acceitar ou regeitar as +propostas feitas pelo senado ou pelos reis; enfim, os dos _ephoros_, +magistrados annuaes, que administravam a justiça. As suas leis civis são +muito mais notaveis e de muito maior alcance; e tiveram por fim +estabelecer a egualdade entre todos os cidadãos. Para chegar a tal fim, +dividiu elle as terras em 39:000 porções (30:000 para os Laconianos e +9:000 para os Espartanos). Para manter a egualdade entre os cidadãos, +Lycurgo prohibiu o luxo e a moeda de oiro e de prata; e instituiu as +refeições publicas, em que reinava a maior frugalidade. Vedou aos +Espartanos o commercio e a cultura das artes e das lettras, +sujeitando-os todos a eguaes exercicios physicos, com a mira de formar +cidadãos robustos para a defesa da patria. Ao mesmo fim era dirigida a +educação das creanças, que mais pertenciam ao estado do que á familia; a +creança que nascia disforme, matavam-n'a. + +Acabadas por esta legislação rigorosa as discordias interiores, e +robustecida assim Esparta, concluiu esta a conquista da Laconia e +imprehendeu a do Peloponeso. Combateu a tribu dorica dos Messenios, com +a qual teve duas guerras, (uma que durou vinte annos e a outra +dezesepte). As victorias n'estas luctas alcançadas deram grande nomeada +aos Espartanos, que no seculo VI antes da era christan eram considerados +como o primeiro povo da Grecia. + +Pelo mesmo tempo florescia tambem Athenas, comquanto os defeitos da sua +organização social déssem origem a grande mal-estar interior e a +repetidas perturbações. A grande desegualdade dos haveres tinha dado +origem á formação de duas classes: a dos _eupatridas_, ou senhores das +terras, e a dos _thetas_, ou servos que as cultivavam. Além d'estas duas +havia ainda a dos escravos propriamente ditos. + +A morte de Codro, ultimo rei dos Athenienses, deu logar a estabelecer-se +uma nova fórma de governo. Os dois filhos d'elle, Medon e Nileu, +disputaram entre si a corôa. Os Athenienses, que tinham sido sempre +muito ciosos da sua liberdade, aproveitaram este ensejo para a +reivindicarem completamente; declararam que depois de Codro não havia +ninguem digno do titulo de rei e puzeram á testa da republica um +primeiro magistrado a que deram o nome de _archonte_, e cuja auctoridade +era muito limitada. Durante mais de tres seculos foi esta magistratura +vitalicia e hereditaria; no fim d'esse tempo tornou-se electiva, e as +funcções de _archonte_ foram limitadas a dez annos. Mais tarde ainda, o +poder foi distribuido por nove _archontes_, cujo mandato durava um anno. +D'ahi provieram grandes dissenções, divisões de partidos, rivalidades e +desordens. + +Para obviar a tantos males viu-se que era necessario fazer leis, que +fossem superiores a todas as magistraturas. Foi escolhido para as +formular Dracon, homem de virtudes austeras e que gosava da estima +geral. Dracon apresentou um codigo de leis de tal severidade, que +revoltaram os espiritos mais exigentes e que não puderam ser executadas. +Como novas dissenções puzeram em novo perigo o estado, recorreu-se a +Solon, varão illustrado e de grande patriotismo, a quem foi dada a +missão de fazer as necessarias leis e organizar uma constituição fundada +em principios racionaes e estaveis. + +Dividiu Solon o povo em quatro classes, segundo o rendimento de cada um. +Os cidadãos das tres primeiras classes eram os unicos que podiam exercer +cargos publicos; os da quarta, composta da infima plebe, eram admittidos +a votar nas assembléas publicas, das quaes se excluiam os estrangeiros. +Decretou a pena de morte contra todo o _archonte_ que se embriagasse, e +declarou excluido da tribuna e indigno de falar ao povo todo o homem de +vida depravada. Estabeleceu que os _archontes_ se informassem da +occupação de todos os cidadãos e que declarassem infames os que +persistissem na ociosidade, depois de por ella terem soffrido tres +condemnações. Decretou que o estado sustentasse até á edade de vinte +annos todos os filhos dos cidadãos que morressem no serviço da patria. +Das leis draconianas apenas conservou as que eram dirigidas contra +os assassinos. Não fez lei penal contra o parricidio, porque não julgou +possivel que tal crime se commettesse em Athenas. Para tornar duravel a +sua legislação, fêl-a gravar toda em pranchas de madeira, e depois sahiu +de Athenas por algum tempo para ir estudar a sabedoria das antigas +nações do Oriente. + +Quando regressou, notaveis acontecimentos o esperavam. Os partidos +tinham re-apparecido e das luctas entre elles tinha surgido a tyrannia +de Pisistrato, o qual, sem abolir a constituição, exercia tal +influencia, que dominava todos os magistrados. Pisistrato duas vezes foi +expulso do poder e de Athenas; mas duas vezes conseguiu recuperar o +governo, que por fim conservou até á morte. Depois d'esta succederam-lhe +seus dois filhos Hipparco e Hippias, que governaram conjunctamente; mas +em seguida houve novas e continuadas dissensões, até ao tempo de +Themistocles, no qual a Grecia, ingrandecida com as conquistas de +Milciades e arvorada já em verdadeira potencia maritima, viu ainda o seu +poder naval accrescentado com 200 navios, mandados construir com o +producto das minas de prata de Laurion. + +Foram esta armada poderosissima, e o valor e pericia dos seus generaes, +que salvaram a Grecia das expedições contra ella organizadas por Dario e +Xerxes, de que já falámos no capitulo VII d'este livrinho. + +Foi sobre todos notavel na Grecia o periodo d'estas guerras e o tempo +que se lhes seguiu. Appareceram então distinctissimos generaes, e +excellentes estadistas; e o povo grego, não obstante o seu animo +irrequieto e o seu espirito sedicioso, parece que reprimiu todos os +ardores que podiam ser prejudiciaes á causa publica, para só dar livre +curso a todas as tendencias conducentes ao ingrandecimento da patria e á +sua victoria contra os ataques dos inimigos. + +Por esta epocha appareceu Pericles--homem de tal merito, que deu o seu +nome ao seculo em que viveu e em que a Grecia foi o grande fóco da +civilização do mundo. + +Era filho de Xanthippo, o vencedor de Mycale. Educado pelos sabios mais +notaveis do seu tempo, mostrou-se desde a adolescencia muito instruido +em todos os ramos do saber humano. Apesar de estar pelo seu alto +nascimento destinado a ser chefe do partido aristocratico, que no começo +da vida d'elle tinha a maior influencia em Athenas, esposou a causa do +povo, fazendo-se chefe do partido democratico. Fez reformas profundas, +em que cerceou as attribuições dos altos poderes do estado em beneficio +do povo. Em virtude d'essas reformas, todas as funcções publicas, +ainda as mais elevadas, ficaram sendo accessiveis aos cidadãos mais +humildes, contanto que a sorte ou a eleição a ellas os chamassem. + +Como o imperio sujeito á pequena cidade de Athenas fosse demasiado +vasto, para que ella pudésse mantêl-o sujeito, Pericles expediu +numerosas colonias que não formaram, como as anteriores, cidades +independentes da metropole, mas sim fortalezas e estabelecimentos +militares que mantinham na sujeição a Athenas os paizes onde existiam. + +Não teve Pericles sómente em vista a grandeza e o poderio de Athenas; +cuidou tambem da gloria d'ella. Chamou para alli todos os homens +eminentes que então havia na raça hellenica, os quaes todos para lá +concorreram, como para a capital da intelligencia. Celebravam-se alli +festas esplendidas, que attrahiam enorme concurso de todas as povoações +gregas. + +Athenas chegou assim a ser um dos mais intensos fócos de civilização que +o mundo tem visto. Ao lado do eminente vulto de Pericles, viram-se então +alli brilhar: Sophocles e Euripedes, dois dos maiores poetas tragicos +conhecidos; Lysias, orador eloquentissimo; Herodoto, narrador admiravel; +Aristophanes, o maior poeta comico da Antiguidade; Phidias, o mais +illustre dos seus artistas; Apollodoro, Zeuxis, Polygnoto e Parrhasios, +pintores bastante celebres; Anaxagoras e Socrates, philosophos +notabilissimos. Ainda depois d'estes vultos de primeira ordem vieram +Eschylo, Thucydides, Xenophonte, Platão e Aristoteles. Athenas teve por +aquella epocha, a honra de ser não só a «mestra da Grecia», como lhe +chamaram, mas tambem a mestra do mundo. + +Depois de vencida a batalha de Salamina, tinha-se Athenas collocado á +frente de uma confederação dos gregos insulares e asiaticos, afim de +proseguir na guerra contra os Persas; mas tendo-se os sitiados cançado +de combater, havia ella acceitado os seus tributos em vez de +contingentes militares e continuára por si só a sustentar a lucta, no +interesse commum. Depois da guerra, continuou a cobrar os mesmos +tributos, pretextando que precisava estar prompta para impedir uma nova +invasão. Os alliados, com o tempo, intenderam que era duro estar a pagar +para as festas e para os monumentos de Athenas; e queixaram-se. As suas +queixas, porêm, foram duramente repellidas, pelo que elles dirigiram as +suas supplicas a Esparta. Esta, ciosa sempre da grandeza e das glorias +de Athenas, procurou formar uma liga continental, cujas forças oppuzesse +ás das cidades maritimas e insulanas sujeitas aos Athenienses. A +principio houve só hostilidades parciaes; mas mais tarde tornou-se +geral a guerra, depois do ataque de Platéa (alliada dos Athenienses) +pelos Thebanos (alliados de Esparta). Essa lucta é conhecida pela +designação de «guerra do Peloponeso». + +Durante dez annos correu esta guerra, com vantagem ora para uma ora para +outra das contendoras, até que Nicias assignou um tratado de paz, que +tem o seu nome. A paz, porêm, contrariava os calculos de Alcibiades, que +contava com a guerra para se elevar; por isso propoz este a expedição á +Sicilia, que teria sido bem succedida, se elle, accusado de sacrilegio, +não fosse privado do commando do exercito. Alcibiades retirou-se então +para Esparta, d'onde dirigiu duros golpes contra a sua patria. Os +Athenienses puzeram cêrco a Syracusa; mas, em resultado da pouca energia +de Nicias, tal cêrco terminou pela destruição da esquadra e do exercito +atheniense, cujos chefes foram mortos pelos Syracusanos e os soldados +reduzidos á escravidão. Este desastre foi um enorme golpe para Athenas. + +Comtudo a guerra continuou; e os Athenienses ainda por vezes obtiveram +vantagens, que obrigaram Alcibiades a fugir de Esparta. Entretanto em +Athenas rebentou uma revolução, na qual a democracia foi sacrificada a +um conselho superior composto de 400 membros, que substituiu o senado, e +a uma reunião de 5:000 cidadãos escolhidos, que substituiu a assembléa +do povo; mas pouco depois um exercito que operava em Samos fez uma +contra-revolução, restabelecendo o governo democratico e acclamando +Alcibiades. Este foi chamado a Athenas, e com a sua vinda +restabeleceu-se a auctoridade do povo. Os Athenienses ganharam duas +batalhas navaes no Hellesponto, uma grande victoria, tanto em terra como +no mar, em Cyzica, e por fim tomaram Byzancio. Estas victorias foram, +porêm, o resultado de um grande esforço, que exhauriu o resto da +vitalidade de Athenas. + +Cyro o _Moço_, que buscava a alliança de Esparta, para arrancar a seu +irmão Artaxerxes II a corôa da Persia, forneceu a Lysandro, que +governava em Esparta, grandes recursos para levar a cabo a guerra. Com +este auxilio, os Espartanos derrotaram os Athenienses em Egos-Potamos; e +pouco depois Athenas foi tomada, as suas fortificações arrazadas, a sua +marinha reduzida, desorganizado o seu exercito e abolida a constituição +democratica, que principalmente concorreu para a sua grandeza e para a +sua gloria. + +A hegemonia grega passou para Esparta, que não soube usar d'ella com a +mesma habilidade e esplendor com que o fizera Athenas. Cyro o _Moço_ +levou por deante o seu plano com o auxilio dos Espartanos, avançou até +ao pé de Babylonia, onde ganhou a batalha de Cunaxa; mas foi morto, e á +sua morte seguiu-se a retirada chamada «dos dez mil» a que já nos +referimos, operada atravez de 400 leguas de terreno, pelas montanhas +impervias da Mesopotamia e da Armenia até ao Mar-Negro. O exito d'esta +retirada revelou o infraquecimento do grande imperio persa; por isso, +poucos annos depois o espartano Agesilau, resolveu conquistál-o. Chegou +a reunir grandes forças e muitas allianças, mas o seu plano ficou +frustrado, porque os Persas tiveram artes de suscitar guerra interior no +seio da propria Grecia. Por sua instigação, Corintho, Thebas e Argos +formaram uma liga, em que intraram tambem Athenas e a Thessalia. +Agesilau, regressando da Asia, conseguiu vantagens em terra, +restabelecendo o dominio de Esparta; mas o atheniense Conon, commandante +de uma frota phenicia, arrancou-lhe das mãos o dominio maritimo e com o +oiro dos Persas, restaurou as fortificações de Athenas. + +Esparta, inquieta pelo renascimento da sua rival, inviou mandatarios á +Persia, a tratar com ella dos meios de lhe intregar os gregos da Asia, +acceitando todas as condições. Era o resultado do abatimento moral e da +depravação que tinha ganhado a raça hellenica. Destruiu algumas cidades +e perseguiu diversas populações sujeitas a Athenas, até que os seus +excessos tiveram um castigo. Um dos seus generaes surprehendeu e tomou á +falsa fé Cadmea, cidadella de Thebas, que era então alliada de Esparta. +O thebano Pelopidas, á frente de alguns proscriptos, libertou, porêm, a +sua patria, e reuniu n'uma alliança commum todas as cidades da Beocia. +Tendo os Espartanos mandado contra estes povos colligados um exercito, +Epaminondas desbaratou-o na batalha de Leuctras, levando a guerra até ao +seio do Peloponeso. Abriu caminho até aos muros de Esparta, na qual, +comtudo, não poude intrar; mas, para a conter em respeito, edificou aos +seus lados Megalopolis e Messena, dois optimos pontos fortificados. +Esparta procurou por toda a parte alliados contra estes novos +dominadores da Grecia; mas Epaminondas em activa guerra sustentou firme +a dominação de Thebas, dominação que veiu a cahir com elle, morto no +meio da sua victoria de Mantinéa. + +Poucos annos depois, Filippe da Macedonia, tendo libertado o seu paiz do +jugo e da influencia dos extrangeiros, quiz ingrandecêl-o, +accrescentando-lhe a Grecia. Tomou e submetteu differentes povoações, +com que foi augmentado o seu imperio, observando-se por toda a extensão +da Grecia uma grande falta de energia e um fraco espirito de +resistencia. Só os Athenienses velavam pela patria commum, guiados pelo +grande cidadão e grande orador Demosthenes, que nas suas eloquentes +orações mostrava os planos ambiciosos de Filippe. Mas Athenas não poude +sustentar por si só, durante longo tempo, uma lucta tão desegual, e por +fim teve que firmar, por conselho do proprio Demosthenes, um tratado de +paz com o rei da Macedonia. + +Emquanto Athenas, descançando na fé d'este tratado, se abandonava ás +festas e ás suas occupações ordinarias, Filippe transpoz as +Thermophylas, penetrou na Phocida, e conseguiu ser adimittido no +conselho amphictionico. Os Athenienses salvaram ainda Perintho e +Byzancio, ás quaes Filippe seria obrigado a levantar os cêrcos. Á voz de +Demosthenes, que não cessava de lhes mostrar os perigos, nas suas +immortaes _Filippinas_, os Athenienses e os Thebanos, esquecendo a sua +mutua rivalidade, reunem os seus exforços para opporem ao inimigo +commum; mas o seu exercito, commandado por generaes inhabeis e talvez +vendidos ao oiro de Filippe, foi desbaratado n'uma grande batalha na +planicie de Cheronéa. Depois d'esta batalha, Filippe propoz-se captar a +sympathia dos Gregos, que tratou com as maiores blandicias, e conseguiu +ser por elles nomeado generalissimo das tropas destinadas a marchar +contra a Persia. Para preparar esta grande expedição voltou a Macedonia, +onde foi assassinado por Pausanias durante a celebração dos jogos +olympicos. + +Succedeu-lhe seu filho Alexandre com vinte e um annos de edade. Tendo os +barbaros, que seu pai subjugára, tomado as armas, elle, para lhes +estorvar os movimentos, levou o seu exercito até ao Danubio, passou este +rio n'uma noite e derrotou os rebeldes. Julgando os Thebanos aquelle +ensejo propicio para se libertarem dos Macedonios, apoderaram-se da +cidadella, cuja guarnição degollaram. Alexandre reuniu logo um exercito, +com que introu na Beocia, exigindo d'elles que lhe intregassem os +auctores da revolta. Como lh'os recusassem, deu-lhes batalha, +destroçando-os e tomando Thebas; que saqueou e destruiu. + +Os Athenienses, receando então haver incorrido na colera de Alexandre, +mandaram-lhe emissarios a implorar clemencia. Este usou para com elles +de generosidade, da qual comtudo esperava tirar partido para os seus +planos de conquista; pacificou a Grecia e reuniu em Corintho deputados +de todas as republicas hellenicas, que o nomearam general em chefe de +uma expedição contra os Persas. Para levar d'esse modo a effeito o +plano de seu pae, confiou o governo da Macedonia e da Grecia a Antipater +e partiu com um exercito de 30:000 homens de infanteria e 5:000 de +cavallaria, á conquista da Persia, onde então reinava Dario Codomano. + +Então começou para Alexandre uma serie de victorias e de conquistas, que +constituem uma verdadeira epopéa. Introu na Phrygia depois de atravessar +o Hellesponto sem difficuldade; na passagem do Granico, defendida por um +exercito persa de 100:000 homens de infanteria e mais de 10:000 de +cavallaria, derrotou este, apoderando-se depois de Sardes, que era a +chave da Alta-Asia. Epheso, Mileto, Halycarnasso e todas as cidades da +costa da Asia intregaram-se-lhe. + +No anno seguinte, para se oppor á continuação das suas conquistas, +levantou Dario um grande exercito e resolveu levar a guerra ao coração +da Macedonia. Memnon, seu general em chefe, á testa da expedição, tomou +as ilhas de Chio e de Lesbos. Alexandre não quiz intregar ao acaso de um +combate naval a gloria até alli alcançada; abandonou aos Persas o +dominio do mar e fez convergir todos os seus exforços para se apoderar +dos portos e cortar toda a communicação entre o exercito inimigo e a +Grecia. Tendo subjugado a Lydia, dirigiu-se para a Pamphylia sem +incontrar obstaculos; atravessou a Cappadocia, foi á Cilicia e a Tarso, +d'onde partiu ao incontro do exercito de Dario, que derrotou nos +desfiladeiros do Isso. A mãe, mulher e filhos de Dario cahiram em seu +poder e Alexandre tratou-os com a maior generosidade. Apoderou-se depois +da Phenicia, e tomou Tyro depois de septe mezes de cêrco. Subjugou em +seguida a Judéa, e tomou Damasco, onde estavam os thesouros de Dario. +Intentou destruir Jerusalem, por lhe haver recusado viveres; mas +desistiu do seu proposito, em presença das supplicas que lhe dirigiu o +summo sacerdote Jaddo. + +Da Judéa dirigiu-se para o Egypto, onde bastou a sua presença, para que +todas as povoações se lhe intregasem. Foi até á imboccadura do Nilo, +onde lançou os fundamentos da cidade de Alexandria. Incaminhou-se para o +Alto-Egypto, penetrou no deserto e chegou até ao oasis em que estava +estabelecido o templo de Jupiter Ammon, e onde os sacerdotes lhe +concederam o titulo de «filho de Jupiter». + +Do Egypto voltou á Asia e penetrou na Armenia, indo ao incontro de um +terceiro exercito de Dario, que derrotou, apezar da grande superioridade +numerica d'este, intrando triumphante em Babylonia. Esta victoria +tornou-o senhor do grande imperio persa; e elle, para segurar as suas +conquistas, marchou em persiguição de Dario que foi morto por um +traidor do seu proprio exercito, Besso, em Ecbatana. + +Alexandre tomou sob a sua protecção a familia de Dario; marchou contra +Besso, que se fizera proclamar rei em Bactriana, apoderou-se d'elle e +mandou-o matar. A posse do mar Caspio e as estradas militares que abriu +para Herat e para Nichapur patentearam-lhe as communicações com todos os +differentes pontos da Persia. + +Depois de ter assentado tão vasto dominio, resolveu passar á India. +Atravessou o Indo, alliou-se com o rei Daxilo e subjugou differentes +estados vizinhos d'este. Adeantou-se até ao interior da India, onde +edificou diversas cidades, e preparava-se para atravessar o Hyphaso, +quando as suas tropas, fartas de tão longo exilio e de tanta +peregrinação, se recusaram a seguil-o e lhe pediram para voltar á +patria. Alexandre annuiu a este desejo. Depois do seu regresso, ainda +subjugou os Oxidracos e outros povos, percorreu a Média, e introu em +Ecbatana, onde falleceu o seu favorito Ephestion. + +Voltando a Babylonia, foi alli alvo do maior triumpho. Recebeu +embaixadores de todas as partes do mundo, acolhendo com especial agrado +os da Grecia. Quiz fundir os Gregos e os Persas n'um só povo, por meio +de allianças e de colonias, e espalhou por todo o Oriente as idéas, a +litteratura e a civilização da Grecia. Durante um anno elaborou esses +planos, mas não poude pôl-os em execução, porque veiu a morrer aos 39 +annos de edade, no anno 324 antes de Christo. + +Fallecido Alexandre, os Macedonios, depois de alguns dias de +contestações e de jogo de intrigas e de ambições, escolheram para rei a +Arideu; mas bem depressa se desfizeram d'elle, bem como da familia de +Alexandre. Os generaes, que haviam sido d'este, trataram de apoderar-se +das conquistas que elle fizera, e a partilha foi origem de uma guerra +que veio a terminar com a batalha de Ipso. + +Emquanto os successores de Alexandre disputavam entre si as conquistas +da Asia, a Grecia intentou recuperar a sua liberdade. Demosthenes, que +ficára sendo o inspirador do patriotismo e do partido nacional, promoveu +a guerra da independencia, que acabou por um desastre. O grande orador +sendo proscripto, invenenou-se no exilio. Com esta morte toda a +esperança se perdeu. Ainda Arato conseguiu restaurar a antiga +confederação das cidades de Achaia; e essa confederação ia talvez +extender-se, para formar uma barreira perante as ambições da Macedonia. +Mas Esparta, que se tinha novamente elevado sob o governo de Cleomenes, +correu a imbargar-lhe o passo. Cleomenes foi vencido; porêm os +Macedonios, que tinham auxiliado os Acheus contra elle, ficaram outra +vez preponderantes. Os Romanos começam a inquietar-se com essa +preponderancia, resolvem intervir, ganham a batalha de Cynocephalo, +dissolvem a confederação achaica, e declaram livres todas as cidades da +Grecia. Estas regosijam-se com o facto, sem comprehenderem que os +Romanos dividiam para dominar e absorver. Conheceram tarde o seu erro; +e, quando quizeram reconstruir a confederação e se armaram para resistir +aos Romanos, estes venceram a batalha de Leucopetra, junto de Corintho; +esta cidade foi queimada pelo consul Mummio, que commandava o exercito +de Roma; a Grecia foi declarada provincia romana, e o povo que a +habitava, e que tão brilhante papel representára na civilização do +mundo, foi absorvido na grande massa das populações sujeitas ao dominio +de Roma. Ficou a Grecia sendo governada por um pretor, nomeado +annualmente pelo senado romano. Só Athenas conservou até ao tempo do +imperador Vespasiano uma constituição republicana. + + + + +CAPITULO XI + +OS ROMANOS + + +A Italia, como a conheciam e designavam na Antiguidade, era constituida +pela peninsula alongada, existente no sul da Europa, que se prolonga com +direcção sueste entre os mares Adriatico e Tyrrheno e na extensão de 800 +kilometros. Tambem lhe pertencia a Sicilia (ilha d'ella separada por um +pequeno estreito), bem como a vasta planicie que se extende até á base +dos Alpes (que é atravessada pelo rio Pó e cuja metade superior era +conhecida pelo nome de Gallia Cisalpina). Aos pés das montanhas da +Sabina, iam incontrar-se as ferteis planicies do Lacio e da Etruria, +sobre as margens do rio Tibre. A alguma distancia da sua confluencia com +o Arno, passa este rio entre novas collinas, duas das quaes--o Janiculo +e o Vaticano--dominam a sua margem direita e as outras estão +sobranceiras á esquerda. Foi alli que se edificou Roma. + +Durante muito tempo, e apezar da preponderancia que a população e os +estabelecimentos do Lacio adquiriram, conservou-se a peninsula dividida +em diversas nacionalidades, estabelecidas nas seguintes regiões do +territorio; Liguria, Etruria, Campania, Lucania, Apulia, Samnio, Umbria, +etc. A unidade politica da Italia peninsular sómente veio a realizar-se +depois de um grande numero de tentativas e de esforços continuos e +pertinazes de Roma, para vencer as nacionalidades autonomas locaes, que +eram muito ciosas dos seus direitos o da sua independencia. + +Roma deve ter sido primitivamente uma colonia de Alba-Longa, cidade que +pertencia á confederação do Lacio. Ignora-se, porêm, ao certo como se +fundou, quaes os elementos a que deveu origem, e as circumstancias que +se deram nos seus primeiros tempos. A historia verdadeira da sua +primeira epocha é ainda hoje ignorada, porque como historia verdadeira +não pode considerar-se a collecção de fabulas e de tradições +maravilhosas e inverosimeis, que antigos historiadores colheram das +lendas e das crendices populares. + +A historia dos septe reis de Roma passa por ser uma lenda em que +figuram: 1.º rei, Romulo, que com seu irmão Remo edificou no monte +Palatino a cidade de Roma; 2.º rei, Numa, monarcha religioso inspirado +pela nympha Egeria; 3.º rei, Tullo Hostilio, que destruiu Alba-Longa, +depois da guerra entre Horacios e Curiacios; 4.º rei, Anco Marcio, que +foi o fundador de Ostia; 5.º rei, Tarquinio o _Antigo_, vencedor das +cidades latinas do Tibre superior; 6.º rei, Servio Tullio, o legislador, +amigo do povo; 7.º rei, Tarquinio o _Soberbo_, tyranno abominavel que +foi expulso pelos Romanos, sendo com essa expulsão abolida a realeza. + +Contam os antigos historiadores nos seguintes termos a fabula da +fundação de Roma. Romulo e Remo eram filhos do deus Marte e de Rhea +Silvia (filha de um rei de Alba), que fôra feita vestal (para não poder +casar nem ter descendencia) por seu tio Amulio que derrubou seu pae do +throno. Sabendo Amulio do nascimento das duas creanças, mandou-as lançar +ao Tibre; mas a pessoa incarregada de as deitar ao rio, por compaixão +deixou-as na margem, d'onde um pastor as recolheu, sendo ellas, segundo +uns, amamentadas por uma loba, e segundo outros pela mulher do pastor, +que dizem se chamava _Lupa_ (Loba). + +Quando chegaram a homens, Romulo e Remo reuniram grande numero de +aventureiros, vagabundos e descontentes; e com elles tiraram o throno a +Amulio, restituindo-o a seu avô materno Numitor, que d'elle havia sido +desapossado. Feito isto, foram fundar uma cidade no sitio em que haviam +sido creados, e essa cidade foi Roma. Passou-se isto no anno 753 +antes de Christo. + +Romulo mandou matar a Remo com o pretexto de que este, saltando por um +vallado (que foi a primeira muralha de Roma), pretendêra zombar d'elle. +Povoou a nova cidade com homens dos povos vizinhos que a si attrahiu; e, +como não houvesse mulheres para com elles casarem, mandou fazer umas +festas publicas, para as quaes convidou os Sabinos, e ás quaes +concorreram estes em grande numero com suas familias. Em meio dos +festejos os Romanos roubaram as mulheres aos Sabinos, fazendo-os fugir. +Ao rapto das Sabinas seguiu-se uma guerra entre os dois povos, a qual +não teve grande duração, porque as proprias raptadas, então já casadas, +intervieram para fazer a paz entre os maridos e os paes e irmãos. + +A fabula narrada como causa da expulsão de Tarquinio o Soberbo e da +abolição da realeza em Roma é a seguinte. Contam que tendo Sexto +Tarquinio (filho do rei) injuriado em seu pudor a Lucrecia (mulher do +nobre Collatino), esta convocára todos os seus parentes e os outros +nobres da cidade para lhes pedir vingança e em seguida se suicidára. +D'ahi resultou uma revolução, capitaneada por Collatino e por Lucio +Junio Bruto, sendo expulso Tarquinio, abolida a realeza e estabelecida a +fórma republicana. Esta revolução foi toda feita pelos patricios, e por +isso a republica ficou nas mãos d'elles e com feição aristocratica. O +governo foi confiado a dois consules, sendo os primeiros os dois +auctores da deposição de Tarquinio, Bruto e Collatino. Refere-se este +acontecimento ao anno 509 antes de Christo. + +Tiveram pouco depois os Romanos que sustentar uma guerra contra +Parsenna, rei da Etruria, que os atacou para restabelecer no poder a +Tarquinio. O exercito de Persenna chegou a tomar o Janiculo e a acampar +junto dos muros de Roma, pretendendo reduzil-a pela fome; mas foi +repellido pelos Romanos com grande denodo, e Persenna veio depois a +tornar-se amigo e alliado de Roma. + +Os Tarquinios continuaram ainda a fazer guerra á republica até á morte +de Aruns (filho de Tarquinio) que succumbiu ás mãos de Bruto. Este fôra +ferido mortalmente por Aruns e, concitando todas as suas forças e +energia, matou-o, cahindo sem vida sobre o seu cadaver. + +Annos depois Manlio (genro de Tarquinio) suscitou contra Roma a guerra, +chamada dos Latinos. Estes chegaram a approximar-se da cidade com um +exercito numeroso. O povo romano recusava-se a tomar as armas se os +nobres ou patricios, que os opprimiam, não o desobrigassem das suas +dividas e não lhe tornassem melhor o viver. Representava que era elle +que fazia a guerra, mas que as vantagens e as honras eram todas para os +ricos e nobres. Estes promptificaram-se a adiar a exigencia das dividas, +mas não a dál-as por findas. Em tal apuro, por consenso mutuo, creou-se +um magistrado supremo, denominado _dictador_, com poder absoluto por +seis mezes e incarregado de conciliar todos os interesses. Para esse +cargo foi escolhido Largio que, fazendo-se acompanhar de 24 lictores +armados de machados, apparecia em toda a parte, obrigando todos a intrar +na ordem, sob ameaça de morte. O povo amedrontou-se perante esta +energia, fez-se o alistamento, e o exercito marchou contra os Latinos. +Estes pediram um armisticio, que lhes foi concedido; e Largio +exonerou-se da dictadura. Reappareceram mais tarde os Latinos; mas Aulo +Posthumio, nomeado dictador, foi ao seu incontro, vencendo-os n'uma +batalha decisiva em que ficaram mortos Tito e Sexto, filhos de Tarquinio +o Soberbo. + +Tendo depois os Romanos guerras com os Volscos e os Equos, foi +Cincinnato incarregado do commando do exercito. O lictor que ia dar-lhe +noticia da nomeação, incontrou-o com a charrua a arar o campo. +Cincinnato largou a cultura, poz-se á frente do exercito, e, em quinze +dias, derrotou os inimigos. Alcançada a victoria, o heroe voltou ao +trabalho da sua cultura agricola, que deixára interrompido. Coriolano, +que se vira obrigado a sahir de Roma, em resultado de dissenções civis +entre os tribunos da plebe e os patricios, aos quaes aquelle pertencia, +lançou-se no partido dos Volscos e recomeçou com elles a guerra contra +os Romanos. Vencido, porêm, pelas supplicas de sua mulher e de sua mãe, +retirou-se e recolheu ao paiz dos Volscos que (segundo alguns) o +assassinaram. + +Seguiu-se a guerra contra os Veientes,--um dos povos etruscos, inimigo +eterno dos Romanos, que todos os annos renovava as hostilidades. Os +Fabios, familia nobre de Roma, offereceram á republica um concurso +poderoso e extraordinario, fazendo por si sós uma guerra particular +contra os Veientes; mas foram horrivelmente derrotados, ficando os +trezentos patricios, que compunham este pequeno exercito, todos mortos +junto a Cremera. Notaveis victorias vingaram, porêm, depois esta +derrota; differentes generaes romanos ganharam grandes batalhas e se +apoderaram das praças fortes do inimigo. Os Veientes eram tão poderosos +que, cercados na sua cidade, defenderam-se durante dez annos dos +Romanos, os quaes haviam jurado não voltar a Roma sem haverem tomado +a valorosa povoação dos Veientes. O juramento cumpriu-se e a cidade foi +tomada. + +Por esse tempo Roma tratou de aperfeiçoar as suas instituições e a sua +legislação, adoptando algumas das leis vigentes na Grecia. Crearam-se os +_decemviros_, para exercerem o poder em vez dos dois consules. As leis +que adoptaram de Athenas foram pelos Romanos gravadas em doze tábuas, o +que lhes originou a designação de _leis das doze tábuas_. Teve pouca +duração a instituição dos decemviros, que foi por sua vez substituida +pela de dois consules. Esta substituição fez-se por exigencia do povo, +cançado da tyrannia dos decemviros e dos excessos dos nobres. O povo +ainda obteve outra victoria: estabeleceu-se que os consules tanto +pudessem ser eleitos entre os patricios como entre a plebe, e que se +pudessem fazer casamentos entre individuos de differentes classes sociaes. + +Seguiram-se outras guerras, de algumas das quaes tratámos atraz, em +differentes capitulos, a proposito dos outros diversos povos, como a de +Tarento, a de Pyrrho, a de Syracusa, as tres guerras punicas, a dos +Corinthios, e a da Hespanha, que os Romanos submetteram tambem. Todas +estas guerras tiveram como resultado dar a Roma uma vastissima dominação +no mundo. + +Assim, no anno 130 antes de Christo, dominava ella desde o littoral da +peninsula iberica até ao centro da Asia Menor. Estava sujeito ao seu +dominio quasi todo o antigo mundo. + +Mas a conquista de tão vastos e tão ricos paizes tinha tido sobre os +costumes dos Romanos uma influencia desastrosa. Tinham estes renunciado +á sua antiga simplicidade e tinham aberto as portas ao luxo. Os nobres +tinham-se tornado crapulosos e perdularios; o povo, accessivel á +venalidade. D'ali proveio a decadencia que a pouco e pouco produziu a +ruina da republica e da liberdade. + +Catilina, um nobre romano, eivado de todos os vicios da sua classe, +aproveitando-se da ausencia dos exercitos, que estavam na Asia +combatendo contra Mithridates, concebeu o negro plano da perda da +patria, tendo por cumplices alguns dos seus mais nobres compatriotas. +Incontrou porêm a opposição patriotica dos consules Cicero e Antonio; o +primeiro, nos seus eloquentes discursos, punha em evidencia as +conspirações do traidor e concitava contra elle o patriotismo da plebe; +o segundo marchou contra o exercito com que Catilina vinha, da Etruria +sobre Roma e desbaratou-o. Catilina foi morto no combate. + +Novas calamidades esperavam, porêm, a republica romana. No meio do +excessivo poderio e da dissolução dos costumes, quando Roma celebrava as +victorias alcançadas por Pompeu no Oriente, a grande influencia e o +grande prestigio d'este general despertou a inveja de outros generaes e +outros nobres ambiciosos, como Metello, Crasso e Cesar. + +Aspirando Cesar a ganhar poder, Crasso a augmentar o seu, e Pompeu a +conservar o que possuia, facil foi aos tres ambiciosos combinarem-se +para se apoderarem da republica. Distribuindo elles a sua força commum, +Cesar assenhorou-se da Gallia, Crasso da Asia, e Pompeu de Hespanha; +cada um tinha um grande exercito sob as suas ordens, por fórma que o +imperio do mundo ficou assim dividido entre aquelles tres dominadores. +Mas a concordia que apparentavam entre si era unicamente o resultado do +receio que cada um d'elles tinha dos outros. Morto Crasso, bem depressa +se rompeu a harmonia entre Cesar e Pompeu. Este, apoiado pelo senado, +intimou Cesar para que abandonasse o seu governo e o commando do seu +exercito. Cesar, em vez de obedecer, marchou sobre Roma e fez sabir +d'ahi Pompeu e todos os seus partidarios. Seguia-os até á Hespanha, onde +bateu todos os logar-tenentes de Pompeu, e passou depois á Grecia, onde +se incontrou com este na Thessalia, perto de Pharsalia. Vieram ás mãos +os exercitos de um e outro, a victoria ficou indecisa; mas, tendo-se +afastado Pompeu do campo,--o seu exercito, perdendo a força moral, foi +completamente destroçado. + +Pompeu viu-se obrigado a refugiar-se no Egypto, onde foi assassinado no +momento de desimbarcar, por ordem de Ptolomeu. Depois de em Africa bater +Juba, que sustentára o partido de Pompeu, e de derrotar os filhos d'este +em Hespanha,--Cesar recolheu a Roma, onde foi recebido com grande +ovação, e onde sobre sua cabeça foram accumuladas as maximas honras. + +Bem depressa se urdiu, porêm, uma conspiração contra a sua vida. Foram +auctores d'ella Bruto, Cassio e outros patricios; e Cesar morreu sob o +punhal de Bruto. + +Livres os Romanos de Pompeu e de Cesar, parecia que iam recuperar a +antiga liberdade; mas Sexto Pompeu, reclamando os bens de seu pae, +tornou-se o flagello do mar; Octavio, procurando vingar Cesar, soprou a +guerra na Thessalia, e Antonio amotinou o povo contra os assassinos de +Cesar, fazendo com que elles fossem expulsos de Roma. + +Antonio, Lepido e Augusto constituiram-se em triumvirato para vingar a +morte de Cesar. Octavio e Antonio marcharam contra Bruto e Cassio, +que sustentavam o senado, e deixaram Lepido em Roma. Incontraram-se os +dois exercitos inimigos na Thessalia; a victoria esteve a principio +indecisa; mas depois Cassio, sendo repellido, persuadiu-se de que o +mesmo tinha acontecido a Bruto e suicidou-se. Isso produziu a derrota de +Bruto, que tambem se matou, para não cahir nas mãos dos inimigos. + +A harmonia entre os triumviros não se manteve muito tempo. Lepido foi +desterrado para uma ilha, onde morreu. Antonio e Augusto desavieram-se e +romperam hostilidades, acabando a contenda pela batalha de Accio. +Antonio, vencido, suicidou-se; e o Egypto foi reduzido a uma provincia +romana. + +Doze annos depois de se haver constituido o triumvirato, viu-se Octavio +senhor absoluto do grande imperio romano. Depois de ter estabelecido a +paz na terra e no mar, fechou o templo de Jano, em signal de paz geral. +Senhor de tudo, tendo nas suas mãos a força militar, investido nas +funcções de todas as magistraturas do estado, apezar de conservar as +formulas republicanas, tomou o titulo de imperador, com o nome de +_Augusto_. Pouco depois, declarou que ia intregar os poderes nas mãos do +senado e do povo; mas, tendo disposto convenientemente as coisas, obteve +que, em nome do bem publico, lhe conservassem o poder por mais dez annos. + +Não tendo filhos que pudessem ser herdeiros do imperio, declarou como +tal a Tiberio Nero, que adoptou por filho. Deu o commando de oito +legiões, inviadas ao Rheno, a Germanico Cesar, filho de Druso, e fez com +que Tiberio o adoptasse. Veio a morrer na edade de 76 annos. + +Foi no seu reinado que, no anno 753 da fundação de Roma, nasceu Jesus +Christo em Bethlem, cidade da Palestina. + +O imperio romano tentou continuar o dominio universal. Succederam-se uns +aos outros os imperadores, muitos dos quaes foram tyrannos, e muitos +morreram assassinados. O imperio foi successivamente infraquecendo. Tres +invasões lhe deram o ultimo golpe: a dos Wisigodos, a dos Vandalos e a +dos Hunos. Por morte do imperador Theodosio, o imperio fôra dividido +entre seus dois filhos: Arcadio teve em partilha o imperio do Oriente; +Honorio o do Occidente. Foi este o que cahiu perante a invasão +d'aquelles Barbaros, no anno 476 da era christan, fechando com esse +acontecimento a Historia Antiga. O imperio do Oriente logrou acompanhar +ainda o periodo historico da Edade-Média. + +FIM + + + + +Os Mysterios da Inquisição + +POR + +F. Gomes da Silva + +Obra illustrada a côres + +POR + +MANUEL DE MACEDO E ROQUE GAMEIRO. + +Sob o titulo *Os Mysterios da Inquisição* condensam-se variadissimos +factos historicos, desentranham-se os horrores d'epochas passadas, +escalpellam-se figuras d'outros seculos, investigam-se particularidades +estupendas, encadeiam-se acontecimentos dispersos e tenebrosos, +enaltecem-se as grandes virtudes, faz-se rebrilhar a verdade, e põem-se +em relevo todas as personagens que entram n'este grande drama, em que +vibram commoções da maior intensidade e affectos do mais exaltado amor. + +O romance *Os Mysterios da Inquisição* constará de 3 volumes de grande +formato. A distribuição será feita semanalmente em fasciculos de 3 +folhas ou 24 paginas com uma gravura a côres pelo preço de 60 réis, ou +em tomos de 15 folhas ou 120 paginas com 5 gravuras por 300 réis. + +Para as provincias a distribuição é feita em tomos de 300 réis ou em +fasciculos quinzenaes de 48 paginas e 2 gravuras por 120 réis. + +_Precioso brinde a todos os Srs. assignantes_ + +Uma magnifica estampa a côres, medindo 0,57x0,44 + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Historia Antiga, by Unknown + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK HISTORIA ANTIGA *** + +***** This file should be named 29529-8.txt or 29529-8.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + http://www.gutenberg.org/2/9/5/2/29529/ + +Produced by M. Silva + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. 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You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Historia Antiga + +Author: Unknown + +Release Date: July 28, 2009 [EBook #29529] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK HISTORIA ANTIGA *** + + + + +Produced by M. Silva + + + + + +</pre> + + +<div style="border: double 10px #000; padding: 1em; text-align: center;"> +<span class="pn">{1}</span> + +<p style="font-size: 0.8em;">PROPAGANDA DE INSTRUCÇÃO<br> +PARA<br> +Portuguezes e Brazileiros</p> + +<p> </p> + +<p style="font-size: 1.4em;">B<small>IBLIOTHECA DO</small> +P<small>OVO</small></p> + +<p>E DAS ESCOLAS</p> + +<p style="font-size: 3em;">HISTORIA ANTIGA</p> + +<p style="font-size: 0.8em;">CADA VOLUME 50 RÉIS</p> + +<p style="font-size: 0.8em;">TERCEIRO ANNO—OITAVA SERIE</p> + +<p +style="font-size: 0.8em; margin: 10%; text-align: justify; text-indent: 1em; border: solid 1px #000; padding: 1em;">Cada +volume abrange 64 paginas, de composição cheia, edição estereotypada,—e +fórma um tratado elementar completo n'algum ramo de sciencias, artes ou +industrias, um florilegio litterario, ou um aggregado de conhecimentos uteis e +indispensaveis, expostos por fórma succinta e concisa, mas clara, +despretensiosa, popular, ao alcance de todas as intelligencias.</p> + +<p>LISBOA<br> +SECÇÃO EDITORIAL DA COMPANHIA NACIONAL EDITORA<br> +Adm. Justino Guedes<br> +Largo do Conde Barão, 50<br> +Agencias: PORTO—Largo dos Loyos, 47,1.º<br> +RIO DE JANEIRO—R. da Quitanda, 38<br> +1900<br> +NUMERO 58<span class="pn">{2}</span></p> +</div> + +<p> </p> + +<h2><a name="SECTION0010">INDICE</a> </h2> +<ul class="TofC"> + <li><a name="tex2html18" href="#SECTION0021">INTRODUCÇÃO</a> </li> + <li><a name="tex2html19" href="#SECTION0022">CAPITULO I—OS HEBREUS</a> + </li> + <li><a name="tex2html20" href="#SECTION0023">CAPITULO II—OS + EGYPCIOS</a> </li> + <li><a name="tex2html21" href="#SECTION0024">CAPITULO III—OS ASSYRIOS E + BABYLONIOS</a> </li> + <li><a name="tex2html22" href="#SECTION0025">CAPITULO IV—OS + PHENICIOS</a> </li> + <li><a name="tex2html23" href="#SECTION0026">CAPITULO V—OS + CARTHAGINEZES</a> </li> + <li><a name="tex2html24" href="#SECTION0027">CAPITULO VI—OS SYRIOS</a> + </li> + <li><a name="tex2html25" href="#SECTION0028">CAPITULO VII—OS PERSAS</a> + </li> + <li><a name="tex2html26" href="#SECTION0029">CAPITULO VIII—OS + INDIOS</a> </li> + <li><a name="tex2html27" href="#SECTION00210">CAPITULO IX—OS CHINS</a> + </li> + <li><a name="tex2html28" href="#SECTION00211">CAPITULO X—OS GREGOS</a> + </li> + <li><a name="tex2html29" href="#SECTION00212">CAPITULO XI—OS + ROMANOS</a> </li> +</ul> + +<p> </p> + +<table align="center" style="font-size: 0.8em;" summary="errata"> + <tbody> + <tr> + <th colspan="3">ERRATAS IMPORTANTES</th> + <td></td> + </tr> + <tr> + <td>Pag.</td> + <td>Linha</td> + <td>Onde se lê</td> + <td>Leia-se</td> + </tr> + <tr> + <td>11</td> + <td>36</td> + <td>elementos</td> + <td>alimentos</td> + </tr> + <tr> + <td>12</td> + <td>18</td> + <td>Amvrão</td> + <td>Amrão</td> + </tr> + <tr> + <td>»</td> + <td>27</td> + <td>Egypto</td> + <td>Egypto, por meio</td> + </tr> + <tr> + <td>14</td> + <td>26</td> + <td>peccado,</td> + <td>peccado,—</td> + </tr> + <tr> + <td>»</td> + <td>42</td> + <td>altar,</td> + <td>um altar</td> + </tr> + <tr> + <td>»</td> + <td>44</td> + <td>estão</td> + <td>estavam</td> + </tr> + <tr> + <td>15</td> + <td>38</td> + <td>incluindo</td> + <td>incluido</td> + </tr> + <tr> + <td>22</td> + <td>6</td> + <td>de que</td> + <td>do que</td> + </tr> + <tr> + <td>33</td> + <td>19</td> + <td>moisaica</td> + <td>moysayca</td> + </tr> + <tr> + <td>52</td> + <td>31</td> + <td>tomam</td> + <td>tomaram</td> + </tr> + <tr> + <td>53</td> + <td>6</td> + <td>impervas</td> + <td>impervias</td> + </tr> + <tr> + <td>57</td> + <td>33</td> + <td>notas</td> + <td>novas</td> + </tr> + <tr> + <td>58</td> + <td>17</td> + <td>seis</td> + <td>reis</td> + </tr> + </tbody> +</table> + +<p><span class="pn">{3}</span></p> + +<div id="corpo"> +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0020">HISTORIA ANTIGA</a> </h1> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0021">INTRODUCÇÃO</a> </h1> + +<p>L<small>IMITES DA </small>H<small>ISTORIA +</small>A<small>NTIGA—</small>S<small>UA +DIVISÃO—</small>T<small>EMPOS PRE-HISTORICOS—</small>O <small>HOMEM +PRE-HISTORICO—</small>E<small>DADE DE PEDRA—</small>E<small>DADE DE +BRONZE—</small>R<small>AÇAS HISTORICAS OU +PRIMITIVAS—</small>O<small>S POVOS DA +</small>A<small>NTIGUIDADE</small></p> + +<p> </p> + +<p>Conforme ao que dissémos no tratadinho de <em>Historia Universal</em> (vol. +XLVI da <em>Bibliotheca do Povo e das Escolas</em>), começa a <em>Historia +Antiga</em> desde as mais remotas epochas de que possa haver-se conhecimento e +prolonga-se até ao seculo <small>V</small> da era christan.</p> + +<p>N'ella se comprehende a epocha da phase brilhante dos povos orientaes, a +qual mais tarde esmoreceu perante a supremacia que vieram a adquirir as +civilizações classicas—primeiro a grega e depois a romana—na +Europa, comparativamente com os poderosos e vastos imperios da Asia e do norte +da Africa. O longo periodo da Historia Antiga fecha com o desmoronamento do +imperio romano.</p> + +<p>A <em>Historia Antiga</em> pode dividir-se em tres periodos, cada um dos +quaes se divide por sua vez em epochas principaes.</p> + +<p>Os tres periodos são;—o dos <em>tempos primitivos</em>;—o dos +<em>tempos mythologicos</em>;—e o dos <em>tempos historicos</em>.</p> + +<p>O primeiro periodo comprehende duas epochas principaes: a da <em>origem do +homem</em>, e a do <em>diluvio</em> e da <em>dispersão dos homens</em>, segundo +a tradição biblica.</p> + +<p>No segundo periodo notam-se tres epochas principaes que são:—a dos +<em>tempos idolatras</em>, caracterizada pela fundação dos imperios da China, +da Asia, do Egypto, e da Grecia, e pela<span class="pn">{4}</span> tendencia +que os povos tinham a elevar á categoria de deuses os seus primeiros +soberanos;—a dos <em>tempos heroicos</em>, em que appareceram grandes +conquistadores, fundadores de cidades, e outros homens notaveis, que os povos, +então já mais adeantados, se limitaram a considerar na categoria de heroes ou +semi-deuses;—a dos <em>tempos poeticos</em>, ou epocha em que os +prophetas e os poetas exerceram uma acção efficaz sobre o progresso da +civilização, e deram a fórma poetica ás tradições e á legislação.</p> + +<p>No periodo dos <em>tempos historicos</em> (aquelle de que possuimos noções +mais seguras e mais positivas) são seis as epochas principaes, a saber:—a +<em>epocha legislativa</em>, em que sobresaem quatro personagens mais notaveis: +Lycurgo, Numa, Solon e Confucio;—a <em>epocha da grande gloria da +Grecia</em>, na qual esta nação teve a supremacia da civilização na Europa, +então começada a aproveitar pela expansão progressiva do Oriente;—a das +<em>conquistas dos Romanos</em>, que se substituiram aos Gregos na dominação e +na influencia, e alargaram consideravelmente a colonização até ao occidente da +Europa;—a das <em>dissenções intestinas da republica romana</em>;—a +do <em>grande explendor do imperio romano</em>;—a da <em>decadencia do +mesmo imperio</em>, cujo desmoronamento põe termo á Historia Antiga, e abre com +a invasão dos Barbaros do norte o periodo da Historia da Edade-Média.</p> + +<p>Reina ainda bastante incerteza na sciencia da Historia ácêrca da verdadeira +epocha do apparecimento do homem sobre a superficie da Terra. Por muito tempo +foi geralmente acceito que, se tal epocha não era exactamente contemporanea das +mais antigas civilizações orientaes de que temos noticia, pelo menos não era +anterior ao actual periodo geologico, e que o homem sómente havia apparecido +pela primeira vez n'um periodo relativamente recente e já contemporaneo da +fauna e da flóra actuaes, cêrca do logar em que as tradições de differentes +povos fazem demorar o berço da especie humana.</p> + +<p>Os descobrimentos da Geologia, sciencia moderna mas já abundante em +resultados definidos, têem, porêm, tirado o valor áquella noção e demonstram +ser mais antiga a existencia do homem na superficie da Terra. Com os elementos +que aquella sciencia lhe fornece, a Archeologia Pre-historica, de creação muito +recente mas de rapidos progressos, tem chegado a adquirir o conhecimento de que +o homem existia desde uma epocha muitos milhares de annos anterior á actual, +tendo até chegado a ganhar n'essas remotissimas edades um certo gráu de<span +class="pn">{5}</span> cultura, traduzido no exercicio de industria, de +commercio, e ainda n'outras manifestações de actividade.</p> + +<p>A existencia do homem primitivo, ou do <em>homem pre-historico</em>, ou de +raças humanas de que pela Historia propriamente dita não temos conhecimento +algum, é-nos revelada pelo descobrimento de instrumentos de pedra (utensilios +mais ou menos grosseiramente fabricados com aquelle mineral, e affeiçoados a +differentes usos) e pelo de fragmentos de peças de loiça, de armas e de +differentes outros utensilios de uso domestico,—tudo em camadas de +formação anterior ao actual periodo geologico.</p> + +<p>Estes vestigios evidentes do homem pre-historico incontram-se nas excavações +feitas nas camadas de terreno correspondentes ao periodo que a Geologia +denomina <em>quaternario</em>, periodo que é o immediatamente anterior ao +actual. Mais recentes descobrimentos, porêm, parecem provar que a existencia do +homem é ainda anterior áquelle periodo. Excavações feitas em terrenos do +periodo <em>terciario</em> tendem effectivamente a revelar a existencia do +homem durante a formação dos mesmos terrenos. É no terreno denominado +<em>mioceno</em> que se incontram os vestigios que levam a essa conclusão, e +d'ahi provêm o nome de <em>homem mioceno</em> ou <em>homem terciario</em> ao +homem que se julga ter existido no referido periodo geologico<a +name="tex2html1" href="#foot257"><sup>[1]</sup></a>.</p> + +<div class="rodape"> +<p><a name="foot257" href="#tex2html1"><sup>[1]</sup></a> Veja-se o livrinho de +<em>Geologia</em> (vol. XXXI da <em>Bibliotheca do Povo e das Escolas</em>).</p> +</div> + +<p>Não acceitam ainda todos os archeologos a existencia do homem terciario; mas +a opinião que a defende vai cada dia ganhando mais terreno. O congresso de +Anthropologia e de Archeologia pre-historica, que em 1880 se reuniu em Lisboa, +tratou essa questão e contribuiu muito para a sua resolução definitiva, sendo +importantes os dados que para isso forneceram as excavações feitas no nosso +paiz e os achados n'ellas realizados pelo eminente geologo portuguez Carlos +Ribeiro, ha pouco fallecido.</p> + +<p>A Archeologia Pre-historica divide o periodo <em>quaternario</em>, sob o +ponto-de-vista da existencia de vestigios da especie humana, em duas +epochas:—a <em>edade paleolithica</em>, ou da pedra lascada;—e a +<em>edade neolithica</em>, ou da pedra polida. A substancia de que são +fabricados os instrumentos achados, e a perfeição relativa do seu fabrico, são +os fundamentos que fornecem os caracteres distinctivos das duas edades.</p> + +<p>Á edade paleolithica pertencem armas e instrumentos de silex, principalmente +machados, talhados toscamente pela separação<span class="pn">{6}</span> de +lascas tiradas pela percussão. Estes instrumentos tinham evidentemente por fim +o cortar, e alguns, de pontas mais aguçadas, o de furar. Alguns ha, com fórma +similhante á das raspadeiras, que deviam servir para preparar as pelles de +animaes, com que se vestiam os primeiros homens. Os vestigios correspondentes a +esta epocha pre-historica fazem crer que o modo de viver da especie humana foi +então de extrema simplicidade, que eram desconhecidos os animaes domesticos e a +agricultura, que os homens vagueavam pelas florestas virgens, alimentando-se +com os fructos silvestres e com o producto da caça, e abrigando-se nas cavernas +naturaes, cuja posse ás vezes se viam obrigados a disputar aos animaes ferozes. +A alimentação dos que viviam á beira do mar ou dos lagos consistia em peixe e +marisco. O estado social devia ser o mais rudimentar possivel; apenas se pode +considerar n'aquella epocha esboçado o viver da familia. Aquelle modo de viver +era por certo ainda mais simples e primitivo do que o dos actuaes selvagens da +Nova Caledonia.</p> + +<p>Um pouco mais perfeito foi de certo o viver na edade neolithica. As armas e +os utensilios d'aquella epocha são distinctos dos da edade paleolithica por +certas particularidades de fórma e pela maior perfeição do trabalho, a qual já +denuncia um mais adeantado estado de educação, havendo entre os fragmentos de +loiça e entre os objectos de ornato incontrados alguns que revelam uma certa +industria, ainda rudimentar, mas já com algum desinvolvimento. Julga-se que +n'estas epochas se practicou já o commercio, por se encontrarem n'algumas +localidades substancias que eram produzidas em sitios distantes, assim como +vestigios da existencia de officinas levam a crer que effectivamente a +industria se delineava já com feições pronunciadas.</p> + +<p>Aos ultimos tempos da edade neolithica pertencem os chamados +<em>kjoeckkenmoeddinger</em> («restos de cozinha»), que são grandes +aglomerações de conchas de differentes mariscos, misturadas com carvão, +incontradas nas costas da Dinamarca, e tambem mais recentemente no valle do +Tejo, junto a Mugem, pelo já citado geologo Carlos Ribeiro. Pertencem tambem á +mesma epocha as <em>palafittas</em>, ou povoações lacustres, achadas pela +primeira vez no lago de Zurich em 1853, e que consistem em reuniões de cabanas +junto das margens dos lagos, construidas sobre base de estacaria mergulhada na +agua. Nas <em>palafittas</em> incontram-se notaveis vestigios, que provam o +relativo adeantamento da especie humana n'aquelles tempos. É assim que a +existencia de cereaes demonstra que já havia<span class="pn">{7}</span> +agricultura; a de tecidos, que a industria se tinha adeantado; a de fragmentos +de animaes domesticos, um viver social em via de progresso.</p> + +<p>A existencia de utensilios de metal nas <em>palafittas</em> indica que a +epocha d'estas se prende chronologicamente ao começo dos tempos historicos, ou +pelo menos ao periodo que precedeu a aurora das mais antigas civilizações do +Oriente. Começa n'esse ponto a <em>edade de bronze</em>, ou aquella em que as +armas e os diversos utensilios, até então construidos exclusivamente de pedra, +começam a ser substituidos por outros fabricados de bronze.</p> + +<p>A <em>edade de bronze</em> variou muito em duração nos diversos paizes da +Europa, sendo n'alguns povos uma epocha inteiramente historica, e pertencendo, +pelo que respeita a outros, á Archeologia Pre-historica. No seu todo deve +considerar-se como um periodo de transição entre os tempos pre-historicos e os +tempos historicos.</p> + +<p>Os povos que figuram na Historia da Antiguidade provêm de uma das tres raças +<em>semitica</em>, <em>chamitica</em> e <em>japhetida</em> (mais geralmente +denominada <em>aryana</em> ou <em>indo-européa</em>), as quaes por isso se +dizem <em>raças historicas</em>. A existencia d'estes tres troncos primitivos é +revelada pela tradição biblica e confirmada pelas modernas investigações +ethnographicas. Quando, decorrido longo periodo depois da creação do homem, +Deus, offendido pelos vicios que haviam lavrado em toda a especia humana, +resolveu castigál-a com o diluvio, apenas quiz que escapasse Noé, que era +justo, com sua familia. Terminado aquelle cataclismo, só os tres filhos d'elle +ficaram incumbidos de povoar o mundo, e cada um d'elles—Sem, Cham e +Japhet—indo estabelecer-se em pontos differentes deu origem a uma raça. +Sem ficou na Asia e foi o pai da raça semitica; Cham passou á Africa e originou +a raça chamitica; e finalmente Japhet, estabelecendo-se no oriente da Europa, +deu origem á raça japhetida, ou aryana, ou indo-europêa, assim denominada, +porque na sua expansão ulterior se estendeu até ás Indias.</p> + +<p>A raça semitica—(ou os semitas)—apparece-nos, no decorrer da +Historia Antiga, povoando um vasto territorio cingido de um lado peia alta +Mesopotamia e pela parte meridional da Arabia, e do outro pelas costas do +Mediterraneo e pelo rio Tigre. Eram d'esta raça os habitantes do imperio da +Assyria e de parte da Babylonia, os Hebreus, os Lydios e parte das populações +da Syria. Presentemente esta raça está representada pelos Judeus e pelos +Arabes. A sua importancia historica<span class="pn">{8}</span> deriva +principalmente das religiões que n'ella tiveram origem e do desinvolvimento a +que estas chegaram. N'ella nasceram a antiga religião moysaica, o christianismo +e o mahometanismo. Na Edade-Média um ramo d'esta raça—os Arabes—, +invadindo a Europa, trouxeram-lhe grande copia da sciencia grega, contribuindo +assim para a civilização d'esta parte do mundo.</p> + +<p>A raça chamitica—(ou os chamitas)—povoou na Antiguidade a +Ethiopia, o Egypto e a Nubia, e incorporou-se tambem na população de Babylonia +e da Arabia meridional. Na actualidade está representada pelos <em>fellahs</em> +do Egypto, pelos habitantes da Nubia, pelos <em>abexins</em> e pelos +<em>tuaregs</em>.</p> + +<p>A raça aryana—os aryas, os indo-europeus—foi representada na +Antiguidade pelos Indus, Persas, Romanos e Gregos; e actualmente está-o sendo +pelos descendentes d'estes povos e pelos Germanos e Slavos. Os povos +indo-europeus são os mais importantes sob o ponto-de-vista historico; extendem +hoje o seu <em>habitat</em> desde o norte da Europa até ás margens do Ganges; é +no meio d'elles que se passa o grande movimento do progresso social, e a sua +expansão colonizadora extende-se até aos confins do Novo Mundo, para onde têem +transplantado as maravilhas do progresso e os mais perfeitos methodos de +cultura intellectual.</p> + +<p>Ha nas tres raças historicas de que temos falado um grande numero de +variedades, devidas, não só a cruzamentos, mas tambem a modificações filhas da +differente acção dos climas e da diversa influencia do meio.</p> + +<p>O estudo d'essas differentes variedades leva a uma classificação differente +da que sob o ponto-de-vista historico fizemos, e baseada em caracteres +anatomicos que são do dominio da Anthropologia.</p> + +<p>Os principaes povos que figuram na Historia da Antiguidade são: os Hebreus, +os Egypcios, os Assyrios e Babylonyos, os Phenicios, os Carthaginezes, os +Syrios, os Persas, os Indios, os Chins, os Gregos e os Romanos. De cada um +d'elles trataremos em capitulo especial.<span class="pn">{9}</span></p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0022">CAPITULO I<br> +OS HEBREUS</a> </h1> + +<p>A historia dos Hebreus confunde-se no seu principio com as mais antigas +tradições da primitiva edade historica do homem. A mais antiga fonte em que +ella se estuda é o <em>Genesis</em>, no qual se acham compendiadas as tradições +da creação do homem e da primitiva dispersão das raças historicas, em que +primeiro se dividiu a familia humana.</p> + +<p>Segundo o <em>Genesis</em>, Deus, depois de ter creado o mundo, separado a +terra dos mares, e povoado aquella de plantas e de animaes, creou o primeiro +homem, que teve o nome de Adão, e creou-lhe logo depois para companheira a +primeira mulher, que se chamou Eva. D'este primeiro par nasceram tres filhos: +Caim, Abel e Seth. O primeiro, que se deu á cultura dos campos, matou por +ciumes a seu irmão Abel, expatriando-se em seguida e indo fundar a cidade de +Henochia, que tomou tal nome do primeiro filho (Henoch) do seu fundador. Abel +exercêra o mister de pastor. Seth, o terceiro filho de Adão, teve numerosa +descendencia, na qual se tornou notavel Noé, pelas circumstancias que vamos +referir.</p> + +<p>Em tal devassidão haviam cahido os homens, que Deus, como que arrependido de +os haver creado, resolveu exterminál-os; mas, como Noé e sua familia +conservavam vida virtuosa, no meio do viver vicioso do resto da humanidade, +determinou tambem Deus fazer excepção a respeito d'elles. Mandou por isso a Noé +que construisse uma arca, na qual se mettesse com a sua familia e com um certo +numero de animaes de todas as especies; e, feito isso, mandou á terra o +diluvio, que tudo alagou e em que pereceram todos os homens e animaes, excepto +os que se continham na arca, a qual fluctuava na superficie da agua.</p> + +<p>Terminado o diluvio, que durou quarenta dias, e tendo baixado as aguas e +descoberto de novo a superficie da terra, poisou por fim a arca sobre o monte +Ararat, na Armenia. Sahiu d'ella Noé, com sua familia e com os differentes +animaes, e começou a cultivar a terra. Foi elle o primeiro que cultivou a +vinha, fabricou vinho e com este se embriagou.</p> + +<p>Falavam a principio todos os homens a mesma linguagem; mas o seguinte +acontecimento deu origem a que entre elles<span class="pn">{10}</span> se +multiplicassem as linguas. Tendo-se estabelecido e havendo alargado a sua +occupação nas planicies de Sennaar, entre o Tigre e o Euphrates, tornaram-se +orgulhosos do seu valor e poder, e conceberam o plano de construir uma torre, +que chegasse ao céu. Começaram a pôr em practica o seu temerario intento; mas +Deus, para castigar tamanha ousadia, confundiu-lhes as linguagens, por fórma +que elles, deixando de comprehender-se uns aos outros, tiveram que abandonar a +obra e que dispersar-se. A torre ficou, pois, por construir-se e denominou-se +<em>Babel</em>, vocabulo que quer dizer: <em>confusão</em>. Foi aquella +dispersão que deu origem á separação das tres raças, <em>semitica</em>, +<em>chamitica</em> o <em>japhetida</em>, dos nomes dos tres filhos de +Noé—Sem, Cham e Japhet.</p> + +<p>Pouco a pouco se extinguíra na memoria dos homens a sua historia primitiva e +as licções e preceitos que n'essa historia se continham. Resolveu por isso o +Senhor escolher entre os descendentes de Sem uma familia, que houvesse de ser a +guarda e a depositaria das antigas crenças e tradições. Essa familia foi a de +Tharé, originaria de Ur (na Chaldéa), e que, por causa da falta de pastagens +para os gados, havia ido estabelecer-se na cidade de Haran (na Mesopotamia). +Foi alli que Deus revelou a Abrahão, filho do dito Tharé, a missão divina que +lhe destinára e como resolvêra constituil-o chefe da raça predestinada ou do +<em>povo escolhido</em>. Por mandado do Senhor fez Abrahão varias +peregrinações. O Senhor abençoou-o, prometteu-lhe grande descendencia e +disse-lhe que teria de sua mulher Sára, até então esteril, um filho,—o +que se realizou com o nascimento de Isaac.</p> + +<p>Deus, para experimentar a fé e a obediencia de Abrahão, ordenou-lhe que lhe +sacrificasse seu filho Isaac, ao que elle sem repugnancia se promptificou, +afastando-se para consummar tal sacrificio. Quando ía a descarregar o golpe, +Deus lh'o impediu, detendo-lhe o braço e dando-se por satisfeito com aquella +prova de obediencia.</p> + +<p>Isaac teve dois filhos, que foram Esaú e Jacob. Este ultimo, comquanto mais +novo, foi o que recebeu a benção do pae, que estava cego, e que foi inganado, +julgando que abençoava Esaú. Áquella benção, obtida subrepticiamente, por +conselhos e industria de sua mãe, Rebecca, e á qual estava annexo o cumprimento +das promessas que Deus fizera a Abrahão, deveu Jacob o herdar o patriarchado do +povo hebreu. Temendo, porêm, a vingança de Esaú, ausentou-se para a +Mesopotamia, onde, depois de servir por muitos annos a seu tio Labão, casou com +as duas filhas d'este, Lia e Rachel.<span class="pn">{11}</span></p> + +<p>Teve Jacob doze filhos, que são os doze patiarchas, cabeças e origens das +doze tribus do povo de Israel, nome que tambem teve o mesmo Jacob. Esses +patriarchas foram:—o 1.º, Ruben; o 2.º, Simeão; o 3.º, Levi (cujos +descendentes foram destinados ao sacerdocio e a serem ministros do templo de +Deus); o 4.º, Judá; o 5.º, Dan; o 6.º, Nephtali; o 7.º Gad; o 8.º, Azer; o 9.º, +Isachar; o 10.º, Zabulon; o 11.º José; o 12.º, Benjamin.</p> + +<p>Os mais velhos de entre elles começaram a ter inveja a José, por verem que +era o mais estimado de Jacob, e porfim intentaram matál-o, lançando-o n'uma +cisterna; mas, mudando de resolução, venderam-n'o como escravo a uns +madianitas, que o levaram para o Egypto, onde foi comprado por Putiphar, creado +de Pharaó, rei d'aquella nação. Serviu José a Putiphar com tanta fidelidade, +que não se prestou a um crime para que o provocava a esposa do mesmo Putiphar. +Esta, para d'elle se vingar, accusou-o aleivosamente de falso crime e por esse +motivo foi elle mettido n'um carcere. Alli Deus revelou-lhe a significação +mysteriosa de uns sonhos que haviam tido dois dos seus companheiros de +captiveiro. Um d'estes, como Pharaó tivesse um sonho em que viu septe vaccas +magras e septe espigas delgadas, que devoravam septe vaccas gordas e septe +espigas fartas, indicou-o ao rei, como capaz de lhe interpretar o sonho. José +explicou com effeito ao rei o sentido d'aquella visão. Surprehendido e +maravilhado Pharaó com a sabedoria d'elle, elegeu-o para seu ministro, e +deu-lhe grandes honras e distinções. José casou com a filha de um sacerdote de +Heliopolis, da qual lhe nasceram seus dois filhos Manassés e Ephraim. Como +ministro, e gozando toda a confiança do rei, organizou a arrecadação dos +cereaes, de modo que, quando chegaram os septe annos de fome, symbolizados nas +septe vaccas magras e nas septe espigas delgadas do sonho, o Egypto estava +provido contra a escassez e ainda poude efficazmente soccorrer as povoações +proximas, nas quaes se não tinham adoptado eguaes providencias.</p> + +<p>A escassez de alimentos, que tambem se sentiu em Chanaan, terra onde com sua +familia habitava Jacob, obrigou este a mandar ao Egypto seus filhos, a comprar +trigo. Soube da chegada d'elles José e, sem se lhes revelar como seu irmão, +obrigou-os a declarar quem eram e a deixarem em poder d'elle, em refem, a +Simeão, emquanto iam a Chanaan a buscar-lhe Benjamin, o irmão mais novo.</p> + +<p>Obrigados a voltarem ao Egypto, por causa da fome que continuava, +conseguiram que Jacob, apesar da sua repugnancia,<span class="pn">{12}</span> +deixasse ir Benjamin; e então José, dando-se a conhecer aos irmãos, entre +lagrimas de alegria, mandou-lhes que voltassem a Chanaan, a buscar Jacob e toda +a familia. Assim aconteceu, indo toda a familia de Jacob estabelecer-se no +Egypto. Alli viveu ainda Jacob 17 annos, vindo a finar-se na edade de 147, +depois de abençoar seus filhos, com bençãos mysteriosas e propheticas, +vaticinando que na descendencia de seu filho Judá estaria o imperio e o governo +do povo, até vir ao mundo o Messias, que havia de remir o peccado de Adão. +Fallecido Jacob, ficaram residindo no Egypto seus filhos, nas terras que, em +attenção a José, lhes havia dado o Pharaó, e nas quaes tiveram numerosa +descendencia.</p> + +<p>Permaneceram os Israelitas ou Hebreus no Egypto por espaço de 217 annos. No +decurso d'estes, os Egypcios, desconfiando d'elles, opprimiam-n'os cruelmente, +obrigando-os a trabalhos duros, e o rei mandava matar-lhes todos os filhos +recem-nascidos do sexo masculino, os quaes eram lançados ao Nilo. Nascendo +Moysés, filho de Amrão e de Jocabed, esta conseguiu occultál-o por espaço de +tres mezes; mas, não o podendo conservar escondido por mais tempo, lançou-o +áquelle rio, dentro de um cesto. Estando a filha do rei a banhar-se no rio, viu +a creança, salvou-a e deu-lhe o nome de Moysés, que quer dizer: «salvo das +aguas». Depois levou-o para a côrte, onde foi creado e passou a mocidade.</p> + +<p>Deus, condoido de quanto os Hebreus soffriam entre os Egypcios, resolveu +livrál-os da oppressão, fazendo-os sahir do Egypto, por meio de assombrosos +milagres. Foram esses prodigios obrados por intermedio de Moysés e de seu irmão +Arão, apparecendo primeiro Deus a Moysés no monte Horeb, e mandando-lhe que +fosse á presença de Pharaó, a pedir-lhe que deixasse sahir do Egypto o povo de +Israel. O rei, bem longe de acceder ao pedido, antes redobrou a perseguição. +</p> + +<p>Então começaram os milagres. Indo Moysés e Arão á presença de Pharaó, para +lhe mostrarem como era vontade de Deus o que lhe pediam, lançou Arão na terra +uma vara que levava na mão, e a vara logo se converteu em serpente. Quiseram os +magos imitar a transformação, convertendo tambem outras varas em serpentes; mas +a serpente em que se tornára a vara de Arão devorou todas as outras. Continuou, +apezar de tudo, a obstinação de Pharaó; e Deus, para mais claro aviso e para +castigo, mandou ao Egypto as dez pragas, que assolaram todo o paiz.</p> + +<p>Essas pragas foram as seguintes: a primeira consistiu em se converter em +sangue a agua dos rios e das fontes do Egypto,<span class="pn">{13}</span> +morrendo todos os peixes; a segunda, n'uma innumeravel multidão de rans que +intravam por todas as casas; a terceira, n'uma quantidade enormissima de +mosquitos e de outros insectos, que tornavam a vida insupportavel; a quarta, +n'uma abundancia de moscas, que perseguiam atrozmente homens e animaes; a +quinta foi uma peste que matou um numero enorme de pessoas e fez tambem grande +devastação nos animaes; a sexta foi uma epidemia de chagas hediondas e +repugnantes, que appareciam nos corpos dos Egypcios e dos animaes; a septima, +uma grande chuva de pedra, acompanhada de terrivel trovoada, ficando destruidas +por ellas as arvores, plantações, sementeiras e pastos; a oitava foi o +apparecimento de uma nuvem de gafanhotos, que tambem produziram incalculavel +estrago nos campos; a nona manifestou-se por umas trevas muito espessas, que +por tres dias escureceram o Egypto, excepto a terra de Gessen (logar em que +habitavam os Hebreus, aos quaes não chegou nenhuma das pragas); a decima +consistiu na morte de todos os primogenitos egypcios, desde o filho de Pharaó +até ao do escravo mais humilde, e tambem na de todos os primogenitos dos +animaes.</p> + +<p>Movido finalmente Pharaó pela decima praga, consentiu que os Hebreus +sahissem do Egypto. Na noite do dia 14 do mez de Nisan, que corresponde ao de +março, sahiram, pois, os descendentes de Jacob da terra dos Pharaós, em tão +grande numero, que só homens armados e capazes de pelejar eram mais de 600:000. +Guiava-os um anjo por meio de uma columna, que de dia era formada como que de +uma nuvem, e de noite era de fogo. Esta columna precedia os Hebreus e +indicava-lhes o caminho atravez do deserto. Caminhavam por este, quando Pharaó, +de novo indurecido, se arrependeu da concessão que fizera, mandou armar todos +os seus carros bellicos e sahiu com um numeroso exercito, a perseguir e +captivar outra vez o povo de Israel, que ia já perto do Mar Vermelho. Vendo-se +de novo perseguidos pelos Egypcios, os Israelitas começaram a murmurar contra +Moysés, por havel-os mettido n'aquelle perigo; mas este exhortou-os a que +tivessem Esperança em Deus e, extendendo uma vara, que levava na mão, sobre o +Mar Vermelho, as aguas dividiram-se para um e outro lado, deixando no meio um +caminho enxuto, pelo qual passaram a salvo os Israelitas. Chegando os Egypcios +e vendo as aguas divididas, intraram no mesmo caminho para os perseguirem; mas, +estando já todos n'elle, Moysés levantou outra vez a vara sobre o mar e as +aguas voltaram á sua posição natural, ficando submerso todo o exercito de +Pharaó.<span class="pn">{14}</span></p> + +<p>Em memoria da sahida do Egypto, mandou Deus aos Hebreus que celebrassem +perpetuamente a Paschoa, matando todos os annos e comendo com certas ceremonias +um cordeiro.</p> + +<p>Passado o Mar Vermelho, fôram elles caminhando por diversos logares até ao +deserto,—onde começou o Milagre do maná. Era este um manjar delicioso que +cahiu do céu durante quarenta annos, emquanto os Israelitas peregrinaram no +deserto até intrarem na terra da promissão. Com elle se alimentavam, colhendo +cada um diariamente uma certa medida, por fórma que, se queria guardar alguma +porção para o dia seguinte, logo o manjar se corrompia. A peregrinação pelo +deserto durou tanto tempo, porque assim o determinou Deus, em castigo das +murmurações e falta de fé dos Israelitas á sahida do Egypto, fazendo-os +retrogradar para o deserto, quando estavam já perto da terra da promissão.</p> + +<p>Appareceu Deus a Moysés sobre o monte Sinai, e entre raios lhe deu as taboas +da lei, em que estavam escriptos os dez preceitos do decalogo, e dictou-lhe as +outras leis e ceremonias que queria que fossem usadas pelo seu povo. Emquanto +Moysés estava sobre o Sinai—que foi por quarenta dias e quarenta +noites—pediram os Israelitas a Arão que lhes fizesse um deus que +adorassem e que os governasse. Annuiu elle ao pedido e fabricou um bezerro de +oiro, que puzeram n'um altar e adoraram, e ao qual offereceram sacrificios. +Quando Moysés desceu do monte e teve noticia d'este acto de idolatria, depois +de orar ao Senhor—em desaggravo de tão grande peccado,—em signal de +indignação, quebrou as taboas da lei, mandou aos levitas que matassem os +Israelitas que incontrassem no caminho, calcou aos pés e reduziu a pó o bezerro +de oiro, e supplicou a Deus que perdoasse ao seu povo, o que elle fez a +final.</p> + +<p>Perdoado o peccado do povo, mandou Deus a Moysés que voltasse ao cume do +Sinai, com duas taboas de pedra, nas quaes foram de novo gravados os dez +preceitos. Mandou depois se construisse um templo cuja guarda e governo foram +confiados a Arão, irmão de Moysés, sendo os mais descendentes de Levi feitos +ministros do mesmo templo, com o nome de levitas. Este templo, que era +portatil, e se chamava tambem <em>tabernaculo</em>, acompanhava o exercito e +era dividido em duas partes: na interior, que se chamava <em>sancta +sanctorum</em>, estava a arca do testamento, e só intrava o summo sacerdote; na +exterior havia um altar, em que se queimavam essencias e um candelabro com +septe lumes.</p> + +<p>Passados quarenta annos de peregrinação estavam os Israelitas<span +class="pn">{15}</span> na terra da promissão, a cuja vista havia morrido +Moysés, na edade de 120 annos e depois de ter abençoado o povo.</p> + +<p>A terra da promissão era uma provincia da Asia, chamada hoje Palestina ou +Terra Santa, que comprehendia varios reinos pequenos, conhecidos pela +denominação de <em>reinos dos Cananeus</em>. Morto Moysés, ficou com o governo +do povo Josué filho de Num, ao qual o Senhor appareceu dizendo-lhe que metesse +os Hebreus na posse da terra da promissão, dividindo as terras pellas +differentes tribus e familias. Josué teve que combater e vencer varios povos e +reis, e que conquistar varias cidades da Palestina. Dividida esta pelos povos +de Israel, obrigaram-se estes a dar a decima parte dos fructos da terra aos +levitas.</p> + +<p>Morrendo Josué na edade de 110 annos, seguiu-se-lhe o governo dos juizes, +dos quaes os mais celebres foram Debora, Gedeão, Jephte e Sansão. D'este ultimo +contam os livros santos que, sendo ainda muito moço e sahindo-lhe ao incontro +um leão, o despedaçou logo; depois matou de uma vez trinta Philisteus; e de +outra, depois de haver quebrado umas cordas muito fortes com que o tinham +amarrado, matou mil Philisteus com a queixada de um jumento. N'outra occasião, +incerrado pelos Philisteus na cidade de Gaza, sahindo de noite, arrancou as +portas da cidade e levou-as a um alto monte. Depois d'aquellas façanhas e de +outras, deixou-se inlear no amor de Dalila, á qual declarou que a verdadeira +causa da sua força consistia em ser dedicado a Deus e em não lhe terem jámais +cortado os cabellos; Dalila, senhora de tal segredo, fez com que Sansão +adormecesse nos seus braços e, vindo os Philisteus, cortaram áquelle os +cabellos, pelo que perdeu a força e foi aprizionado.</p> + +<p>Os Philisteus, vencido assim Sansão, tiraram-lhe os olhos e trataram-n'o +indignamente até que, passado algum tempo, tendo-lhe novamente crescido os +cabellos, recuperou a força; e, sendo então levado pelos Philisteus ao templo +de seu falso deus Dagão, para zombarem d'elle, abraçou Sansão duas columnas do +mesmo templo e moveu-as com tal impeto, que o edificio abateu, morrendo +esmagados quantos n'elle estavam, incluido o proprio Sansão.</p> + +<p>O ultimo juiz que governou o povo hebreu foi o propheta Samuel, durante o +governo do qual os Israelitas pediram a Deus que lhes désse um rei, o que Deus +concedeu, mandando a Samuel que ungisse a Saul, como rei, e esse foi o primeiro +dos reis de Israel. A principio regeu Saul, conforme ás leis e ao temor de +Deus, mas depois faltou a uma e outra<span class="pn">{16}</span> coisa, pelo +que mandou o Senhor a Samuel que ungisse como rei a David, mancebo muito +valoroso, da tribu de Judá, e que havia morto o gigante Golias, que desafiava o +exercito de Israel. Saul, sabendo da eleição de David, perseguiu-o e não quiz +depor o poder; mas afinal, vencido na guerra contra os Philisteus, suicidou-se. +Introu então David na posse pacifica do governo, comquanto tivesse que +sustentar guerras contra os Philisteus, os Ammonitas, os Syrios, os Idumeus e +os habitantes de Damasco, vencendo a todos estes inimigos. Preparou os +materiaes necessarios para edificar um magnifico templo, que não chegou a +construir por Deus lh'o haver prohibido; trasladou a arca do testamento para o +seu palacio de Jerusalem, fez rigorosa penitencia por graves peccados que tinha +commetido; compoz muitos psalmos em louvor de Deus; e practicou muitos outros +actos de soberano justo e sabio.</p> + +<p>A David succedeu no reinado seu filho Salomão, que foi muito sabio e sagaz, +e cujo governo foi assignalado por grandes riquezas e prosperidades. Durante +todo o tempo que governou, conservou em paz o reino de Israel; foi temido e +respeitado pelos principes vizinhos, muitos dos quaes eram seus tributarios; as +suas frotas levavam-lhe grande quantidade de oiro e de materias preciosas; +floresceu o commercio em todo o paiz; e a sabedoria do rei era admirada nos +reinos estranhos. Empregou Salomão grandes riquezas em edificar um templo +grandioso, para a adoração de Deus, onde havia preciosissimos vasos e um grande +numero de ministros do Senhor. Esse templo excedeu tudo quanto se pode imaginar +de magnificente. Edificou tambem um sumptuoso palacio, para sua morada.</p> + +<p>Antes de ter revelado a sua sabedoria em muitos livros que escreveu, +mostrou-a tambem na sabia sentença que pronunciou, conhecida pelo nome de +«juizo de Salomão». Teve ella a seguinte origem. Duas mulheres viviam juntas e +tinham cada uma seu filho. Aconteceu morrer uma das creanças, e cada uma das +mães dizia ser seu o que ficára vivo. Foram ambas ter com Salomão, para que +decidisse a contenda. Decidiu o rei que se cortasse ao meio o menino disputado +e que se désse metade d'elle a cada contendora. Uma das mães acceitou a +sentença; mas a outra clamou que antes se désse o menino inteiro e vivo á sua +rival. Assim concluiu Salomão que a verdadeira mãe era aquella que não +consentia na morte da creança. Mandou por isso que esta lhe fôsse intregue.</p> + +<p>Por espaço de muitos annos observou Salomão a lei de Deus, governando o seu +povo com grande sabedoria e justiça; mas nos ultimos annos da vida prevaricou, +edificando templos<span class="pn">{17}</span> aos falsos deuses, adorados por +mulheres estrangeiras que tomou contra os preceitos de Deus. Não se sabe com +certeza se chegou a arrepender-se d'este peccado, de que foi reprehendido pelo +Senhor; mas julga-se que se arrependeu, compondo então o livro sagrado chamado +<em>Ecclesiastes</em>, que figura no Novo Testamento e em que mostrou a vaidade +das grandezas humanas.</p> + +<p>A Salomão succedeu Roboão, seu filho, principe imprudente e tyrannico, que, +pedindo-lhe o povo que o alliviasse dos tributos, respondeu que não só o não +faria, antes os havia de augmentar e tratar os Israelitas como escravos. Vendo +e ouvindo isto, dez tribus rebellaram-se contra Roboão, acclamando por seu rei +a Jeroboão, homem sedicioso e impio; e só as tribus de Judá e de Benjamin +ficaram na obediencia de Roboão, que se viu obrigado a fugir precipitadamente +para Jerusalem.</p> + +<p>Dividiu-se assim o reino em dois: a parte que permaneceu sujeita a Roboão +chamou-se Reino de Judá, ou Judéa; a outra, que seguiu a Jeroboão, denominou-se +Reino de Israel.</p> + +<p>Jeroboão esqueceu a lei de Deus, mandou fabricar bezerros de oiro, que fez +adorar como divindades, sendo assim causa da maior parte dos Israelitas cahirem +em idolatria. Na mesma impiedade viveram os seus successores, os 21 reis que +governaram Israel por espaço de 254 annos, findos os quaes foi o reino +destruido pelos Assyrios e seu rei Salmanazar, que tomou Samaria e levou +captivas as dez tribus de Israel.</p> + +<p>No reino de Judá continuou-se a adorar o verdadeiro Deus, ainda que Roboão e +muitos dos seus successores por varias vezes permittiram a idolatria; por isso +foi o reino castigado pelo Senhor, que o intregou aos seus inimigos. O reino de +Judá durou por 468 annos, contados do principio do reinado de David. Os +peccados dos Judeus foram causa de Deus os intregar aos Chaldeus que, +governados por seu rei Nabucodonosor, tomaram a cidade de Jerusalem, queimaram +o templo do Senhor, e levaram os Judeus para o seu paiz. Este captiveiro +chamou-se o «captiveiro de Babylonia» que durou por mais de 70 annos.</p> + +<p>Foi dada a liberdade aos Judeus por Cyro, rei dos Médos, Persas e Chaldeus, +o qual subjugou estes dois ultimos povos, ganhou varias batalhas e tomou +Babylonia. Tomada esta cidade permittiu Cyro aos Judeus que regressassem á sua +patria, o que se effectuou sob o mando do summo pontifice Josué e de Zobadel. +Mal chegaram a Jerusalem, o seu primeiro cuidado foi a re-edificação do templo, +a qual não poderam logo<span class="pn">{18}</span> levar a effeito por lh'o +impedirem os Samaritanos, conseguindo por fim concluil-a Zorobabel, mediante o +auxilio de Dario I. por pouco durou a independencia dos Hebreus. As reformas de +Esdras, nas quaes se comprehendia a prohibição de casamentos com mulheres de +outras nações, e a dissolução das familias até então constituidas contra esse +preceito, originaram um scisma, em que parte do povo se reuniu aos Samaritanos, +ficando a nação muitissimo infraquecida. Aproveitando este estado, subjugaram +os Persas a Judéa, cuja historia desde então até á conquista de Alexandre se +confunde com a das outras provincias humildes, sujeitas ao dominio d'aquelle +imperador. Continuou a rivalidade entre os Judeus e os Samaritanos, aos quaes +os primeiros não permittiam a intrada no templo de Jerusalem. Os Judeus não +constituiam assim já um povo, mas uma simples communidade religiosa ou uma +casta sacerdotal, isolada no meio das outras populações do grande imperio +persa.</p> + +<p>Realizada a conquista d'este imperio em tempo de Dario Codomanno, +submetteu-se a Judéa ao conquistador, sem resistencia; por morte de Alexandre +foi governada successivamente por Laomedonte e pelos reis do Egypto e da Syria. +Com os Machabeus chegou a recobrar a sua independencia, sendo Aristobulo +proclamado rei; mas repetidas guerras civis deram logar á intervenção dos +Romanos na Palestina, chegando Pompeu a intrar em Jerusalem, que ficou desde +essa epocha em estado de incompleta servidão.</p> + +<p>Por fim realizou-se a annexação da Judéa aos dominios de Roma, sendo Herodes +incarregado do governo d'ella pelo imperador Augusto; mais tarde augmentaram as +dissensões e rixas, que desde o principio houvera entre Judeus e Romanos, o que +levou Nero a mandar Vespasiano, seu general, para reduzir completamente á +obediencia a Judéa. A conquista d'esta foi interrompida pelo regresso de +Vespasiano a Roma, para assumir o governo imperial, e só veio a ser ultimada +pelo imperador Tito, que foi em pessoa á Palestina com um exercito de 60:000 +homens. Á vista do exercito romano, applacaram-se as contendas civis que havia +em Jerusalem, e esta cidade defendeu-se durante muito tempo, com um denodo +verdadeiramente heroico, contra o inimigo que a cercava. Por fim cahiu a ultima +obra de defesa, a cidade foi invadida, e o templo incendiado. Os Judeus, +perdida toda a esperança, mataram suas mulheres e filhas e suicidaram-se em +seguida, preferindo isso a intregarem-se com vida aos Romanos. A tomada de +Jerusalem deu-se no anno 70 da era christan. O<span class="pn">{19}</span> povo +Hebreu perdeu, desde então e para sempre, a sua unidade politica, apezar de +continuar até hoje a existir disperso pelo mundo, com os caracteres +particulares da sua raça e da sua religião.</p> + +<p>Já depois de submettida a Judéa aos Romanos, mas antes da tomada de +Jerusalem, nasceu perto d'esta cidade, em Bethlem, Jesus Christo, quatro annos +antes da era actual (ou era christan).</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0023">CAPITULO II<br> +OS EGYPCIOS</a> </h1> + +<p>As populações que primitivamente habitaram o valle do Nilo foram subjugadas, +ou compellidas para o sul, por um povo vindo da Asia pelo isthmo de Suez. +Passou-se isto em tempo anterior aos mais antigos monumentos historicos. +Aquelle povo conquistador, que alli se estabeleceu, veio a constituir o que na +Historia Antiga é conhecido pela denominação de <em>povo egypcio</em>.</p> + +<p>Nada ao certo é conhecido quanto ao governo primitivo dos Egypcios, que se +presume ter sido nos primordios <em>theocratico</em> ou <em>sacerdotal</em>. +Parece provavel que aquelle paiz tinha chegado já a um certo estado de +civilização e estava bastante povoado pela epocha de 2000 annos antes da era de +Christo. Segundo Herodoto, foi Menés o fundador da monarchia egypcia, a qual +durou 1663 annos, desde a sua origem até á conquista do Egypto por Cambyses. O +dominio d'aquella monarchia limitou-se primeiro a Thebas, cidade fundada pelo +mesmo Menés, e aos seus arredores; mas este monarcha accrescentou +consideravelmente o seu territorio, construindo diques para impedir que o Nilo +continuasse a alagar os seus campos marginaes. Nos terrenos assim conquistados +ao rio, e na extremidade do <em>delta</em> d'este, edificou uma cidade grande e +importante, que teve o nome de Memphis.</p> + +<p>Dos seculos que se seguiram ao reinado de Menés apenas ha vestigios muito +obscuros na Historia. Reinaram durante elles differentes dynastias, a mais +notavel das quaes foi a quarta, de que foi fundador Snervu, e que se denominou +«a dynastia dos Pharaós». Os tres Pharaós immediatos successores de Snervu +foram Cheops, Khavrá e Mycerino, que se tornaram<span class="pn">{20}</span> +celebres por haverem mandado construir as tres grandes pyramides, que foram +destinadas a servir-lhes de tumulos. Situadas na planicie de Gyzeh, na margem +esquerda do Nilo, a breve distancia de Memphis, são aquellas pyramides os mais +notaveis monumentos da civilização egypcia. A de Cheops tem 147 metros de +altura, a de Khavrá 138, e a de Mycerino 66. A mais alta foi construida em 30 +annos, por 100:000 homens, que eram substituidos de seis em seis mezes.</p> + +<p>Os reis de outra dynastia, a duodecima, tornaram-se notaveis pelas grandes +obras hydraulicas que imprehenderam no Nilo, construindo um grande numero de +canaes, para distribuirem as aguas pelas differentes regiões do sólo, afim de +lhes augmentar a fertilidade e de prevenir as inundações.</p> + +<p>Mais tarde, reinando Timaos, um povo originario da Asia (os Hyksos ou +<em>Pastores</em>) invadiu o Egypto, cuja antiga civilização destruiu. A +invasão, comtudo, não se extendeu além do <em>delta</em> do Nilo e do baixo +Egypto. A parte, de que Thebas era capital, escapou á dominação dos Hyksos que +porfim foram expulsos do paiz por Amenophis Thetmosis, descendente dos antigos +reis do Egypto.</p> + +<p>Entre os reis que succederam a este, houve notavel (alêm de outros) M[oe]ris +que executou differentes obras muito importantes, no numero das quaes figura o +famoso lago que tomou o nome d'elle, e que foi destinado a receber as aguas do +Nilo, quando a sua grande abundancia ameaçasse o Egypto de ser totalmente +inundado. Este lago fornecia agua, por um grande numero de canaes, a +differentes zonas que fertilizava.</p> + +<p>Tornou-se tambem muito notavel o rei Sesostris (Ramsés-Meiamun), que foi o +primeiro que armou uma esquadrilha; bateu-se com os Arabes, que subjugou, e +outrotanto fez aos Lydios e Ethiopicos. Imprehendeu a conquista da Asia; e, +tendo deixado seu irmão Danao no governo do reino, bateu e derrotou os +Assyrios, os Medos, os Scythas e os Phenicios; submetteu a Thracia, a Colchida, +e chegou até ás margens do Ganges. Deixou por toda a parte inscripções, +commemorando as suas victorias. Regressando aos seus estados, dedicou-se a +promover o progresso das artes, felicitou o povo com uma paz duradoura, e +accrescentou ás suas glorias militares a de ter fundado instituições politicas +e promulgado leis de geral utilidade. Tendo cegado na velhice, não poude +resistir a essa infelicidade e suicidou-se. Os Egypcios, gratos á sua memoria, +ergueram-lhe templos, nos quaes lhe prestavam as mesmas honras que aos seus +deuses. Por esse tempo tinha chegado o Egypto á phase do seu<span +class="pn">{21}</span> maior esplendor. Tempos depois começou a pronunciar-se a +sua decadencia, que as perturbações intestinas contribuiram bastante para +precipitar. A Ethiopia proclamou a sua independencia; e os povos da Syria, +sempre insubordinados e irrequietos, negaram-se a pagar os tributos. A unidade +nacional veio a quebrar-se, e o paiz dividiu-se em vinte pequenos estados +independentes. As rivalidades entre estes differentes estados levou-os a +admittirem no seu seio os estrangeiros, cuja intrada até alli fôra sempre +vedada no Egypto. Foi então que os Ethiopes e os Assyrios disputaram o paiz e +fizeram conquistas que, comquanto não fossem duradouras, comtudo apressaram +bastante a ruina da nação. Depois de expulsos aquelles dois povos, o Egypto +ficou sendo governado outra vez por principes independentes. No delta do Nilo +havia doze d'estes principes, os quaes constituiram uma confederação, formada +dos seus estados, a que se chamou <em>dodecarchia</em>. Um d'aquelles +principes, porêm, chamado Psammeticho I, derrubou á mão armada os outros +principes e restabeleceu a unidade nacional. Durante o reinado d'este monarcha, +ainda o Egypto se ergueu um pouco da sua decadencia e pareceu querer voltar ao +seu antigo esplendor e grandeza; floresceram de novo as lettras, as +bellas-artes e a industria; e continuaram outra vez um pouco as grandes obras +de irrigação que estavam—havia muito—suspensas. Sustentou-se no +throno durante 47 annos a dynastia de Psammeticho; no reinado de um dos seus +descendentes, Amasis, teve o Egypto uns annos de certa prosperidade, a que logo +poz termo a conquista persa, realizada por Cambyses. Desde esta até á conquista +por Alexandre Magno medeiam dois seculos, durante os quaes os Egypcios tiveram +politicamente uma existencia miseravel. Com a conquista pelos Romanos, depois +da morte de Cleopatra, incerra-se a Historia Antiga do Egypto, que durou uns +cincoenta seculos, e na qual se contam 34 dynastias.</p> + +<p>Gosou sempre de grande fama a civilização dos Egypcios durante o periodo da +Historia Antiga. Os proprios Gregos chegaram a gabar-se de que muitos dos seus +philosophos e legisladores tinham ido á terra do Nilo instruir-se nas sciencias +ou na arte de governar. Comtudo, fez-se em tempo uma idéa muito exaggerada do +estado a que a sciencia havia chegado no Egypto. Attribuem-se a este povo +conhecimentos mathematicos, e especialmente astronomicos, muito adeantados; mas +não é averiguado que os possuisse em tal desinvolmento,—e bem poucos +vestigios existiam d'elles, quando<span class="pn">{22}</span> alli foram da +Grecia, Eudoxio e Platão. A religião, as artes e a philosophia, é que +floresceram muito notavelmente n'aquelle paiz. As ruinas innumeraveis de que +todo o seu sólo está coberto, bastariam para attestar o grande estado de +esplendor a que elle chegou. A historia das artes apresenta alli muito mais +caracteres de certeza do que a das sciencias. Os monumentos, as ruinas, os +templos, os palacios, os colossos, que nem a acção do tempo nem a do homem +puderam ainda destruir, dão conhecimento do elevado grau de perfeição até onde +os Egypcios levaram a cultura das artes; mas, de todos os monumentos do Egypto, +os mais assombrosos são sem duvida as pyramides (construcções colossaes que se +vêem ainda em differentes pontos, e das quaes as tres mais notaveis são as de +que atraz falámos).</p> + +<p>O antigo governo do Egypto era theocratico; reinavam alli os sacerdotes em +nome dos deuses. Os proprios reis estiveram quasi sempre sujeitos ao poder +sacerdotal, que se mantinha principalmente por effeito da severa distincção das +castas. Os sacerdotes constituiam a primeira d'estas, á qual se seguia a dos +guerreiros, depois a dos interpretes, e a dos trabalhadores (divididos ainda +estes em diversas classes, que nunca se confundiam). A todo o egypcio era +prohibido sahir da condição em que nascêra e abraçar profissão que não fosse a +de seu pae.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0024">CAPITULO III<br> +OS ASSYRIOS E BABYLONIOS</a> </h1> + +<p>O imperio assyrio no principio apenas comprehendeu o territorio situado a +leste do rio Tigre; mais tarde veio a ser formado por todo o territorio que +ficava entre aquelle e o Euphrates, e comprehendeu, juntamente com a Assyria +propriamente dita, a Chaldéa, a Mesopotamia, a Babylonia e differentes paizes +tributarios. A Chaldéa foi, como o Egypto, um dos primeiros paizes em que +começou a desinvolver-se com certo grau a civilização; os Chaldeus e os +Babylonios passam por ser os primeiros povos que fizeram descobrimentos +astronomicos; deve-se-lhes a divisão do anno em 365 dias, 6 horas e alguns +minutos. É muito incerta a chronologia da historia dos Assyrios: segundo os +livros santos, a fundação de Babylonia e<span class="pn">{23}</span> de Ninive +realisou-se pelo seculo <small>XXII</small> antes de Jesus Christo, Nemrod foi +fundador da primeira e Assur da segunda. Nada certo se sabe sobre a historia +dos povos que habitaram aquellas cidades e ainda outras, anteriormente ao tempo +de Belo que, por 1780 antes de Jesus Christo, creou o imperio da Assyria, +reunindo o reino de Babylonia com o de Ninive.</p> + +<p>Nino, successor de Belo, alliou-se com os Arabes, derrotou os Armenios e os +Medos, estendeu o seu dominio por grande parte da Asia, e levou as suas +conquistas desde o Egypto até ás Indias. Augmentou consideravelmente a cidade +de Ninive, que dotou com palacios e outros edificios sumptuosos. Depois de +tomar a cidade de Bactres (capital da Bactriana), casou com Semiramis, viuva do +governador da mesma cidade e uma das mulheres mais bellas d'aquelle tempo, da +qual teve um filho chamado Ninias. Pela morte de Nino, ficou Semiramis herdeira +do imperio, que augmentou com conquistas novas; subjugou a Arabia, o Egypto e a +Lybia; illustrou o seu reinado não sómente por grandes acções militares, mas +tambem pela administração do paiz e pelas assombrosas construcções, das quaes +ainda hoje existem ruinas muito notaveis. Tornou Babylonia uma cidade magnifica +e grandiosa, cingiu-a com uma muralha de 15 leguas de circumferencia, de altura +consideravel, e com cem portas de bronze em toda a sua extensão. Era tão larga +essa muralha que sobre ella podiam passar quatro carroças a par. Construiu +tambem Semiramis uma ponte magnifica sobre o Euphrates (rio que atravessava a +cidade) e em cada uma das extremidades d'ella dois palacios. Um d'estes era a +habitação ordinaria da rainha e deposito das consideraveis riquezas que esta +recebia de todas as provincias do imperio; o outro, incimado por oito torres de +consideravel altura, era um templo consagrado a Belo, e em cujo interior +Semiramis tinha mandado collocar estatuas de oiro, de quarenta pés de altura, +representando varias divindades. Todo o interior do templo era cheio de +baixos-relevos com grande valor artistico, de magnificas estatuas e de vasos de +oiro e de prata primorosamente trabalhados. A cidade era muito bella e cortada +de lindas ruas e praças, ornadas de opulentos palacios; mas o que sobretudo +maravilhava eram os jardins estabelecidos em terraços elevados sobre o +Euphrates e sustentados por abobadas de altura prodigiosa. Ornados das mais +bellas arvores, inriquecidos com abundancia das mais vistosas flores, eram +cortados de limpidos arroios, alimentados por agua levada áquella altura por +meio de aqueductos e de apparelhos ingenhosissimos. Davam ingresso no jardim +suberbas escadarias,<span class="pn">{24}</span> ornadas de estatuas e de vasos +preciosos, em que vegetavam as mais raras flores e arbustos de todos os paizes +então conhecidos.</p> + +<p>Na construcção d'aquellas muralhas e de outras com que opulentou Babylonia, +empregou Semiramis 2.000:000 homens durante muitos annos. Immortalizou-se +aquella rainha, não só n'isso, mas tambem na sabia administração que exerceu +nos seus estados e na organização dos seus exercitos, em que reinou sempre a +disciplina mais rigorosa e mais severa e que ella em pessoa commandou muitas +vezes.</p> + +<p>Tendo-se ausentado no commando de uma expedição destinada a alargar os +limites dos seus estados, soube que na capital se estava urdindo uma +conspiração para a depôr e substituil-a no governo por seu filho Ninias. Não +quiz ella conservar pela força o throno, que ninguem lhe poderia disputar; e, +intregando voluntariamente o governo ao filho, absteve-se de punir os +conspiradores, e retirou-se do mundo. A população surprehendida e maravilhada +pelo seu subito desapparecimento—que considerou +sobrenatural—erigiu-lhe templos e prestou-lhe honras divinas.</p> + +<p>Ninias foi apenas um simulacro de rei. Passou a vida na ociosidade e na +indolencia, e foi o primeiro que estabeleceu o governo do serralho. +Seguiram-se-lhe trinta e tres reis que nada fizeram pelo bem do paiz e de que a +Historia apenas faz menção. O ultimo foi Sardanapalo, cujo nome ficou lendario +e serve para caracterizar os soberanos que põem de lado os cuidados da +governação, para se darem tão sómente á ociosidade e aos prazeres physicos. +Sardanapalo, indolente e crapuloso, estabeleceu a sua residencia em Ninive, +onde passava a vida mettido n'um palacio, cercado de mulheres, cujos habitos e +adornos imitava, deixando em Babylonia o governo intregue a valídos que de tudo +dispunham. Nunca visto de seus subditos, sempre incerrado no palacio, onde +passava as noites em libações e folgares, não lhe importavam nada os negocios +publicos, e só tratava de esconder aos olhos dos subditos os seus ignominiosos +habitos. Um dia Arbaces, governador da Média, surprehendeu-o no meio de um +grupo de mulheres impudicas, trajando como ellas. Indignado por ver que tantos +valorosos Assyrios estavam sujeitos a um monarcha desprezivel, revelou aos seus +amigos os vergonhosos habitos de Sardanapalo, ligou-se com Belesis (governador +da Babylonia), e ambos foram pôr cerco ao rei no proprio palacio em que +habitava. Depois de tenue resistencia, Sardanapalo reduzido a circumstancias +extremas, quiz apagar com um esforço supremo<span class="pn">{25}</span> de +coragem a memoria da sua vergonhosa vida. Mandou accender n'um dos pateos +interiores do palacio uma grande fogueira, na qual se queimou com suas +mulheres, seus escravos e seus thesouros.</p> + +<p>Dos restos do imperio assyrio assim desfeito, formaram-se tres grandes +reinos: o de Babylonia, o da Média, e o de Ninive ou da Assyria propriamente +dita. De Babylonia tornou-se rei Belesis, que transmitiu o poder á sua +dynastia, na qual só houve notavel o rei Nabonassar, que deu o seu nome a uma +era especial começada no anno 747, e sob cujo governo a astronomia fez grandes +progressos. Mais tarde cahiu Babylonia em poder dos reis de Ninive.</p> + +<p>Na quéda de Sardanapalo, o principal promotor d'ella, Arbaces, ficou senhor +do reino da Média, e tentou concentrar alli a supremacia assyria sobre o resto +da Asia. Deu certas franquias liberaes aos Medos, os quaes por si mesmos +trataram de fazer leis, dividiram-se em seis tribus, e crearam juizes para lhes +dirimirem os pleitos. Depois da morte de Arbaces, elegeram elles para rei a +Dejoces, um dos seus juizes, que fundou a cidade de Ecbatane, onde se +estabeleceu com sua familia e seu erario, e concentrou a parte mais importante +da população, constituindo alli a capital da Média. Aquella cidade, pela sua +opulencia e pelos seus monumentos, tornou-se em breve tão celebre como +Babylonia e como Ninive.</p> + +<p>Dejoces teve por successor a Phraorto, ao qual succedeu seu filho Cyaxaro I, +que conquistou a Persia. Desde então a historia da Média confunde-se com a do +segundo imperio assyrio. Sobre a parte do antigo imperio assyrio, de que Ninive +era capital, ficou reinando, por morte de Sardanapalo, Nino o <em>Moço</em>. Os +seus successores tentaram reunir aos seus dominios Babylonia, o que chegaram a +conseguir em tempo de Assar-Haddon. Entre os reis de Ninive, houve notaveis: +Phul; Teglath-Phalasar, que conquistou Damasco; Salmanazar, que subjugou os +Israelitas (como atraz vimos); e o terrivel Sennacherib. Reinando Sarac, +Nabopolassar (governador da Babylonia) ligou-se com Cyaxaro I, rei dos Medos, e +ambos foram pôr cerco a Ninive. Esta cidade foi tomada depois de uma sangrenta +batalha, e completamente destruida. Assim acabou, depois de 1:800 annos de +existencia, esta celebre e opulenta cidade. Nabopolassar tomou o titulo de rei +da Babylonia, que se appropriou de toda a importancia e vantagens que +desfructava Ninive e se tornou a capital do segundo imperio assyrio.</p> + +<p>Nabuchodonosor succedeu a seu pae Nabopolassar, tonando-se<span +class="pn">{26}</span> celebre pela conquista do reino da Judéa e pela tomada +de Jerusalem (cujos habitantes levou captivos para Babylonia) e por se haver +apoderado da Phenicia e destruido a cidade de Tyro. Balthazar foi o ultimo rei +do segundo imperio assyrio que, subjugado por Cyro, cahiu no dominio dos +Persas.</p> + +<p>A civilização dos Assyrios e Babylonios foi uma das mais notaveis, não só da +Antiguidade Oriental, mas tambem de toda a Historia Antiga. Ao passo que vão +progredindo os estudos historicos e que se vão descobrindo novos monumentos, +vai-se pondo cada vez mais em relevo a influencia que aquelles povos exerceram +no Oriente e na cultura intellectual das populações da Grecia. A civilização +dos Assyrios e a dos Babylonios apresentam-se-nos como uma só, quer isso fosse +devido á commum origem dos dois povos, quer á mutua transmissão de +conhecimentos e de usos nos tempos historicos, podendo dizer-se que havia então +homogeneidade de meio. Apenas differem em pontos, a que os differentes +caracteres dos dois povos imprimiam feições especiaes. Os Assyrios, por +exemplo, eram sobretudo guerreiros, corajosos e intrepidos, incançaveis nos +exercicios mais violentos e conquistadores insaciaveis; os Babylonios, +comquanto tambem fossem bons soldados, tinham menos tendencia para a guerra de +conquista, o que em parte dá a razão de ter sido tão pouco duradoiro o seu +dominio. Os Babylonios representaram um papel muito importante no commercio da +Asia. Na industria, elles e os Assyrios adeantaram-se consideravelmente, +chegando a notavel perfeição, sobretudo no que tocava a tecidos preciosos, a +ourivesaria, a loiça, a esmaltes, etc. De esculptura deixaram os Assyrios obras +de alto valor e merecimento artistico, sempre admiradas e tidas como objectos +de grande estimação.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0025">CAPITULO IV<br> +OS PHENICIOS</a> </h1> + +<p>Os Phenicios foram um dos povos mais notaveis da Antiguidade Oriental; mas, +apezar d'isso, escasseiam bastante os documentos historicos directos da sua +civilização. A Phenica comprehendia apenas uma estreita faixa de terreno, entre +as faldas do monte Libano e o mar Mediterraneo. N'aquella apertada<span +class="pn">{27}</span> zona teve a sua evolução um dos movimentos civilizadores +da Antiguidade, cuja influencia se sente de modo consideravel na Historia +Antiga e chega ainda até nós, por meio do alphabeto, pelos Phenicios inventado +e propagado.</p> + +<p>Os Phenicios são geralmente considerados como um povo pertencente á raça +chamitica, tendo grandes affinidades com as tribus cananéas que, uns vinte e +quatro seculos antes de Christo, se estabeleceram, disseminando-se, nos valles +do Jordão e do Oronte, e nas margens do Mediterraneo. Comtudo elles falavam uma +lingua da familia dos semitas, muito similhante á dos Hebreus,—e as suas +relações com os povos semiticos da Palestina foram sempre muito estreitas.</p> + +<p>Em nenhuma epocha da sua historia apparecem os Phenicios com uma unidade +nacional caracterizada, como os povos de que anteriormente tratámos. Viveram +sempre em cidades separadas, com chefes independentes, de jurisdicção limitada +a certa porção de territorio. Era o ultimo limite da descentralização +governativa. Comtudo sempre uma cidade exerceu hegemonia entre todas as outras +povoações phenicias. As duas cidades que, como grandes centros politicos e +commerciaes, exerceram successivamente essa hegemonia foram Sidon e Tyro. D'ahi +provêm a divisão da historia da Phenicia em dois periodos: o <em>sidonio</em> e +o <em>tyrio</em>.</p> + +<p>No primeiro periodo, Sidon (que foi a mais antiga das cidades phenicias de +que ha memoria nos livros dos historiadores) exerceu a supremacia da influencia +sobre as demais populações, organizou grandes expedições maritimas e teve um +grande movimento de expansão colonizadora. Thutmés I, rei do Egypto, fez +acceitar pelos Phenicios a sua suzerania; mas esse facto foi-lhes antes util do +que prejudicial, porque lhes proporcionou a faculdade de commerciarem no +Egypto, passando a estabelecer feitorias nas cidades do <em>delta</em>, e +chegando até a terem uma colonia sua estabelecida n'um bairro especial de +Memphis, por elles exclusivamente habitado. N'essa epocha navegaram por todo o +oriente do Mediterraneo, e chegaram até Chypre, sendo com o auxilio d'elles que +esta ilha ficou submettida ao dominio dos Egypcios. As suas tendencias e +habitos commerciaes levaram-n'os á ilha de Creta, á Cilicia e até ao Mar-Negro, +estabelecendo por toda a parte colonias e feitorias. No Occidente alargaram-se +pelo littoral do norte da Africa e estabeleceram colonias nos territorios em +que hoje existem as regencias de Tripoli e de Tunis. Cruzando-se alli com a +população indigena, deram origem ao povo dos liby-phenicos, que chegaram a +adquirir importancia<span class="pn">{28}</span> na Antiguidade. Pelo interior +da Asia extenderam as suas relações commerciaes até ao rio Tigre e á Arabia. +</p> + +<p>Pelo seculo <small>XIII</small> antes da era christan os Phenicios de Sidon +tinham chegado ao maximo estado de adeantamento e de influencia. Foram então +victimas dos Philisteus, que se haviam estabelecido entre a Phenicia e o +Egypto. Sidon foi tomada e destruida por estes; e a hegemonia phenicia passou +depois para Tyro, começando então o segundo periodo da historia d'este povo. +</p> + +<p>N'esse novo periodo, Tyro, succedendo a Sidon como centro do dominio +colonial dos Phenicios, elevou-o bem depressa ao auge da prosperidade. A +direcção, porêm, que imprimiu ao movimento de expansão colonizadora teve que +ser diversa. As populações gregas tinham-se ido desinvolvendo pelas duas +margens do mar Egeu, e não só obstaram a que os Phenicios fossem por alli +estabelecendo novas colonias, mas chegaram a desalojál-os de algumas posições +adquiridas. Por isso os Tyrios tiveram que abandonar aquelle caminho e trataram +de espalhar-se para os lados do occidente do Mediterraneo, que ainda estava +desimbaraçado. Foi assim que se occuparam em estabelecer colonias e feitorias +na Sicilia, na Sardenha, na Corsega, em Malta, nas ilhas Baleares, nas costas +da Gallia, e nas da peninsula iberica, ao mesmo tempo que na margem meridional +do mesmo mar alargaram tambem os seus dominios, fundando as cidades de Utica e +de Hippona. Por fim, transpuseram o estreito hoje chamado de Gibraltar, indo +fundar estabelecimentos pela costa occidental da Europa, onde se suppõe que +chegaram ás costas da Gran-Bretanha, e indo tambem para o sul, onde talvez +chegassem a aportar ás ilhas Canarias e ás de Cabo-Verde.</p> + +<p>Então o poderio phenicio chegou ao maximo esplendor e teve a sua edade de +oiro. Reinava Hirão I, que foi contemporaneo dos reinados de David e de Salomão +nos Hebreus. Com estes reis teve elle alliança e por tal modo promoveu a +grandeza phenicia, que a influencia d'esta chegou a sentir-se consideravelmente +em Jerusalem, onde Astarte (uma divindade dos Phenicios) teve culto, sendo esse +um dos actos de idolatria, com que por vezes os Israelitas offenderam a Deus. +</p> + +<p>Logo depois se começou, porêm, a manifestar a decadencia da Phenicia. Duas +causas poderosas concorreram para ella: as luctas civis dentro de Tyro, com +successivas revoluções, e os progressos das navegações e da colonização dos +Gregos que vieram a deslocar as dos Phenicios. N'uma d'aquellas resoluções, que +occorreu durante a menoridade do rei Pygmalião,<span class="pn">{29}</span> foi +assassinado o regente do estado e teve que expatriar-se sua viuva Elisa, que +com os seus partidarios foi para a Africa, onde fundou a cidade de Carthago. +Esta Elisa é a rainha que figura com o nome de Dido na <em>Eneida</em> de +Virgilio.</p> + +<p>A diminuição do dominio no exterior e a fraqueza do poder no interior, +fizeram que a Phenicia fosse successivamente invadida pelos Assyrios, pelos +Babylonios e pelos Egypcios. Do dominio d'estes tres povos passou depois ao dos +Persas, a que se submetteu voluntariamente, e porfim veio a ser conquistada por +Antigono, um dos generaes de Alexandre Magno, que a assediou com uma numerosa +frota e a venceu, passando ella ao dominio d'aquelle imperador, que substituiu +na Asia a dominação dos Persas.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0026">CAPITULO V<br> +OS CARTHAGINEZES</a> </h1> + +<p>Crê-se geralmente que a cidade de Carthago foi fundada, (como acima +dissémos) por Dido, pelos annos 888 antes da era christan; comtudo ha quem +affirme que ella havia sido edificada antes, pelos annos 1059, por uma colonia +phenicia de Tyro.</p> + +<p>Seja como fôr, o que é certo é que os Carthaginezes apparecem-nos, pelos +annos de 540 antes de Christo, constituindo já uma republica de certa +importancia. N'essa epocha alliaram-se com os Etruscos e forneceram-lhes trinta +navios para o ataque da Corsega.</p> + +<p>A republica de Carthago tinha um senado e duas assembléas populares, que +elegiam os magistrados incarregados da administração civil e os generaes +incumbidos do commando dos exercitos. O senado era formado por todos os +cidadãos notaveis por sua edade, nascimento, riqueza ou merito pessoal.</p> + +<p>Carthago, nas suas guerras, empregava unicamente soldados extrangeiros +assalariados, para não despovoar a republica que occupava apenas uma limitada +área de 75 leguas quadradas, e para que os seus cidadãos não abandonassem o +commercio, que era a fonte da riqueza e do poderio do estado. A Numidia e a +Hespanha forneciam-lhe a sua cavallaria;<span class="pn">{30}</span> a Gallia, +a Liguria e a Grecia, a sua infanteria; e as ilhas Baleares, os seus +fundibularios, tão notaveis pela destreza.</p> + +<p>Os Carthaginezes foram senhores da Sardenha; tiveram estabelecimentos seus +na Hespanha e na costa da Sicilia. Eram habeis e ousados navegadores,—o +que, junto á vantajosa posição geographica de Carthago, foi causa do seu +ingrandecimento e riqueza.</p> + +<p>Durante dois seculos viveram em paz com os Romanos, com os quaes celebraram +tratados, que estabeleciam os limites reciprocos da navegação e regulavam o +commercio entre aa duas republicas. Mas a crescente prosperidade de Carthago +começou a inspirar inveja aos Romanos, e esse sentimento mais tarde ou mais +cedo devia accender a guerra entre as duas nações. Foi o que succedeu.</p> + +<p>Tendo-se originado guerra na Sicilia entre os Mammertinos e Hierão (rei de +Syracusa), pediram os primeiros soccorro aos Romanos, emquanto Hierão recorreu +ao auxilio dos Carthaginezes. Tal foi a causa das guerras entre Carthaginezes e +Romanos, conhecidas pelo nome de <em>guerras punicas</em> (do latim +<em>P[oe]eni</em>, que a principio queria dizer «<em>Phenicios</em>», mas que +mais tarde se ampliou em significação, comprehendendo os Carthaginezes). Houve +tres <em>guerras punicas</em> designadas por sua ordem chronologica: primeira, +segunda e terceira.</p> + +<p>A primeira guerra punica durou do anno 264 a 241 antes de Christo. N'ella os +Romanos, comquanto muito menos prácticos do que os Carthaginezes na arte de +navegar, começaram por uma brilhante victoria naval. Perto das ilhas de Lipari, +batteram a frota de Carthago e metteram-n'a a pique. A frota romana era +commandada por Duilio Nepote, a quem por isso Roma ergueu uma estatua. Cornelio +Scipião, general romano, expulsou os Carthaginezes da Corsega e da Sardenha. E +Regulo, depois de tomar Chypre, chegou triumphante deante de Carthago; mas, +vencido por sua vez por Xantippo (general lacedemonio que fôra em soccorro dos +Carthaginezes), foi aprisionado. Inviado, sob palavra, a Roma para que +negociasse a troca dos prisioneiros, Regulo aconselhou, pelo contrario, o +senado a que não intrasse em taes negociações,—pelo que, voltando a +Carthago, soffreu morte cruel.</p> + +<p>Metello, outro general romano, expulsou os Carthaginezes da Sicilia; mas, +emquanto isto se passava, a frota romana, commandada por Claudio Pulcher, era +completamente destruida junto de Lilybea. Por fim, depois de uma grande +victoria dos Romanos, commandados pelo consul Luctacio, sobre os Carthaginezes +sob o mando de Amilcar, celebrou-se<span class="pn">{31}</span> a paz com a +condição dos segundos cederem aos primeiros todas as ilhas situadas entre a +Italia e a Africa e pagarem-lhes durante dez annos um tributo annual de 2:200 +talentos.</p> + +<p>A segunda guerra punica teve a seguinte origem. Os Carthaginezes, para +compensação das perdas soffridas em resultado da primeira guerra, trataram de +alargar os seus dominios na peninsula hispanica. Amilcar Barcas subjugou uma +grande parte d'ella e Asdrubal edificou Carthagena. Os Romanos, que não podiam +ver com bons olhos o novo ingrandecimento dos seus rivaes, começaram a +inquietar-se com aquellas conquistas e exigiram dos Carthaginezes que firmassem +tratados, pelos quaes se obrigassem a não extender as suas conquistas alêm do +Ebro e a respeitarem Sagunto, que era alliada de Roma. Mas Annibal, filho de +Amilcar, depois de se haver apoderado de varias outras povoações, poz cêrco a +Sagunto e deatruiu-a. Isso foi motivo para a segunda guerra punica.</p> + +<p>Annibal, tomando a offensiva, invade a Italia e ganha differentes victorias, +chegando Roma (não obstante o talento do pro-dictador Fabio) a estar seriamente +ameaçada. Mas o senado de Carthago hesitou em mandar a Annibal os soccorros +pedidos; este teve que procurál-os na Sardenha, na Sicilia e na Macedonia, e +mandou ir da Hespanha seu irmão Asdrubal com um novo exercito de Hespanhoes e +de Gaulezes. A desorganização, a heterogeniedade d'estes elementos, e a sua +indisciplina, valeram aos Romanos nas apertadas circumstancias a que haviam +chegado. Alêm d'isso o soccorro levado por Asdrubal não poude chegar ao seu +destino, porque aquelle general, detido no caminho por um exercito romano sob o +mando dos dois consules, teve que dar-lhe batalha em que morreu, sendo +desbaratada toda a sua gente.</p> + +<p>Entretanto Publio Scipião com um exercito romano passou a Africa e foi +cercar a propria cidade de Carthago. Annibal teve que deixar a Italia para +acudir em soccorro da capital da sua patria, e alli foi derrotado nas planicies +de Zama. Passou-se isto no anno 202 antes da era christan. Esta victoria de +Scipião poz termo á segunda guerra punica.</p> + +<p>No seu regresso a Roma, Scipião foi alvo das mais esplendidas ovações, e +deram-lhe o cognome de <em>Africano</em>.</p> + +<p>Depois da paz de Zama, pode dizer-se que a existencia de Carthago foi uma +lenta agonia. Massinissa, rei da Numidia, expoliou-a de muitas povoações e de +grande extensão de territorio; os Carthaginezes appellaram para Roma, porque +Massinissa era alliado dos Romanos; mas o senado de Roma, promettendo-lhes<span +class="pn">{32}</span> justiça, deixou que aquelle rei permanecesse na posse +dos territorios de que se tinha apoderado. Para apparentar uma arbitragem, +inviou Catão a Carthago; mas este, vendo a cidade rica e prospera, sentiu +reviver o odio contra a rival de Roma. E voltando, sempre terminava os seus +discursos no senado pela phrase, que ficou celebre: <em>delenda Carthago</em> +(«deve ser destruida Carthago»). Tendo os Carthaginezes repellido um novo +ataque de Massinissa, Roma pretextou que houvera violação do tratado de paz de +Zama e declarou a terceira guerra punica, que, depois de varia sorte, terminou +por um cêrco a Carthago, no qual os Carthaginezes foram reduzidos pela fome. +Scipião Emilio, o segundo <em>Africano</em>, general romano, tomou a cidade e +arrazou-a. Commissarios do senado de Roma tomaram posse do territorio +carthaginez e fizeram d'elle uma provincia romana, com o nome de +<em>Africa</em>. Foi isto no anno 146 antes de Christo.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0027">CAPITULO VI<br> +OS SYRIOS</a> </h1> + +<p>Nada se conhece ao certo dos tempos primitivos da historia da Syria. A +historia dos seus reis confunde-se inteiramente n'aquella epocha com a dos +monarchas assyrios. Até ao desmembramento dos estados de Alexandre, a Syria foi +successivamente invadida pelos reis de Ninive, pelos de Babylonia, pelos Persas +em tempo de Cyro, e finalmente pelo dito Alexandre. Depois da morte d'este, +Nicator Seleuco (um dos seus generaes) começou a fundação do grande reino da +Syria, appellidado tambem «reino dos Seleucidas» do nome do seu fundador. A +Nicator Seleuco succedeu no throno Antiocho Soter, que bateu os Bithyneos, os +Macedonios e os Galates.</p> + +<p>O rei mais celebre da Syria foi Antiocho, cognominado o <em>Grande</em>. +Depois de ter conquistado a Judéa, a Phenicia e diversos outros paizes, +concebeu o plano de submetter ao seu dominio as cidades livres da Grecia +asiatica, Lampsaco, Smyrna e outras. Pediram estas cidades soccorro aos +Romanos, e estes inviaram embaixadores a Antiocho, convidando-o a que deixasse +aquellas cidades em paz e a que restituisse a Ptolomeu Philadelpho o territorio +que por conquista lhe tinha tirado. Antiocho respondeu, declarando guerra aos +Romanos. Seguiu-se uma lucta em que aquelle rei foi vencido por Scipião<span +class="pn">{33}</span> o <em>Asiatico</em>, que só lhe concedeu a paz depois +d'elle haver dado satisfacção aos Romanos. Mais tarde Antiocho Epiphanes +usurpou a Demetrio o throno da Syria; teve varias guerras com os extrangeiros e +tomou Jerusalem. N'aquella cidade mandou matar grande numero de habitantes, +roubou os vasos sagrados do templo; e, voltando á Syria, deixou a Judéa +governada, em seu nome, por seus generaes, que exerceram muitas perseguições +contra os Judeus. Ordenou por uma lei que todos os povos sujeitos ao seu +imperio usassem as mesmas superstições gentilicas seguidas n'este; e, depois de +ter profanado o templo de Jerusalem, mandou n'elle collocar uma estatua de +Jupiter Olympico. Por medo das perseguições, muitos Judeus abandonaram o culto +do verdadeiro Deus e lançaram-se no seio da idolatria; outros, fieis ás suas +crenças e ás suas leis, soffreram por isso tormentos crueis. Alguns d'estes +tornaram-se muito notaveis, pela sua corajosa resistencia ás ordens do +conquistador, e pelo valor com que soffreram o martyrio. O velho Eleazar, varão +de mais de 90 annos, foi apresentado em Antiochia ao rei Antiocho, como réu de +observar a lei moysayca e de não querer sacrificar aos falsos deuses. Não sendo +possivel obrigál-o a comer das carnes prohibidas nem a fingir que o fazia, foi +cruelmente martyrizado. Septe irmãos, conhecidos pelo nome de «Irmãos +Machabeus», juntamente com sua mãe, que os exhortava á perseverança na lei e na +fé, soffreram os mais atrozes supplicios até expirarem, desprezando as +promessas e as ameaças com que o rei os queria vencer.</p> + +<p>Mathatias (sacerdote da tribu de Levi), sendo já de edade muito avançada, +matou a um israelita que na sua presença, obedecendo ás ordens de um soldado de +Antiocho, ia para Sacrificar aos falsos deuses, e em seguida matou tambem o +mesmo soldado. Feito isto, retirou-se com seus cinco filhos Judas Machabeu, +João, Simão, Eleazar e Jonathas; e, juntando os Judeus que ainda seguiam o +verdadeiro Deus, foi restabelecendo por toda a parte o verdadeiro culto e +derrubando os altares e estatuas dos falsos deuses. Cahindo doente, recommendou +á hora da morte aos filhos que com as armas defendessem a patria e a religião +contra os tyrannos. Judas Machabeu tomou logo o commando das tropas; e, com +grande valor, foi lançando fóra da Judéa os Syrios. Venceu varios generaes de +Antiocho em differentes batalhas, e reparou e purificou o templo de Jerusalem. +Morreu entretanto Antiocho; e, ainda depois d'isso, Judas Machabeu proseguiu na +guerra contra os Syrios, dos quaes libertou completamente a Judéa.</p> + +<p>O ultimo rei da Syria foi Antiocho II. No seu tempo, o reino<span +class="pn">{34}</span> da Syria, que tinha durado por 238 annos, cahiu em poder +de Roma, da qual ficou sendo uma provincia.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0028">CAPITULO VII<br> +OS PERSAS</a> </h1> + +<p>É extremamente obscura e confusa a historia dos Persas anterior a Cyro, que +viveu no seculo <small>VI</small> antes da era christan. Está intimamente +ligada á dos Médos.</p> + +<p>Cyro era filho de Cambyses, rei da Persia, tributario dos Médos, de cujo rei +Cyaxaro II era sobrinho.</p> + +<p>Pela morte de Cambyses e Cyaxaro, Cyro succedeu-lhes nos governos e reuniu o +obscuro reino da Persia ao da Média. Sob o seu governo, foi a Persia um grande +imperio, ao qual estiveram sujeitos a Grande Asia, a Asia Menor, a Syria e a +Arabia.</p> + +<p>A Cyro succedeu seu filho, tambem chamado Cambyses. Sob o mando d'este +soberano ainda mais cresceu o poderio da Persia, que se accrescentou com a +conquista do Egypto. A causa da guerra entre as duas nações foi Cambyses ter +pedido a Amasis (rei do Egypto) sua filha em casamento, e este, inganando-o, +ter-lhe inviado, em vez d'ella, a filha de Apriés. Para tirar vingança de tal +affronta, Cambyses introu no Egypto, incontrou-se perto de Pelma com o exercito +egypcio, commandado por Psammenito (filho e successor de Amasis), batteu-o e +desbaratou-o. Depois apoderou-se de Memphis e de Sais; e em seguida imprehendeu +a conquista da Ethiopia. Para isso seguiu o curso do Nilo até Thebas, e d'alli +destacou 50:000 homens do seu exercito para irem combater os Ammonitas e +queimar o templo de Jupiter; mas aquella gente, tres dias depois da sahida de +Thebas, ficou toda sepultada nas areias do deserto, levantadas e revoltas por +um tremendo furacão. Tambem Cambyses se viu impedido de continuar a sua marcha +sobre a Ethiopia, por haver perdido, em resultado do calor e de privações de +todo o genero, as tres quartas partes do seu exercito e por ter depois soffrido +uma horrivel fome, durante a qual os soldados se devoravam uns aos outros.</p> + +<p>Cambyses no principio mostrára-se no Egypto com disposições para usar de uma +politica de conciliação para com os<span class="pn">{35}</span> vencidos, +chegando a adoptar os titulos e os trajos dos antigos Pharaós, e fazendo-se +iniciar nos mysterios de Osiris. Porém, depois do mallogro das suas tentativas +contra a Ethiopia e contra os Ammonitas, mudou completamente de systema e +mostrou-se animado de grande intolerancia e ferocidade. Saqueou e incendiou as +cidades e os templos; mandou assassinar os sacerdotes do boi Apis, o qual por +sua propria mão apunhalou; destruiu por toda a parte as imagens dos deuses; e +por fim sahiu do Egypto para se recolher á Persia. Quando chegou á Syria, +rebentou a revolta do falso Smerdis, um impostor que se inculcava como o irmão +de Cambyses (que este assassinára logo nos primeiros tempos do seu reinado). +Apressou-se em ir desmascarar o rebelde que usurpava o nome de seu irmão, que +elle sabia estar morto; mas, ferindo-se n'uma perna ao montar a cavallo, d'esse +ferimento lhe resultou a morte, succedida logo depois da intrada na Persia.</p> + +<p>Herodoto e outros historiadores pintam este Cambyses como um monstro de +ferocidade, e contam d'elle varios feitos atrozes, como o de ter assassinado +com um ponta-pé dado no ventre a sua irman Meroé (com quem tinha casado, +conforme ao uso da Persia, e que d'elle estava gravida).</p> + +<p>Morto Cambyses, succedeu-lhe no throno o falso Smerdis, que continuou a +fazer-se passar por seu irmão, e que era simplesmente o irmão de um mago, a +quem estava incumbida a administração do palacio real. Conseguiu reinar oito +mezes; mas, passados elles, septe dos mais poderosos chefes persas urdiram uma +conspiração, desmascararam-n'o, deram-lhe a morte, e acclamaram rei o mais +illustre entre elles (Dario, filho de Hystapes).</p> + +<p>No reinado de Dario os Babylonios revoltaram-se, e foram reduzidos á +obediencia pelo estratagema de um official persa chamado Zopiro que, havendo +mutilado voluntariamente o rosto, foi persuadir os Babylonios de que tinha sido +victima da crueldade de Dario. Admittido na cidade, abriu as portas ao exercito +persa. Dario intentou depois subjugar os Gregos; inviando contra elles um +numeroso exercito, commandado por seu genro Mardonio, exercito que foi +desbaratado por Milciades na planicie de Marathona. Quando Dario tinha +apparelhado novo exercito e se dispunha para segunda expedição, foi +surprehendido pela morte.</p> + +<p>Seu filho Xerxes, que lhe succedeu, poz-se á frente d'aquelle numeroso +exercito, cuja força alguns historiadores elevam a 1.700:000 homens, e de uma +esquadra de 1:200 navios,<span class="pn">{36}</span> dirigiu-se a atacar a +Grecia para vingar a derrota de seu pae em Marathona; mas foi completamente +derrotado na batalha de Salamina, e teve que tornar a passar o Hellesponto. No +anno seguinte, novo exercito, commandado por Mardonio e inviado com egual +intento contra a Grecia, foi desfeito junto de Platéa por Pausanias (general da +Lacedemonia), e por Aristides. Xerxes veio a morrer assassinado, no vigessimo +anno de governo, por Artabano (capitão da sua guarda). Succedeu-lhe seu filho +Artaxerxes que, constrangido por Cimon (filho de Milciades), que o venceu perto +de Chypre, teve que dar a liberdade aos Gregos da Asia.</p> + +<p>Depois d'elle reinou Dario II, que se alliou com Sparta contra Athenas; e a +este succedeu Artaxerxes Mnemon, cujo irmão, Cyro o <em>Moço</em>, se revoltou +contra elle, com o concurso de tropas gregas, terminando a revolta pela batalha +de Cunaxa, em que aquelle principe foi morto, facto a que se seguiu a celebre +«retirada dos dez mil» picturescamente descripta pelo historiador Xenophonte. +</p> + +<p>Pela paz de Antalcidas os Gregos da Asia tornaram a cahir sob o jugo dos +Persas—cujo imperio se ia, comtudo, progressivamente infraquecendo. O +ultimo rei foi Dario Codomano, no principio de cujo governo foi a Persia +invadida pelas tropas de Alexandre Magno, o qual, nas tres batalhas de Granico, +do Isso, e de Arbella, destruiu todo o poder d'aquella nação, que na ultima +d'ellas se rendeu á discreção do vencedor.</p> + +<p>Durante seis seculos permaneceu a Persia confundida no immenso imperio dos +Parthos; mas, no anno 228 da era actual, Artaxerxes, filho de um simples +soldado, tendo-se elevado pelos seus meritos ás mais altas dignidades, levantou +os Persas contra Artabano, ganhou diversas victorias e, sendo acclamado rei, +fundou o segundo imperio persa. Depois de haver reinado treze annos, com muito +discernimento e prestigio, morreu, legando a corôa a seu filho Sapor. Este +devastou a Mesopotamia, a Syria e a Cilicia; e ter-se-ia tornado senhor de toda +a Asia, se Odenato, rei de Palmyra e alliado dos Romanos, não tivesse obstado á +continuação das suas victorias e conquistas. Aprisionou o imperador romano +Valeriano ao qual, depois de o conservar por algum tempo captivo, mandou +esfollar em vida. Sapor foi, por sua vez, vencido por Odenato; e, tendo +regressado aos seus estados, foi pouco depois assassinado. Depois d'estes +acontecimentos foi successivamente infraquecendo o segundo imperio persa. No +seculo <small>IV</small> da era christan Sapor II tornou a fortalecêl-o com +suas conquistas,<span class="pn">{37}</span> mas por pouco durou essa epocha de +renascimento. O imperio recahiu bem depressa, e a decadencia foi progredindo +até ao momento em que no seculo <small>VII</small> a Persia foi subjugada pelos +Arabes.</p> + +<p>Os Persas foram celebres no tempo de Cyro pela sua austeridade e pela sua +coragem. As creanças (segundo conta Platão) recebiam uma educação propria para +d'ellas formar bons cidadãos, uteis á patria. Até á edade de dezesete annos +permaneciam fóra da casa paterna, intregues a educadores, especialmente +incumbidos de lhes inocularem no espirito os dictames da coragem e da virtude. +</p> + +<p>O imperio era dividido em provincias, governada cada uma por um +<em>satrapa</em>, que recebia directamente ordens do rei. Era tida em especial +consideração a agricultura, e muito honrados os que a exerciam; os cultivadores +mais activos e laboriosos eram recompensados e admittidos uma vez em cada anno +á mesa do soberano. A administração da justiça estava confiada a varões sabios +e prudentes, e os juizes que prevaricavam eram punidos com a pena de morte. A +legislação não se limitava a comminar penas contra os crimes e delictos; +tratava tambem de os evitar, inspirando o horror ao vicio e o amor á virtude. +</p> + +<p>Os Persas eram monotheistas; adoravam uma só divindade, que era Mithra (o +Sol); os emblemas da omnipotencia do Creador eram entre elles os fogos +sagrados, mantidos com o maior respeito e solicitude. Os <em>magos</em>, ou +sacerdotes, eram homens notaveis pelo seu saber, pela sua gravidade e pela +austeridade da sua vida; eram os sabios e os jurisconsultos da nação.</p> + +<p>Depois da epocha de Cyro, intregaram-se os Persas a todos os excessos de +devassidão; dissolveu-se a disciplina do exercito; os grandes da nação +abandonaram a existencia viril, que os distinguia, e cahiram na inacção e na +ociosidade, o que foi uma das principaes causas da decadencia e da quéda, do +imperio.<span class="pn">{38}</span></p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION0029">CAPITULO VIII<br> +OS INDIOS</a> </h1> + +<p>Dá a Geographia a denominação de India a uma extensa peninsula, situada ao +sul da cordilheira do Himaiaya, que é uma das de maior altitude no mundo. +Divide-se a peninsula em tres regiões differentes:—1.ª, o +<em>Hindustão</em> propriamente dito, constituido pelo territorio das duas +bacias do Indo e do Ganges;—2.ª, o <em>Deccan</em>, peninsula situada ao +sul d'aquella região e que termina no cabo Comorim;—3.ª, a <em>India +central</em>, constituida pela zona de planaltos, que se extende, do occidente +para o oriente, desde o mar de Oman até ao golpho de Bengala.</p> + +<p>As populações que habitam a vasta peninsula indiana podem classificar-se do +seguinte modo:—a raça aryana, ou hindú (Gujarati, Bengali, etc.), que é a +que predomina no Hindustão; a raça dravidica (Tamul, Telinga, Karnataka, etc.), +predominante no Deccan; os restos das raças primitivas (Ghond, Bhilla, Kolaria, +etc.), estabelecidos nas diversas regiões da India central.</p> + +<p>A historia da raça aryana divide-se em quatro periodos, que podem chamar-se: +<em>vedico</em>, <em>epico</em>, <em>brahmanico</em> e <em>buddhico</em>.</p> + +<p>No <em>periodo vedico</em>, e em epocha que não pode determinar-se com +precisão, uma parte do grupo dos Aryas orientaes destacou-se, constituiu uma +nação á parte (os <em>Hindus</em>), que se dirigiu para o valle de Cabul +(antigamente, Kubha), atravessou o rio Indo e extendeu-se pelas campinas de +Pendjab (antigamente, Panchanada).</p> + +<p>Grande numero dos hymnos que figuram no celebre <em>Rig-Veda</em> referem-se +a factos, que se passaram n'este primeiro periodo historico, caracterizado pela +immigração e pelo primitivo estabelecimento da raça aryana em terras da India. +Quando esta raça alli chegou, incontrou o territorio occupado por differentes +populações que, ou eram aborigenes, ou pelo menos tinham longo tempo de +habitação n'aquellas paragens. Parte d'estas populações foi absorvida e +assimilada pela raça invasora; outra parte foi pouco a pouco destruida em +luctas porfiadas de seculos. A principio os Aryas não formavam uma nação unica, +mas conservaram-se por muito tempo<span class="pn">{39}</span> divididos n'um +certo numero de tribus, as mais notaveis das quaes foram a dos +<em>Bharatas</em>, a dos <em>Iksuakus</em> e a dos <em>Pauravas</em>, que +chegaram ainda independentes até ao periodo historico seguinte, e vieram a ser +troncos das poderosas dynastias que então se estabeleceram em terras do +Hindustão.</p> + +<p>Durante todo o periodo vedico o viver dos Hindus teve a natureza pastoril, e +a sua organização sociologica distinguiu-se pelo caracter patriarchal. Ainda +entre elles não havia o regimen das castas, que só mais tarde veio a apparecer. +</p> + +<p>O periodo <em>epico</em> ou <em>heroico</em> decorreu desde que os primeiros +hindus intrados na India passaram o rio Sarasuati até que, deslocando-se +progressivamente, chegaram á foz do Ganges. Este periodo foi caracterizado pela +immigração continuada e pelas luctas entre os que primeiro tinham occupado uma +localidade e os que, vindo mais tarde, os obrigavam a abandonal-a e a progredir +na immigração.</p> + +<p>Deu-se durante este periodo um curioso phenomeno historico. Chegando os +primeiros hindus á peninsula indiana, por muito tempo limitaram a sua occupação +a uma zona de territorio que tinha por limite oriental o rio Sarasuati. Novas +tribus, descendo tambem o valle de Cabul, obrigaram as primeiras, que tinham +começado a estabelecer-se nas planicies de Pendjab, a abandonar as posições +primitivas e a ir successivamente immigrando de localidade em localidade. Isto +deu como resultado o phenomeno de uma enorme massa de população a deslocar-se, +com movimento lento e secular ao longo de uma vasta região, até que esse +progredir parou na imboccadura do Ganges.</p> + +<p>Estas deslocações successivas originaram grandes guerras entre as +differentes tribus; e não só essas luctas, mas tambem as que houve entre os +Hindus e os povos que primitivamente occuparam aquelles territorios, +assignalaram todo o periodo epico. A mais antiga das luctas conhecidas entre as +tribus aryanas é designada na Historia por «guerra dos dez reis», e deu-se +entre a tribu dos Bharatas (cabeça de uma confederação de dez nações, que tinha +por chefe o celebre Vishuamitra) e a tribu dos Tritsus (a que presidia o +egualmente celebre Vasista). Esta ultima tribu havia passado o Sarasuati antes +da das dez nações; e depois, tendo occupado territorio, oppunha-se á passagem +d'ella, que ia invadir-lh'o. Por occasião d'aquella guerra, conseguiu deter o +movimento dos rivaes; mas mais tarde viu-se obrigada a ceder o logar perante o +impeto, cada vez mais irresistivel, de novas ondas de população que invadiam a +India.<span class="pn">{40}</span></p> + +<p>Ao passo que as tribus invasoras iam occupando definitivamente territorios e +iam assentando posições, iam-se formando dynastias. As duas mais importantes +d'este periodo foram: a chamada <em>Solar</em>, que reinou sobre os Tritsus ou +Kosalas e teve a sua capital em Ayodhia; e a <em>Lunar</em>, que reinou sobre +os Bharatas e teve a sua capital em Hastinapura. Entre dois ramos da dynastia +<em>Lunar</em> houve uma tremenda guerra; foi entre os Kurus e os Pandus. +Depois de varias phases que a grande lucta apresentou, os Kurus foram por fim +inteiramente desbaratados pelos Pandus, que ficaram reinando em Hastinapura. +Com esta guerra terminou o periodo epico ou heroico.</p> + +<p>No <em>periodo brahmanico</em> os Pandus, vencidos os Kurus, ficaram +constituindo uma poderosa dynastia, á qual foi facil, com o andar dos tempos, +subjugar as diversas populações aryanas que occupavam aquella região. Formada +assim uma grande e opulenta nacionalidade, em breve esta se sentiu naturalmente +animada de tendencia expansiva, mandando successivas expedições a colonizar o +Deccan, o qual tentou conquistar arrancando-o ás nações dravidicas, que até +então o haviam occupado. A historia d'estas guerras deu assumpto ao grande +poema indio o <em>Ramayana</em> que tem por thema fundamental a conquista do +sul da India e da ilha de Lanká (hoje Ceylão) pelos Aryas. Nada, porêm, +positivo se apura n'aquelle poema com respeito aos factos intimos da referida +guerra,—porque o caracter do <em>Ramayana</em> é inteiramente mythico; e +só um grande esforço de interpretação chega a explicar os seus episodios e a +significação dos seus personagens.</p> + +<p>Alêm d'aquellas expedições, o interesse historico d'este periodo da historia +antiga da India concentrou-se todo na nova constituição social que n'esta +despontou e se veio a firmar e radicar com o tempo. A classe dos guerreiros, +que até então fôra a primeira em categoria e consideração, cedeu o logar á dos +sacerdotes, que ficou sendo a aristocratica e preponderante. O regimen que +desde aquella epocha dominou na India, e que ainda hoje alli tem profundas +raizes, é o chamado <em>regimen das castas</em>. Por esse regimen a sociedade é +dividida na India em quatro classes, religiosa e intransigentemente fechada +cada uma d'ellas a elementos extranhos, e dispostas hierarchicamente na fórma +seguinte:—1.ª a dos <em>brahmanes</em> ou sacerdotes;—2.ª a dos +<em>kshatrias</em> ou guerreiros;—3.ª a dos <em>vaishias</em> ou +commerciantes;—4.ª a dos <em>sudràs</em> (a infima) ou dos servidores. +Esta ultima julga-se que provêm dos restos da população aborigene, que os Aryas +não poderam anniquilar nem assimilar, e que so admittiram no seu corpo social +com aquella<span class="pn">{41}</span> fórma e aquelle mister degradantes. No +chamado «Código de Manu» está expressa e formulada esta fórma do regimen +estabelecido na sociedade indiana.</p> + +<p>Ao <em>periodo brahmanico</em> succedeu o <em>periodo buddhico</em>, que +fecha a historia antiga da India. N'este periodo a theocracia brahmanica +soffreu um grande abalo e teve que defender-se em lucta porfiada. No seculo +<small>VI</small> antes da era de Christo appareceu na India um homem de +talento extraordinario, que era ao mesmo tempo um propagandista audacioso e +infatigavel. Chamava-se Çakya-muni, era filho de um rajah de um paiz vizinho do +Nepaul, e teve o cognome (pelo qual ficou eternizado na Historia) de Buddha (ou +<em>sabio</em>). Philosopho de temperamento, aos vinte e nove annos de edade +abandonou o palacio paterno, as riquezas e o direito á realeza para viver no +deserto, investigando a verdade. Nove annos depois, fortalecido o espirito com +as meditações da solidão, voltou ao povoado; e começou a pregar nova doutrina +ás multidões, reunidas ao acaso. Por toda a parte orava,—expondo os seus +principios, (quer nas povoações, quer nos campos) á gente de todas as condições +sociaes. Servia-se na sua predica, de parabolas (o mesmo systema que depois foi +seguido por Christo). Apresentava a principio a sua doutrina como uma simples +reforma; mas ella tendia á ruina completa do brahmanismo, substituindo ao +regimen das castas o principio da egualdade de todos os homens perante a lei +moral, e ás falsas virtudes prégadas pelos brahmanes a práctica do bem. Ás +promessas de salvação (isto é, da união com a essencia divina) só concedida +pela religião antiga aos brahmanes, substituia a capacidade, para todos os +homens, de gozarem da bemaventurança, ganha por seus meritos e virtudes. Rompia +com o privilegio da casta dos brahmanes, para chamar ao sacerdocio os pobres e +os mendigos que quizessem dedicar-se á vida religiosa. A sua doutrina admittia +seis elementos de perfeição, que eram: a sciencia, que devia ter por objecto +distinguir os verdadeiros dos falsos bens; a energia, que devia consistir na +resistencia contra os nossos maiores inimigos, os prazeres dos sentidos; a +pureza, que era a victoria adquirida por aquella resistencia; a paciencia, que +consistia em soffrer os males imaginarios e os transitorios; a caridade, laço +de união entre os homens; a esmola, como consequencia necessaria da caridade. +</p> + +<p>Tão sympathica e tão santa doutrina, que tantos pontos de similhança tem com +a de Christo, não podia deixar de fazer, como fez, um proselytismo enorme.</p> + +<p>Assim prégou até aos oitenta annos, respeitando sempre a<span +class="pn">{42}</span> ordem estabelecida, e proclamando (como o fez mais tarde +Christo) que aos principes se devia dar o que lhes era devido. Por sua morte, +os discipulos reuniram os principaes discursos d'elle e convocaram o primeiro +concilio buddhico, em que tomaram parte 500 religiosos. Depois de septe mezes +de discussão, esse concilio assentou na fórma do culto e no corpo das +doutrinas, o que tudo ficou mais precisado em segundo e terceiro concilio, que +se reuniram, um no seculo <small>V</small> e o outro 150 annos antes de +Christo.</p> + +<p>Por fim os brahmanes, conhecendo o perigo eminente que já corria a religião +antiga e o edificio social, que elles haviam construido, e á sombra dos quaes +viviam e desfructavam commodidades, honras e distincções, começaram uma lucta +feroz contra o buddhismo, chegando a desincadear contra os seus proselytos uma +atroz perseguição. Entre outros anathemas, prégavam os brahmanes: «Que desde +Ceylão até ao Himalaya, coberto de neve, os buddhistas sejam exterminados. Quem +poupar a creança ou o velho, soffra a pena de morte». Esta perseguição deu +resultado na India, que voltou toda ao brahmanismo; mas o buddhismo espalhou-se +no Thibet (que é hoje o seu centro), na Mongolia, na China, na Indo-China e em +Ceylão. N'estes paizes conta ainda muitos milhões de seguidores, sendo comtudo +poucos os que practicam as doutrinas e os preceitos de Buddha na sua pureza. +</p> + +<p>A civilização indiana, toda com caracter religioso, não primou nem pelo +progresso das sciencias nem pelo das artes. Em sciencia, só a da grammatica e +da linguagem se desinvolveu consideravelmente; da arte só ficaram monumentos +grandiosos nas proporções, mas de pouca belleza artistica. Prosperaram, porêm, +algumas industrias entre os Indios.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION00210">CAPITULO IX<br> +OS CHINS</a> </h1> + +<p>Não se conhece a duração da sociedade chineza, á qual as suas tradições +maravilhosas attribuem 80:000 a 100:000 annos de existencia. O que é certo é +que o povo chinez é muitissimo antigo, havendo nas suas tradições mais ou menos +certas conhecimento de factos anteriores 3:500 annos a Christo,—e,<span +class="pn">{43}</span> desde o seculo <small>XXVI</small> da mesma era, +historia positiva que apresenta seguidos annaes.</p> + +<p>Ignora-se completamente quaes foram a origem e o modo de formação dos Chins, +habitantes do <em>Celeste Imperio</em> ou <em>Imperio do Meio</em>. Até ao +seculo <small>XXII</small> antes de Christo os imperadores eram electivos; +d'aquella epocha em deante estabeleceu-se o principio heriditario na successão, +modificado n'um ponto (e era que os grandes do imperio podiam escolher entre os +filhos do soberano defuncto o que julgassem digno de succeder-lhe).</p> + +<p>O imperador Yu foi fundador da dynastia dos <em>Hia</em>, que durou quatro +seculos e que acabou no meio de grandes desordens e de uma atroz tyrannia. A +segunda dynastia, a dos <em>Chang</em>, foi fundada por um principe de +merecimento superior cujas virtudes foram celebradas por Confucio, e veio a +acabar como a anterior, sendo o seu ultimo representante um tyranno abominavel, +desthronado por Wu-Wang, principe de <em>Tehéu</em>, que contra elle se +revoltou. Este, tomando o governo, reorganizou o antigo «tribunal da historia», +cujos membros gozavam de inamobilidade, que lhes assegurava a independencia. +Durante esta dynastia os reinos feudatarios da China, que já desde antiga data +existiam, augmentaram até ao numero de 125, e na China constituiu-se um +verdadeiro feudalismo. Este, porêm, acabou em perfeita anarchia; o imperador +chegou a absoluta impotencia, e um dos seus feudatarios offereceu sacrificio ao +céu (prerogativa exclusiva do soberano), e prendeu no palacio o ultimo +imperador d'aquella dynastia. Começou nova dynastia, a dos <em>Thsin</em> que, +destruindo todos os pequenos principados, reconstruiu com sua unidade e poderio +o grande imperio. Um imperador d'ella, Chi-Hoang-Ti, concluiu aquella +transformação, abriu grande numero de estradas, perfurou montanhas e, para +impedir as correrias dos Tartaros nomadas, mandou construir a <em>grande +muralha</em>, que mede 2:500 kilometros de comprimento. Tornou-se porêm, +tristemente celebre pela perseguição dos lettrados e pelo incendio dos livros. +Na sua enorme vaidade, queria que tudo datasse do seu reinado e pretendeu assim +apagar os vestigios do passado. Não poude, felizmente, matar todos os sabios, +nem destruir todos os livros. A monarchia chineza, que n'aquella data foi +perturbada por tão violento e insensato reformador, voltou depois á sua +tradicional quietação; os sabios recuperaram a sua influencia; e o paiz +augmentou consideravelmente em prosperidade. Mas depois, minada por vicios de +dissolução interior, não teve força para resistir ás invasões<span +class="pn">{44}</span> dos Mongoes que, transpondo a grande muralha, foram +causa da divisão da China em dois reinos, separados pelo rio Azul, e nos quaes +houve differentes dynastias, que todas tiveram uma existencia obscura. Li-Ang +tornou a reunil-os no anno 618 da era actual; mas não conseguiu robustecer o +imperio restaurado, de modo que pudesse resistir ás repetidas Invasões +mongolicas. Estas invasões continuaram durante a Edade-Média, e são já +estranhas ao assumpto do presente livrinho.</p> + +<p>É a civilização da China uma das mais antigas que se conhecem; mas, apezar +d'isso, é a que menos tem progredido ou, melhor diremos, a que por maior +decurso de tempo tem permanecido estacionaria. Tem sido causas d'esse +estacionamento o temperamento proprio da raça chineza, a sua fórma de governo, +a sua religião e o isolamento em que a nação se tem conservado a respeito do +resto do mundo.</p> + +<p>A fórma de governo tem sido sempre como que patriarchal. O imperador é +simultaneamente soberano e pae de todos os seus subditos, que de um extremo a +outro do imperio formam uma unica familia, sem distincção de castas ou +hierarchias. As doutrinas de Confucio têem contribuido principalmente para +conservar ás instituições chinezas a sua estabilidade.</p> + +<p>Confucio viveu no seculo <small>VI</small> antes de Christo. Os seus livros, +sendo como que o evangelho do Imperio Celeste, são estudados por todos os que +têem que sujeitar-se aos exames que habilitam para os titulos litterarios e +para o exercicio dos cargos publicos. Confucio não foi legislador, nem teve +auctoriade para promulgar leis; mas ensinou a «sabedoria». E na práctica das +doutrinas por elle professadas assenta todo o edificio politico e religioso na +China.</p> + +<p>Segundo elle, a moral dos antigos sabios, que é a da verdadeira e eterna +sabedoria, consiste na observancia das tres leis fundamentaes das relações +entre o soberano e os subditos, entre o pae e os filhos, e entre o marido e a +mulher; e tambem em practicar as cinco virtudes capitaes (que são: a +humanidade, isto é, uma caridade universal para com todos os individuos da +nossa especie sem distincção; a justiça, que dá a cada um o que lhe é devido, +sem favorecer um em prejuizo de outro; a conformidade aos ritos prescriptos e +aos usos estabelecidos, a fim de que os que formam a sociedade tenham uma +maneira commum de viver, e participem todos de eguaes vantagens e de eguaes +incommodos; a rectidão, ou a inteireza de espirito e de coração, que faz que +cada um busque a verdade, sem se deixar offuscar pelo interesse, proprio +ou<span class="pn">{45}</span> alheio; a sinceridade e boa fé, ou a lisura e +confiança, que exclue toda a dissimulação e toda a falsidade, quer nos actos +quer nas palavras).</p> + +<p>Os seus principios religiosos fundamentaes são os seguintes. O céu é o +principio universal, a origem fecunda de que todas as coisas procederam. Os +nossos antepassados, d'elle oriundos, foram a origem das gerações seguintes. +Dar ao céu testemunhos de agradecimento é o primeiro dever do homem; mostrar +gratidão aos antepassados é o segundo. É por isso que Fou-Hi estabeleceu +ceremonias em honra do céu e dos antepassados.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION00211">CAPITULO X<br> +OS GREGOS</a> </h1> + +<p>Na Antiguidade, a Grecia propriamente dita era apenas uma região constituida +por uma pequena porção de territorio do continente europeu, e pela peninsula +que na bacia Oriental do Mediterraneo termina o mesmo continente, entre o mar +Jonio ao occidente e o mar Egeu (hoje denominado Archipelago) ao oriente. +Tambem pertenciam á Grecia as numerosas ilhas que ha nas proximidades d'aquella +região. As diversas populações que na Grecia vieram a ter importancia historica +derivaram-se todas da raça aryana, da qual constituiam um grupo especial (o +hellenico). Este grupo, pela brilhante civilização que no seu seio se elaborou, +constitue um dos mais nobres da historia, e formou uma individualidade +distinctissima atravez dos seculos.</p> + +<p>Na obscuridade dos primitivos tempos, parece que os primeiros habitadores da +Grecia foram os Pelasgos e os Jonios. Os primeiros povoaram com suas tribus a +Asia Menor, a Grecia e a Italia, lançaram n'estes paizes os primeiros +fundamentos da civilização, e por toda a parte deixaram nos seus monumentos +provas eternas da sua actividade e das suas poderosas aptidões. Desappareceram, +porêm, sem que sobre o seu destino ulterior haja tradição segura.</p> + +<p>Quando a Grecia apenas sahia do estado selvagem, vieram (segundo antigas +tradições) colonias dos paizes mais civilizados da Asia e da Africa trazer-lhe +os conhecimentos das artes uteis e uma religião mais pura. Foi assim que +Cecrops,<span class="pn">{46}</span> oriundo do Egypto, desimbarcou na Attica, +reunindo os habitantes d'ella em diversas povoações, das quaes Athenas veio a +ser a capital; ensinou-lhes algumas culturas, promulgou as leis do casamento e +instituiu o tribunal do Areopago, destinado a julgar os pleitos. Do mesmo modo +na Beocia, Cadmo introduziu o alphabeto phenicio e edificou Cadméa, emtorno da +qual se elevou mais tarde a cidade de Thebas. Dano introduziu em Argos algumas +das artes do Egypto; e Pelops, phrygio, estabeleceu-se na Elida, d'onde a sua +raça se espalhou por toda a peninsula que d'elle tirou o nome. O acontecimento +dominante d'aquella epocha foi a invasão dos Hellenos que do norte da Grecia, +sua primeira habitação, se derramaram por todas as outras partes da peninsula, +á custa dos Pelasgos que foram absorvidos pela população invasora.</p> + +<p>Apoz esta epocha primitiva seguiram-se os tempos heroicos, em que homens de +grande valor physico percorriam a Grecia, para a libertar dos salteadores, dos +oppressores e dos animaes selvagens. Passando a sua vida a combater todos os +flagellos, aquelles heroes recebiam dos povos agradecidos as honras de +semi-deuses; mas muitas vezes abusavam da sua força e das suas vantagens +pessoaes. Entre outros foram notaveis Hercules e Theseu. Tambem ficaram nas +tradições poeticas: os Argonautas e a sua viagem aventurosa até á Colchida, em +busca do <em>vellocino de oiro</em>; os septe chefes que foram cercar Thebas, +infamada pelos crimes de [OE]dipo e pelas dissenções entre seus filhos; o sabio +Minos; etc.</p> + +<p>Foi n'este periodo que se deu a guerra de Troya. Esta cidade era a capital +de um poderoso reino estabelecido no noroeste da Asia Menor e o ultimo resto do +dominio dos Pelasgos. O celebre Páris, filho de Priamo (rei de Troya), fez uma +viagem ao Peloponeso e d'alli furtou e levou para a sua patria Helena, mulher +de Meneláu (rei de Esparta ou Lacedemonia). Pedindo-a depois o marido e os mais +Gregos aos Troyanos, estes negaram-se a intregál-a, pelo que lhes foi por +aquelles declarada a guerra. Quasi toda a Grecia com seus principes foi a esta +expedição, levando por general supremo o rei Agamemnon. Ás ordens d'este +principe iam Achilles (capitão de grande valor), Ajax Tellamonio, Ajax Oileu, +Diomedes, Menesteu, Ulysses (rei de Itaca), e Nestor (varão de edade já muito +avançada). Foi posto cêrco a Troya; mas durante quasi dez annos não houve +batalha decisiva. Troya, defendia-se e parecia disposta e habilitada a +continuar a defender-se com vantagem, não obstante a falta de Heitor, que a +commandava e que morreu ás mãos de Achilles.<span class="pn">{47}</span> Os +Gregos usaram por fim de um estratagema; fingiram retirar-se, deixando no +campo, como presente, um gigantesco cavallo de madeira, que os Troyanos +recolheram dentro de suas muralhas. Mas no corpo do animal occultavam-se os +mais bravos d'entre os Gregos, que assim se introduziram na cidade, cujas +portas abriram ao resto do exercito. Desse modo cahiu Troya, sendo Priamo +assassinado ao pé dos altares. Os principes gregos que não haviam morrido na +lucta, voltaram a caminho da sua patria; mas grandes infelicidades os +esperavam. Uns morreram na viagem; outros, como Ulysses, andaram muito tempo +desviados do caminho por ventos adversos; outros (como Agamemnon) ao chegarem +aos seus paizes, incontraram os thronos occupados por usurpadores, de que foram +victimas; outros, emfim, viram-se obrigados a ir estabelecer habitação em +regiões longiquas, como Diomedes e Idomeneu.</p> + +<p>Toda a historia d'esta epocha está tão eivada de fabula, que é quasi +impossivel apurar-se a verdade.</p> + +<p>Os oitenta annos que se seguiram á guerra de Troya foram todos occupados por +dissenções intestinas, que derrubaram as antigas dynastias, e transferiram a +preponderancia para as mãos de novos povos. Estas revoluções, e outras que mais +tarde houve, deram logar a varias correntes de emigração; e ao longo das costas +da Asia Menor, da Africa, da Sicilia, e da Italia, formou-se uma nova Grecia, +que cresceu e prosperou, e por muito tempo foi mais rica do que a metropole. +Foi assim que os Gregos se estabeleceram em Smyrna, Phocéa, Epheso e Mileto (na +Asia Menor); em Cyrena (na Africa); em Messina e Syracusa (na Sicilia); e em +Taranto, Napoles e Sybaris (na Italia). Nas colonias da Asia, em contacto com +as velhas sociedades do Oriente, começou a evolução civilizadora, de que +Athenas veio a ser mais tarde o brilhantissimo fóco.</p> + +<p>Mas, apezar de tão grande dispersão da população grega, apezar da divisão da +Grecia em tantos estados, a grande familia hellenica conservou a sua unidade +nacional, pela communidade da lingua e da religião, pela celebridade de alguns +oraculos (o de Delphos principalmente, ao qual concorria gente de todos os +pontos do mundo grego), e por algumas instituições geraes que conservavam +estreitos os laços moraes das populações entre si.</p> + +<p>Entre 800 e 700 annos antes de Christo, houve de notavel na Grecia o +apparecimento das leis de Lycurgo. Este personagem nasceu em Esparta. A viuva +do rei Polydecto, seu irmão,<span class="pn">{48}</span> offereceu-lhe com a +sua mão de esposa o throno de Esparta, com a condição d'elle matar seu sobrinho +Charilaus. Recusou-se a isso Lycurgo; e, como os grandes do reino se mostrassem +contra elle irritados pela sabia administração que usára como regente, durante +a menoridade do sobrinho, resolveu exilar-se e viajou por muito tempo, +estudando a legislação dos outros povos e voltando a Lacedemonia, depois de uma +ausencia de dezoito annos, com o intento de fazer adoptar reformas importantes +nas leis do reino. A pythonisa de Delphos apoiou com a sua auctoridade +religiosa as reformas propostas; e os Espartanos, fatigados das suas dissenções +intestinas, que laceravam o estado, acolheram-n'as favoravelmente.</p> + +<p>As leis politicas de Lycurgo mantiveram as relações estabelecidas entre os +Espartanos, como povo dominador, e os Laconianos, como povo subjugado. +Regularam os direitos da realeza distribuidos por duas casas soberanas; os do +senado, composto de varões de edade superior a sessenta annos; os da assembléa +geral, que podia acceitar ou regeitar as propostas feitas pelo senado ou pelos +reis; enfim, os dos <em>ephoros</em>, magistrados annuaes, que administravam a +justiça. As suas leis civis são muito mais notaveis e de muito maior alcance; e +tiveram por fim estabelecer a egualdade entre todos os cidadãos. Para chegar a +tal fim, dividiu elle as terras em 39:000 porções (30:000 para os Laconianos e +9:000 para os Espartanos). Para manter a egualdade entre os cidadãos, Lycurgo +prohibiu o luxo e a moeda de oiro e de prata; e instituiu as refeições +publicas, em que reinava a maior frugalidade. Vedou aos Espartanos o commercio +e a cultura das artes e das lettras, sujeitando-os todos a eguaes exercicios +physicos, com a mira de formar cidadãos robustos para a defesa da patria. Ao +mesmo fim era dirigida a educação das creanças, que mais pertenciam ao estado +do que á familia; a creança que nascia disforme, matavam-n'a.</p> + +<p>Acabadas por esta legislação rigorosa as discordias interiores, e +robustecida assim Esparta, concluiu esta a conquista da Laconia e imprehendeu a +do Peloponeso. Combateu a tribu dorica dos Messenios, com a qual teve duas +guerras, (uma que durou vinte annos e a outra dezesepte). As victorias n'estas +luctas alcançadas deram grande nomeada aos Espartanos, que no seculo +<small>VI</small> antes da era christan eram considerados como o primeiro povo +da Grecia.</p> + +<p>Pelo mesmo tempo florescia tambem Athenas, comquanto os defeitos da sua +organização social déssem origem a grande mal-estar interior e a repetidas +perturbações. A grande<span class="pn">{49}</span> desegualdade dos haveres +tinha dado origem á formação de duas classes: a dos <em>eupatridas</em>, ou +senhores das terras, e a dos <em>thetas</em>, ou servos que as cultivavam. Além +d'estas duas havia ainda a dos escravos propriamente ditos.</p> + +<p>A morte de Codro, ultimo rei dos Athenienses, deu logar a estabelecer-se uma +nova fórma de governo. Os dois filhos d'elle, Medon e Nileu, disputaram entre +si a corôa. Os Athenienses, que tinham sido sempre muito ciosos da sua +liberdade, aproveitaram este ensejo para a reivindicarem completamente; +declararam que depois de Codro não havia ninguem digno do titulo de rei e +puzeram á testa da republica um primeiro magistrado a que deram o nome de +<em>archonte</em>, e cuja auctoridade era muito limitada. Durante mais de tres +seculos foi esta magistratura vitalicia e hereditaria; no fim d'esse tempo +tornou-se electiva, e as funcções de <em>archonte</em> foram limitadas a dez +annos. Mais tarde ainda, o poder foi distribuido por nove <em>archontes</em>, +cujo mandato durava um anno. D'ahi provieram grandes dissenções, divisões de +partidos, rivalidades e desordens.</p> + +<p>Para obviar a tantos males viu-se que era necessario fazer leis, que fossem +superiores a todas as magistraturas. Foi escolhido para as formular Dracon, +homem de virtudes austeras e que gosava da estima geral. Dracon apresentou um +codigo de leis de tal severidade, que revoltaram os espiritos mais exigentes e +que não puderam ser executadas. Como novas dissenções puzeram em novo perigo o +estado, recorreu-se a Solon, varão illustrado e de grande patriotismo, a quem +foi dada a missão de fazer as necessarias leis e organizar uma constituição +fundada em principios racionaes e estaveis.</p> + +<p>Dividiu Solon o povo em quatro classes, segundo o rendimento de cada um. Os +cidadãos das tres primeiras classes eram os unicos que podiam exercer cargos +publicos; os da quarta, composta da infima plebe, eram admittidos a votar nas +assembléas publicas, das quaes se excluiam os estrangeiros. Decretou a pena de +morte contra todo o <em>archonte</em> que se embriagasse, e declarou excluido +da tribuna e indigno de falar ao povo todo o homem de vida depravada. +Estabeleceu que os <em>archontes</em> se informassem da occupação de todos os +cidadãos e que declarassem infames os que persistissem na ociosidade, depois de +por ella terem soffrido tres condemnações. Decretou que o estado sustentasse +até á edade de vinte annos todos os filhos dos cidadãos que morressem no +serviço da patria. Das leis draconianas apenas conservou as que eram<span +class="pn">{50}</span> dirigidas contra os assassinos. Não fez lei penal contra +o parricidio, porque não julgou possivel que tal crime se commettesse em +Athenas. Para tornar duravel a sua legislação, fêl-a gravar toda em pranchas de +madeira, e depois sahiu de Athenas por algum tempo para ir estudar a sabedoria +das antigas nações do Oriente.</p> + +<p>Quando regressou, notaveis acontecimentos o esperavam. Os partidos tinham +re-apparecido e das luctas entre elles tinha surgido a tyrannia de Pisistrato, +o qual, sem abolir a constituição, exercia tal influencia, que dominava todos +os magistrados. Pisistrato duas vezes foi expulso do poder e de Athenas; mas +duas vezes conseguiu recuperar o governo, que por fim conservou até á morte. +Depois d'esta succederam-lhe seus dois filhos Hipparco e Hippias, que +governaram conjunctamente; mas em seguida houve novas e continuadas dissensões, +até ao tempo de Themistocles, no qual a Grecia, ingrandecida com as conquistas +de Milciades e arvorada já em verdadeira potencia maritima, viu ainda o seu +poder naval accrescentado com 200 navios, mandados construir com o producto das +minas de prata de Laurion.</p> + +<p>Foram esta armada poderosissima, e o valor e pericia dos seus generaes, que +salvaram a Grecia das expedições contra ella organizadas por Dario e Xerxes, de +que já falámos no capitulo VII d'este livrinho.</p> + +<p>Foi sobre todos notavel na Grecia o periodo d'estas guerras e o tempo que se +lhes seguiu. Appareceram então distinctissimos generaes, e excellentes +estadistas; e o povo grego, não obstante o seu animo irrequieto e o seu +espirito sedicioso, parece que reprimiu todos os ardores que podiam ser +prejudiciaes á causa publica, para só dar livre curso a todas as tendencias +conducentes ao ingrandecimento da patria e á sua victoria contra os ataques dos +inimigos.</p> + +<p>Por esta epocha appareceu Pericles—homem de tal merito, que deu o seu +nome ao seculo em que viveu e em que a Grecia foi o grande fóco da civilização +do mundo.</p> + +<p>Era filho de Xanthippo, o vencedor de Mycale. Educado pelos sabios mais +notaveis do seu tempo, mostrou-se desde a adolescencia muito instruido em todos +os ramos do saber humano. Apesar de estar pelo seu alto nascimento destinado a +ser chefe do partido aristocratico, que no começo da vida d'elle tinha a maior +influencia em Athenas, esposou a causa do povo, fazendo-se chefe do partido +democratico. Fez reformas profundas, em que cerceou as attribuições dos altos +poderes do estado em beneficio do povo. Em virtude d'essas reformas,<span +class="pn">{51}</span> todas as funcções publicas, ainda as mais elevadas, +ficaram sendo accessiveis aos cidadãos mais humildes, contanto que a sorte ou a +eleição a ellas os chamassem.</p> + +<p>Como o imperio sujeito á pequena cidade de Athenas fosse demasiado vasto, +para que ella pudésse mantêl-o sujeito, Pericles expediu numerosas colonias que +não formaram, como as anteriores, cidades independentes da metropole, mas sim +fortalezas e estabelecimentos militares que mantinham na sujeição a Athenas os +paizes onde existiam.</p> + +<p>Não teve Pericles sómente em vista a grandeza e o poderio de Athenas; cuidou +tambem da gloria d'ella. Chamou para alli todos os homens eminentes que então +havia na raça hellenica, os quaes todos para lá concorreram, como para a +capital da intelligencia. Celebravam-se alli festas esplendidas, que attrahiam +enorme concurso de todas as povoações gregas.</p> + +<p>Athenas chegou assim a ser um dos mais intensos fócos de civilização que o +mundo tem visto. Ao lado do eminente vulto de Pericles, viram-se então alli +brilhar: Sophocles e Euripedes, dois dos maiores poetas tragicos conhecidos; +Lysias, orador eloquentissimo; Herodoto, narrador admiravel; Aristophanes, o +maior poeta comico da Antiguidade; Phidias, o mais illustre dos seus artistas; +Apollodoro, Zeuxis, Polygnoto e Parrhasios, pintores bastante celebres; +Anaxagoras e Socrates, philosophos notabilissimos. Ainda depois d'estes vultos +de primeira ordem vieram Eschylo, Thucydides, Xenophonte, Platão e Aristoteles. +Athenas teve por aquella epocha, a honra de ser não só a «mestra da Grecia», +como lhe chamaram, mas tambem a mestra do mundo.</p> + +<p>Depois de vencida a batalha de Salamina, tinha-se Athenas collocado á frente +de uma confederação dos gregos insulares e asiaticos, afim de proseguir na +guerra contra os Persas; mas tendo-se os sitiados cançado de combater, havia +ella acceitado os seus tributos em vez de contingentes militares e continuára +por si só a sustentar a lucta, no interesse commum. Depois da guerra, continuou +a cobrar os mesmos tributos, pretextando que precisava estar prompta para +impedir uma nova invasão. Os alliados, com o tempo, intenderam que era duro +estar a pagar para as festas e para os monumentos de Athenas; e queixaram-se. +As suas queixas, porêm, foram duramente repellidas, pelo que elles dirigiram as +suas supplicas a Esparta. Esta, ciosa sempre da grandeza e das glorias de +Athenas, procurou formar uma liga continental, cujas forças oppuzesse ás das +cidades maritimas e insulanas sujeitas aos Athenienses. A principio houve só +hostilidades<span class="pn">{52}</span> parciaes; mas mais tarde tornou-se +geral a guerra, depois do ataque de Platéa (alliada dos Athenienses) pelos +Thebanos (alliados de Esparta). Essa lucta é conhecida pela designação de +«guerra do Peloponeso».</p> + +<p>Durante dez annos correu esta guerra, com vantagem ora para uma ora para +outra das contendoras, até que Nicias assignou um tratado de paz, que tem o seu +nome. A paz, porêm, contrariava os calculos de Alcibiades, que contava com a +guerra para se elevar; por isso propoz este a expedição á Sicilia, que teria +sido bem succedida, se elle, accusado de sacrilegio, não fosse privado do +commando do exercito. Alcibiades retirou-se então para Esparta, d'onde dirigiu +duros golpes contra a sua patria. Os Athenienses puzeram cêrco a Syracusa; mas, +em resultado da pouca energia de Nicias, tal cêrco terminou pela destruição da +esquadra e do exercito atheniense, cujos chefes foram mortos pelos Syracusanos +e os soldados reduzidos á escravidão. Este desastre foi um enorme golpe para +Athenas.</p> + +<p>Comtudo a guerra continuou; e os Athenienses ainda por vezes obtiveram +vantagens, que obrigaram Alcibiades a fugir de Esparta. Entretanto em Athenas +rebentou uma revolução, na qual a democracia foi sacrificada a um conselho +superior composto de 400 membros, que substituiu o senado, e a uma reunião de +5:000 cidadãos escolhidos, que substituiu a assembléa do povo; mas pouco depois +um exercito que operava em Samos fez uma contra-revolução, restabelecendo o +governo democratico e acclamando Alcibiades. Este foi chamado a Athenas, e com +a sua vinda restabeleceu-se a auctoridade do povo. Os Athenienses ganharam duas +batalhas navaes no Hellesponto, uma grande victoria, tanto em terra como no +mar, em Cyzica, e por fim tomaram Byzancio. Estas victorias foram, porêm, o +resultado de um grande esforço, que exhauriu o resto da vitalidade de Athenas. +</p> + +<p>Cyro o <em>Moço</em>, que buscava a alliança de Esparta, para arrancar a seu +irmão Artaxerxes II a corôa da Persia, forneceu a Lysandro, que governava em +Esparta, grandes recursos para levar a cabo a guerra. Com este auxilio, os +Espartanos derrotaram os Athenienses em Egos-Potamos; e pouco depois Athenas +foi tomada, as suas fortificações arrazadas, a sua marinha reduzida, +desorganizado o seu exercito e abolida a constituição democratica, que +principalmente concorreu para a sua grandeza e para a sua gloria.</p> + +<p>A hegemonia grega passou para Esparta, que não soube usar d'ella com a mesma +habilidade e esplendor com que o<span class="pn">{53}</span> fizera Athenas. +Cyro o <em>Moço</em> levou por deante o seu plano com o auxilio dos Espartanos, +avançou até ao pé de Babylonia, onde ganhou a batalha de Cunaxa; mas foi morto, +e á sua morte seguiu-se a retirada chamada «dos dez mil» a que já nos +referimos, operada atravez de 400 leguas de terreno, pelas montanhas impervias +da Mesopotamia e da Armenia até ao Mar-Negro. O exito d'esta retirada revelou o +infraquecimento do grande imperio persa; por isso, poucos annos depois o +espartano Agesilau, resolveu conquistál-o. Chegou a reunir grandes forças e +muitas allianças, mas o seu plano ficou frustrado, porque os Persas tiveram +artes de suscitar guerra interior no seio da propria Grecia. Por sua +instigação, Corintho, Thebas e Argos formaram uma liga, em que intraram tambem +Athenas e a Thessalia. Agesilau, regressando da Asia, conseguiu vantagens em +terra, restabelecendo o dominio de Esparta; mas o atheniense Conon, commandante +de uma frota phenicia, arrancou-lhe das mãos o dominio maritimo e com o oiro +dos Persas, restaurou as fortificações de Athenas.</p> + +<p>Esparta, inquieta pelo renascimento da sua rival, inviou mandatarios á +Persia, a tratar com ella dos meios de lhe intregar os gregos da Asia, +acceitando todas as condições. Era o resultado do abatimento moral e da +depravação que tinha ganhado a raça hellenica. Destruiu algumas cidades e +perseguiu diversas populações sujeitas a Athenas, até que os seus excessos +tiveram um castigo. Um dos seus generaes surprehendeu e tomou á falsa fé +Cadmea, cidadella de Thebas, que era então alliada de Esparta. O thebano +Pelopidas, á frente de alguns proscriptos, libertou, porêm, a sua patria, e +reuniu n'uma alliança commum todas as cidades da Beocia. Tendo os Espartanos +mandado contra estes povos colligados um exercito, Epaminondas desbaratou-o na +batalha de Leuctras, levando a guerra até ao seio do Peloponeso. Abriu caminho +até aos muros de Esparta, na qual, comtudo, não poude intrar; mas, para a +conter em respeito, edificou aos seus lados Megalopolis e Messena, dois optimos +pontos fortificados. Esparta procurou por toda a parte alliados contra estes +novos dominadores da Grecia; mas Epaminondas em activa guerra sustentou firme a +dominação de Thebas, dominação que veiu a cahir com elle, morto no meio da sua +victoria de Mantinéa.</p> + +<p>Poucos annos depois, Filippe da Macedonia, tendo libertado o seu paiz do +jugo e da influencia dos extrangeiros, quiz ingrandecêl-o, accrescentando-lhe a +Grecia. Tomou e submetteu differentes povoações, com que foi augmentado o seu +imperio, observando-se por toda a extensão da Grecia uma<span +class="pn">{54}</span> grande falta de energia e um fraco espirito de +resistencia. Só os Athenienses velavam pela patria commum, guiados pelo grande +cidadão e grande orador Demosthenes, que nas suas eloquentes orações mostrava +os planos ambiciosos de Filippe. Mas Athenas não poude sustentar por si só, +durante longo tempo, uma lucta tão desegual, e por fim teve que firmar, por +conselho do proprio Demosthenes, um tratado de paz com o rei da Macedonia.</p> + +<p>Emquanto Athenas, descançando na fé d'este tratado, se abandonava ás festas +e ás suas occupações ordinarias, Filippe transpoz as Thermophylas, penetrou na +Phocida, e conseguiu ser adimittido no conselho amphictionico. Os Athenienses +salvaram ainda Perintho e Byzancio, ás quaes Filippe seria obrigado a levantar +os cêrcos. Á voz de Demosthenes, que não cessava de lhes mostrar os perigos, +nas suas immortaes <em>Filippinas</em>, os Athenienses e os Thebanos, +esquecendo a sua mutua rivalidade, reunem os seus exforços para opporem ao +inimigo commum; mas o seu exercito, commandado por generaes inhabeis e talvez +vendidos ao oiro de Filippe, foi desbaratado n'uma grande batalha na planicie +de Cheronéa. Depois d'esta batalha, Filippe propoz-se captar a sympathia dos +Gregos, que tratou com as maiores blandicias, e conseguiu ser por elles nomeado +generalissimo das tropas destinadas a marchar contra a Persia. Para preparar +esta grande expedição voltou a Macedonia, onde foi assassinado por Pausanias +durante a celebração dos jogos olympicos.</p> + +<p>Succedeu-lhe seu filho Alexandre com vinte e um annos de edade. Tendo os +barbaros, que seu pai subjugára, tomado as armas, elle, para lhes estorvar os +movimentos, levou o seu exercito até ao Danubio, passou este rio n'uma noite e +derrotou os rebeldes. Julgando os Thebanos aquelle ensejo propicio para se +libertarem dos Macedonios, apoderaram-se da cidadella, cuja guarnição +degollaram. Alexandre reuniu logo um exercito, com que introu na Beocia, +exigindo d'elles que lhe intregassem os auctores da revolta. Como lh'os +recusassem, deu-lhes batalha, destroçando-os e tomando Thebas; que saqueou e +destruiu.</p> + +<p>Os Athenienses, receando então haver incorrido na colera de Alexandre, +mandaram-lhe emissarios a implorar clemencia. Este usou para com elles de +generosidade, da qual comtudo esperava tirar partido para os seus planos de +conquista; pacificou a Grecia e reuniu em Corintho deputados de todas as +republicas hellenicas, que o nomearam general em chefe de uma expedição contra +os Persas. Para levar d'esse modo a effeito<span class="pn">{55}</span> o plano +de seu pae, confiou o governo da Macedonia e da Grecia a Antipater e partiu com +um exercito de 30:000 homens de infanteria e 5:000 de cavallaria, á conquista +da Persia, onde então reinava Dario Codomano.</p> + +<p>Então começou para Alexandre uma serie de victorias e de conquistas, que +constituem uma verdadeira epopéa. Introu na Phrygia depois de atravessar o +Hellesponto sem difficuldade; na passagem do Granico, defendida por um exercito +persa de 100:000 homens de infanteria e mais de 10:000 de cavallaria, derrotou +este, apoderando-se depois de Sardes, que era a chave da Alta-Asia. Epheso, +Mileto, Halycarnasso e todas as cidades da costa da Asia intregaram-se-lhe.</p> + +<p>No anno seguinte, para se oppor á continuação das suas conquistas, levantou +Dario um grande exercito e resolveu levar a guerra ao coração da Macedonia. +Memnon, seu general em chefe, á testa da expedição, tomou as ilhas de Chio e de +Lesbos. Alexandre não quiz intregar ao acaso de um combate naval a gloria até +alli alcançada; abandonou aos Persas o dominio do mar e fez convergir todos os +seus exforços para se apoderar dos portos e cortar toda a communicação entre o +exercito inimigo e a Grecia. Tendo subjugado a Lydia, dirigiu-se para a +Pamphylia sem incontrar obstaculos; atravessou a Cappadocia, foi á Cilicia e a +Tarso, d'onde partiu ao incontro do exercito de Dario, que derrotou nos +desfiladeiros do Isso. A mãe, mulher e filhos de Dario cahiram em seu poder e +Alexandre tratou-os com a maior generosidade. Apoderou-se depois da Phenicia, e +tomou Tyro depois de septe mezes de cêrco. Subjugou em seguida a Judéa, e tomou +Damasco, onde estavam os thesouros de Dario. Intentou destruir Jerusalem, por +lhe haver recusado viveres; mas desistiu do seu proposito, em presença das +supplicas que lhe dirigiu o summo sacerdote Jaddo.</p> + +<p>Da Judéa dirigiu-se para o Egypto, onde bastou a sua presença, para que +todas as povoações se lhe intregasem. Foi até á imboccadura do Nilo, onde +lançou os fundamentos da cidade de Alexandria. Incaminhou-se para o +Alto-Egypto, penetrou no deserto e chegou até ao oasis em que estava +estabelecido o templo de Jupiter Ammon, e onde os sacerdotes lhe concederam o +titulo de «filho de Jupiter».</p> + +<p>Do Egypto voltou á Asia e penetrou na Armenia, indo ao incontro de um +terceiro exercito de Dario, que derrotou, apezar da grande superioridade +numerica d'este, intrando triumphante em Babylonia. Esta victoria tornou-o +senhor do grande imperio persa; e elle, para segurar as suas conquistas, +marchou<span class="pn">{56}</span> em persiguição de Dario que foi morto por +um traidor do seu proprio exercito, Besso, em Ecbatana.</p> + +<p>Alexandre tomou sob a sua protecção a familia de Dario; marchou contra +Besso, que se fizera proclamar rei em Bactriana, apoderou-se d'elle e mandou-o +matar. A posse do mar Caspio e as estradas militares que abriu para Herat e +para Nichapur patentearam-lhe as communicações com todos os differentes pontos +da Persia.</p> + +<p>Depois de ter assentado tão vasto dominio, resolveu passar á India. +Atravessou o Indo, alliou-se com o rei Daxilo e subjugou differentes estados +vizinhos d'este. Adeantou-se até ao interior da India, onde edificou diversas +cidades, e preparava-se para atravessar o Hyphaso, quando as suas tropas, +fartas de tão longo exilio e de tanta peregrinação, se recusaram a seguil-o e +lhe pediram para voltar á patria. Alexandre annuiu a este desejo. Depois do seu +regresso, ainda subjugou os Oxidracos e outros povos, percorreu a Média, e +introu em Ecbatana, onde falleceu o seu favorito Ephestion.</p> + +<p>Voltando a Babylonia, foi alli alvo do maior triumpho. Recebeu embaixadores +de todas as partes do mundo, acolhendo com especial agrado os da Grecia. Quiz +fundir os Gregos e os Persas n'um só povo, por meio de allianças e de colonias, +e espalhou por todo o Oriente as idéas, a litteratura e a civilização da +Grecia. Durante um anno elaborou esses planos, mas não poude pôl-os em +execução, porque veiu a morrer aos 39 annos de edade, no anno 324 antes de +Christo.</p> + +<p>Fallecido Alexandre, os Macedonios, depois de alguns dias de contestações e +de jogo de intrigas e de ambições, escolheram para rei a Arideu; mas bem +depressa se desfizeram d'elle, bem como da familia de Alexandre. Os generaes, +que haviam sido d'este, trataram de apoderar-se das conquistas que elle fizera, +e a partilha foi origem de uma guerra que veio a terminar com a batalha de +Ipso.</p> + +<p>Emquanto os successores de Alexandre disputavam entre si as conquistas da +Asia, a Grecia intentou recuperar a sua liberdade. Demosthenes, que ficára +sendo o inspirador do patriotismo e do partido nacional, promoveu a guerra da +independencia, que acabou por um desastre. O grande orador sendo proscripto, +invenenou-se no exilio. Com esta morte toda a esperança se perdeu. Ainda Arato +conseguiu restaurar a antiga confederação das cidades de Achaia; e essa +confederação ia talvez extender-se, para formar uma barreira perante as +ambições da Macedonia. Mas Esparta, que se tinha novamente elevado sob o +governo de Cleomenes, correu a imbargar-lhe<span class="pn">{57}</span> o +passo. Cleomenes foi vencido; porêm os Macedonios, que tinham auxiliado os +Acheus contra elle, ficaram outra vez preponderantes. Os Romanos começam a +inquietar-se com essa preponderancia, resolvem intervir, ganham a batalha de +Cynocephalo, dissolvem a confederação achaica, e declaram livres todas as +cidades da Grecia. Estas regosijam-se com o facto, sem comprehenderem que os +Romanos dividiam para dominar e absorver. Conheceram tarde o seu erro; e, +quando quizeram reconstruir a confederação e se armaram para resistir aos +Romanos, estes venceram a batalha de Leucopetra, junto de Corintho; esta cidade +foi queimada pelo consul Mummio, que commandava o exercito de Roma; a Grecia +foi declarada provincia romana, e o povo que a habitava, e que tão brilhante +papel representára na civilização do mundo, foi absorvido na grande massa das +populações sujeitas ao dominio de Roma. Ficou a Grecia sendo governada por um +pretor, nomeado annualmente pelo senado romano. Só Athenas conservou até ao +tempo do imperador Vespasiano uma constituição republicana.</p> + +<p> </p> + +<h1><a name="SECTION00212">CAPITULO XI<br> +OS ROMANOS</a> </h1> + +<p>A Italia, como a conheciam e designavam na Antiguidade, era constituida pela +peninsula alongada, existente no sul da Europa, que se prolonga com direcção +sueste entre os mares Adriatico e Tyrrheno e na extensão de 800 kilometros. +Tambem lhe pertencia a Sicilia (ilha d'ella separada por um pequeno estreito), +bem como a vasta planicie que se extende até á base dos Alpes (que é +atravessada pelo rio Pó e cuja metade superior era conhecida pelo nome de +Gallia Cisalpina). Aos pés das montanhas da Sabina, iam incontrar-se as ferteis +planicies do Lacio e da Etruria, sobre as margens do rio Tibre. A alguma +distancia da sua confluencia com o Arno, passa este rio entre novas collinas, +duas das quaes—o Janiculo e o Vaticano—dominam a sua margem direita +e as outras estão sobranceiras á esquerda. Foi alli que se edificou Roma.</p> + +<p>Durante muito tempo, e apezar da preponderancia que a população e os +estabelecimentos do Lacio adquiriram, conservou-se a peninsula dividida em +diversas nacionalidades, estabelecidas<span class="pn">{58}</span> nas +seguintes regiões do territorio; Liguria, Etruria, Campania, Lucania, Apulia, +Samnio, Umbria, etc. A unidade politica da Italia peninsular sómente veio a +realizar-se depois de um grande numero de tentativas e de esforços continuos e +pertinazes de Roma, para vencer as nacionalidades autonomas locaes, que eram +muito ciosas dos seus direitos o da sua independencia.</p> + +<p>Roma deve ter sido primitivamente uma colonia de Alba-Longa, cidade que +pertencia á confederação do Lacio. Ignora-se, porêm, ao certo como se fundou, +quaes os elementos a que deveu origem, e as circumstancias que se deram nos +seus primeiros tempos. A historia verdadeira da sua primeira epocha é ainda +hoje ignorada, porque como historia verdadeira não pode considerar-se a +collecção de fabulas e de tradições maravilhosas e inverosimeis, que antigos +historiadores colheram das lendas e das crendices populares.</p> + +<p>A historia dos septe reis de Roma passa por ser uma lenda em que figuram: +1.º rei, Romulo, que com seu irmão Remo edificou no monte Palatino a cidade de +Roma; 2.º rei, Numa, monarcha religioso inspirado pela nympha Egeria; 3.º rei, +Tullo Hostilio, que destruiu Alba-Longa, depois da guerra entre Horacios e +Curiacios; 4.º rei, Anco Marcio, que foi o fundador de Ostia; 5.º rei, +Tarquinio o <em>Antigo</em>, vencedor das cidades latinas do Tibre superior; +6.º rei, Servio Tullio, o legislador, amigo do povo; 7.º rei, Tarquinio o +<em>Soberbo</em>, tyranno abominavel que foi expulso pelos Romanos, sendo com +essa expulsão abolida a realeza.</p> + +<p>Contam os antigos historiadores nos seguintes termos a fabula da fundação de +Roma. Romulo e Remo eram filhos do deus Marte e de Rhea Silvia (filha de um rei +de Alba), que fôra feita vestal (para não poder casar nem ter descendencia) por +seu tio Amulio que derrubou seu pae do throno. Sabendo Amulio do nascimento das +duas creanças, mandou-as lançar ao Tibre; mas a pessoa incarregada de as deitar +ao rio, por compaixão deixou-as na margem, d'onde um pastor as recolheu, sendo +ellas, segundo uns, amamentadas por uma loba, e segundo outros pela mulher do +pastor, que dizem se chamava <em>Lupa</em> (Loba).</p> + +<p>Quando chegaram a homens, Romulo e Remo reuniram grande numero de +aventureiros, vagabundos e descontentes; e com elles tiraram o throno a Amulio, +restituindo-o a seu avô materno Numitor, que d'elle havia sido desapossado. +Feito isto, foram fundar uma cidade no sitio em que haviam sido creados,<span +class="pn">{59}</span> e essa cidade foi Roma. Passou-se isto no anno 753 antes +de Christo.</p> + +<p>Romulo mandou matar a Remo com o pretexto de que este, saltando por um +vallado (que foi a primeira muralha de Roma), pretendêra zombar d'elle. Povoou +a nova cidade com homens dos povos vizinhos que a si attrahiu; e, como não +houvesse mulheres para com elles casarem, mandou fazer umas festas publicas, +para as quaes convidou os Sabinos, e ás quaes concorreram estes em grande +numero com suas familias. Em meio dos festejos os Romanos roubaram as mulheres +aos Sabinos, fazendo-os fugir. Ao rapto das Sabinas seguiu-se uma guerra entre +os dois povos, a qual não teve grande duração, porque as proprias raptadas, +então já casadas, intervieram para fazer a paz entre os maridos e os paes e +irmãos.</p> + +<p>A fabula narrada como causa da expulsão de Tarquinio o Soberbo e da abolição +da realeza em Roma é a seguinte. Contam que tendo Sexto Tarquinio (filho do +rei) injuriado em seu pudor a Lucrecia (mulher do nobre Collatino), esta +convocára todos os seus parentes e os outros nobres da cidade para lhes pedir +vingança e em seguida se suicidára. D'ahi resultou uma revolução, capitaneada +por Collatino e por Lucio Junio Bruto, sendo expulso Tarquinio, abolida a +realeza e estabelecida a fórma republicana. Esta revolução foi toda feita pelos +patricios, e por isso a republica ficou nas mãos d'elles e com feição +aristocratica. O governo foi confiado a dois consules, sendo os primeiros os +dois auctores da deposição de Tarquinio, Bruto e Collatino. Refere-se este +acontecimento ao anno 509 antes de Christo.</p> + +<p>Tiveram pouco depois os Romanos que sustentar uma guerra contra Parsenna, +rei da Etruria, que os atacou para restabelecer no poder a Tarquinio. O +exercito de Persenna chegou a tomar o Janiculo e a acampar junto dos muros de +Roma, pretendendo reduzil-a pela fome; mas foi repellido pelos Romanos com +grande denodo, e Persenna veio depois a tornar-se amigo e alliado de Roma.</p> + +<p>Os Tarquinios continuaram ainda a fazer guerra á republica até á morte de +Aruns (filho de Tarquinio) que succumbiu ás mãos de Bruto. Este fôra ferido +mortalmente por Aruns e, concitando todas as suas forças e energia, matou-o, +cahindo sem vida sobre o seu cadaver.</p> + +<p>Annos depois Manlio (genro de Tarquinio) suscitou contra Roma a guerra, +chamada dos Latinos. Estes chegaram a approximar-se da cidade com um exercito +numeroso. O povo romano recusava-se a tomar as armas se os nobres ou +patricios,<span class="pn">{60}</span> que os opprimiam, não o desobrigassem +das suas dividas e não lhe tornassem melhor o viver. Representava que era elle +que fazia a guerra, mas que as vantagens e as honras eram todas para os ricos e +nobres. Estes promptificaram-se a adiar a exigencia das dividas, mas não a +dál-as por findas. Em tal apuro, por consenso mutuo, creou-se um magistrado +supremo, denominado <em>dictador</em>, com poder absoluto por seis mezes e +incarregado de conciliar todos os interesses. Para esse cargo foi escolhido +Largio que, fazendo-se acompanhar de 24 lictores armados de machados, apparecia +em toda a parte, obrigando todos a intrar na ordem, sob ameaça de morte. O povo +amedrontou-se perante esta energia, fez-se o alistamento, e o exercito marchou +contra os Latinos. Estes pediram um armisticio, que lhes foi concedido; e +Largio exonerou-se da dictadura. Reappareceram mais tarde os Latinos; mas Aulo +Posthumio, nomeado dictador, foi ao seu incontro, vencendo-os n'uma batalha +decisiva em que ficaram mortos Tito e Sexto, filhos de Tarquinio o Soberbo.</p> + +<p>Tendo depois os Romanos guerras com os Volscos e os Equos, foi Cincinnato +incarregado do commando do exercito. O lictor que ia dar-lhe noticia da +nomeação, incontrou-o com a charrua a arar o campo. Cincinnato largou a +cultura, poz-se á frente do exercito, e, em quinze dias, derrotou os inimigos. +Alcançada a victoria, o heroe voltou ao trabalho da sua cultura agricola, que +deixára interrompido. Coriolano, que se vira obrigado a sahir de Roma, em +resultado de dissenções civis entre os tribunos da plebe e os patricios, aos +quaes aquelle pertencia, lançou-se no partido dos Volscos e recomeçou com elles +a guerra contra os Romanos. Vencido, porêm, pelas supplicas de sua mulher e de +sua mãe, retirou-se e recolheu ao paiz dos Volscos que (segundo alguns) o +assassinaram.</p> + +<p>Seguiu-se a guerra contra os Veientes,—um dos povos etruscos, inimigo +eterno dos Romanos, que todos os annos renovava as hostilidades. Os Fabios, +familia nobre de Roma, offereceram á republica um concurso poderoso e +extraordinario, fazendo por si sós uma guerra particular contra os Veientes; +mas foram horrivelmente derrotados, ficando os trezentos patricios, que +compunham este pequeno exercito, todos mortos junto a Cremera. Notaveis +victorias vingaram, porêm, depois esta derrota; differentes generaes romanos +ganharam grandes batalhas e se apoderaram das praças fortes do inimigo. Os +Veientes eram tão poderosos que, cercados na sua cidade, defenderam-se durante +dez annos dos Romanos, os quaes haviam jurado não voltar a Roma sem haverem +tomado<span class="pn">{61}</span> a valorosa povoação dos Veientes. O +juramento cumpriu-se e a cidade foi tomada.</p> + +<p>Por esse tempo Roma tratou de aperfeiçoar as suas instituições e a sua +legislação, adoptando algumas das leis vigentes na Grecia. Crearam-se os +<em>decemviros</em>, para exercerem o poder em vez dos dois consules. As leis +que adoptaram de Athenas foram pelos Romanos gravadas em doze tábuas, o que +lhes originou a designação de <em>leis das doze tábuas</em>. Teve pouca duração +a instituição dos decemviros, que foi por sua vez substituida pela de dois +consules. Esta substituição fez-se por exigencia do povo, cançado da tyrannia +dos decemviros e dos excessos dos nobres. O povo ainda obteve outra victoria: +estabeleceu-se que os consules tanto pudessem ser eleitos entre os patricios +como entre a plebe, e que se pudessem fazer casamentos entre individuos de +differentes classes sociaes.</p> + +<p>Seguiram-se outras guerras, de algumas das quaes tratámos atraz, em +differentes capitulos, a proposito dos outros diversos povos, como a de +Tarento, a de Pyrrho, a de Syracusa, as tres guerras punicas, a dos Corinthios, +e a da Hespanha, que os Romanos submetteram tambem. Todas estas guerras tiveram +como resultado dar a Roma uma vastissima dominação no mundo.</p> + +<p>Assim, no anno 130 antes de Christo, dominava ella desde o littoral da +peninsula iberica até ao centro da Asia Menor. Estava sujeito ao seu dominio +quasi todo o antigo mundo.</p> + +<p>Mas a conquista de tão vastos e tão ricos paizes tinha tido sobre os +costumes dos Romanos uma influencia desastrosa. Tinham estes renunciado á sua +antiga simplicidade e tinham aberto as portas ao luxo. Os nobres tinham-se +tornado crapulosos e perdularios; o povo, accessivel á venalidade. D'ali +proveio a decadencia que a pouco e pouco produziu a ruina da republica e da +liberdade.</p> + +<p>Catilina, um nobre romano, eivado de todos os vicios da sua classe, +aproveitando-se da ausencia dos exercitos, que estavam na Asia combatendo +contra Mithridates, concebeu o negro plano da perda da patria, tendo por +cumplices alguns dos seus mais nobres compatriotas. Incontrou porêm a opposição +patriotica dos consules Cicero e Antonio; o primeiro, nos seus eloquentes +discursos, punha em evidencia as conspirações do traidor e concitava contra +elle o patriotismo da plebe; o segundo marchou contra o exercito com que +Catilina vinha, da Etruria sobre Roma e desbaratou-o. Catilina foi morto no +combate.<span class="pn">{62}</span></p> + +<p>Novas calamidades esperavam, porêm, a republica romana. No meio do excessivo +poderio e da dissolução dos costumes, quando Roma celebrava as victorias +alcançadas por Pompeu no Oriente, a grande influencia e o grande prestigio +d'este general despertou a inveja de outros generaes e outros nobres +ambiciosos, como Metello, Crasso e Cesar.</p> + +<p>Aspirando Cesar a ganhar poder, Crasso a augmentar o seu, e Pompeu a +conservar o que possuia, facil foi aos tres ambiciosos combinarem-se para se +apoderarem da republica. Distribuindo elles a sua força commum, Cesar +assenhorou-se da Gallia, Crasso da Asia, e Pompeu de Hespanha; cada um tinha um +grande exercito sob as suas ordens, por fórma que o imperio do mundo ficou +assim dividido entre aquelles tres dominadores. Mas a concordia que +apparentavam entre si era unicamente o resultado do receio que cada um d'elles +tinha dos outros. Morto Crasso, bem depressa se rompeu a harmonia entre Cesar e +Pompeu. Este, apoiado pelo senado, intimou Cesar para que abandonasse o seu +governo e o commando do seu exercito. Cesar, em vez de obedecer, marchou sobre +Roma e fez sabir d'ahi Pompeu e todos os seus partidarios. Seguia-os até á +Hespanha, onde bateu todos os logar-tenentes de Pompeu, e passou depois á +Grecia, onde se incontrou com este na Thessalia, perto de Pharsalia. Vieram ás +mãos os exercitos de um e outro, a victoria ficou indecisa; mas, tendo-se +afastado Pompeu do campo,—o seu exercito, perdendo a força moral, foi +completamente destroçado.</p> + +<p>Pompeu viu-se obrigado a refugiar-se no Egypto, onde foi assassinado no +momento de desimbarcar, por ordem de Ptolomeu. Depois de em Africa bater Juba, +que sustentára o partido de Pompeu, e de derrotar os filhos d'este em +Hespanha,—Cesar recolheu a Roma, onde foi recebido com grande ovação, e +onde sobre sua cabeça foram accumuladas as maximas honras.</p> + +<p>Bem depressa se urdiu, porêm, uma conspiração contra a sua vida. Foram +auctores d'ella Bruto, Cassio e outros patricios; e Cesar morreu sob o punhal +de Bruto.</p> + +<p>Livres os Romanos de Pompeu e de Cesar, parecia que iam recuperar a antiga +liberdade; mas Sexto Pompeu, reclamando os bens de seu pae, tornou-se o +flagello do mar; Octavio, procurando vingar Cesar, soprou a guerra na +Thessalia, e Antonio amotinou o povo contra os assassinos de Cesar, fazendo com +que elles fossem expulsos de Roma.</p> + +<p>Antonio, Lepido e Augusto constituiram-se em triumvirato para vingar a morte +de Cesar. Octavio e Antonio marcharam<span class="pn">{63}</span> contra Bruto +e Cassio, que sustentavam o senado, e deixaram Lepido em Roma. Incontraram-se +os dois exercitos inimigos na Thessalia; a victoria esteve a principio +indecisa; mas depois Cassio, sendo repellido, persuadiu-se de que o mesmo tinha +acontecido a Bruto e suicidou-se. Isso produziu a derrota de Bruto, que tambem +se matou, para não cahir nas mãos dos inimigos.</p> + +<p>A harmonia entre os triumviros não se manteve muito tempo. Lepido foi +desterrado para uma ilha, onde morreu. Antonio e Augusto desavieram-se e +romperam hostilidades, acabando a contenda pela batalha de Accio. Antonio, +vencido, suicidou-se; e o Egypto foi reduzido a uma provincia romana.</p> + +<p>Doze annos depois de se haver constituido o triumvirato, viu-se Octavio +senhor absoluto do grande imperio romano. Depois de ter estabelecido a paz na +terra e no mar, fechou o templo de Jano, em signal de paz geral. Senhor de +tudo, tendo nas suas mãos a força militar, investido nas funcções de todas as +magistraturas do estado, apezar de conservar as formulas republicanas, tomou o +titulo de imperador, com o nome de <em>Augusto</em>. Pouco depois, declarou que +ia intregar os poderes nas mãos do senado e do povo; mas, tendo disposto +convenientemente as coisas, obteve que, em nome do bem publico, lhe +conservassem o poder por mais dez annos.</p> + +<p>Não tendo filhos que pudessem ser herdeiros do imperio, declarou como tal a +Tiberio Nero, que adoptou por filho. Deu o commando de oito legiões, inviadas +ao Rheno, a Germanico Cesar, filho de Druso, e fez com que Tiberio o adoptasse. +Veio a morrer na edade de 76 annos.</p> + +<p>Foi no seu reinado que, no anno 753 da fundação de Roma, nasceu Jesus +Christo em Bethlem, cidade da Palestina.</p> + +<p>O imperio romano tentou continuar o dominio universal. Succederam-se uns aos +outros os imperadores, muitos dos quaes foram tyrannos, e muitos morreram +assassinados. O imperio foi successivamente infraquecendo. Tres invasões lhe +deram o ultimo golpe: a dos Wisigodos, a dos Vandalos e a dos Hunos. Por morte +do imperador Theodosio, o imperio fôra dividido entre seus dois filhos: Arcadio +teve em partilha o imperio do Oriente; Honorio o do Occidente. Foi este o que +cahiu perante a invasão d'aquelles Barbaros, no anno 476 da era christan, +fechando com esse acontecimento a Historia Antiga. O imperio do Oriente logrou +acompanhar ainda o periodo historico da Edade-Média.</p> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;">FIM<span class="pn">{64}</span></p> +<p> </p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center; font-size: 2.5em;">Os Mysterios da Inquisição</p> + +<p style="text-align:center;">POR</p> + +<p style="text-align:center; font-size: 1.6em;">F. Gomes da Silva</p> + +<p style="text-align:center; font-size: 1.4em;">Obra illustrada a côres</p> + +<p style="text-align:center;">POR</p> + +<p style="text-align:center; font-size: 1.6em;">MANUEL DE MACEDO E ROQUE GAMEIRO.</p> + +<p>Sob o titulo <strong>Os Mysterios da Inquisição</strong> condensam-se +variadissimos factos historicos, desentranham-se os horrores d'epochas +passadas, escalpellam-se figuras d'outros seculos, investigam-se +particularidades estupendas, encadeiam-se acontecimentos dispersos e +tenebrosos, enaltecem-se as grandes virtudes, faz-se rebrilhar a verdade, e +põem-se em relevo todas as personagens que entram n'este grande drama, em que +vibram commoções da maior intensidade e affectos do mais exaltado amor.</p> + +<p>O romance <strong>Os Mysterios da Inquisição</strong> constará de 3 volumes +de grande formato. A distribuição será feita semanalmente em fasciculos de 3 +folhas ou 24 paginas com uma gravura a côres pelo preço de 60 réis, ou em tomos +de 15 folhas ou 120 paginas com 5 gravuras por 300 réis.</p> + +<p>Para as provincias a distribuição é feita em tomos de 300 réis ou em +fasciculos quinzenaes de 48 paginas e 2 gravuras por 120 réis.</p> + +<p style="text-align:center; font-size: 1.2em;"><em>Precioso brinde a todos os Srs. +assignantes</em></p> + +<p style="text-align:center; font-size: 1.2em;">Uma magnifica estampa a côres, medindo +0,57x0,44</p> +</div> + + + + + + + + +<pre> + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Historia Antiga, by Unknown + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK HISTORIA ANTIGA *** + +***** This file should be named 29529-h.htm or 29529-h.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + http://www.gutenberg.org/2/9/5/2/29529/ + +Produced by M. Silva + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. 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It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need, are critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at http://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +http://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at http://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. 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Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + http://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. + + +</pre> + +</body> +</html> diff --git a/LICENSE.txt b/LICENSE.txt new file mode 100644 index 0000000..6312041 --- /dev/null +++ b/LICENSE.txt @@ -0,0 +1,11 @@ +This eBook, including all associated images, markup, improvements, +metadata, and any other content or labor, has been confirmed to be +in the PUBLIC DOMAIN IN THE UNITED STATES. + +Procedures for determining public domain status are described in +the "Copyright How-To" at https://www.gutenberg.org. + +No investigation has been made concerning possible copyrights in +jurisdictions other than the United States. 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